Valor Econômico (2020-03-14, 15 e 16)

(Antfer) #1

JornalValor--- Página 11 da edição"16/03/2020 1a CAD A" ---- Impressapor RCalheiros às 15/03/2020@19:26:


Sábado,domingoesegunda-feira, 14,15e16demarçode 2020|Valor |A


A volta do momento Minsky

Tudoconspiraparamenosatividadeeconômicaadiante.PorJoséFranciscoL. Gonçalves


“Este não é um


programa de


estabilidade,


comoo Real. É


um programa


de redução


muito gradual


da inflação”.


DoconsultorMiguel Broda, sobre o


planodonovogovernoargentino


LuizCarlos


Mendonçade Barros


Desta vez não houve


Cisne Negro externoa


pôr fim ao otimismodos


mercados,e sim a


difusão do coronavírus


A

teoria econômica no


início dodesenvolvi-


mentodo capitalismo,


no final do século19 e


começodo 20, era maisum tra-


tadoreligiosoescrito peloscha-


mados economistas clássicosdo


que umaavaliaçãodos proble-


mas reaisque aincipiente eco-


nomiaà épocaapresentava. O


homem que vivia a dinâmicadas


economiasde mercadoera jus-


to, racional ereligioso. John


MaynardKeynesfoi oprimeiro


pensadorsobreas questõeseco-


nômicasque desmitificoua for-


ma de dogma religioso que pre-


valeciaaté então. Ele delineou os


valores do verdadeiroHomem


Econômico que existenos mer-


cados enão aimagemcriadape-


lo dogmatismodo chamado ho-


memracional.


Aterrívelcriseda depressão


econômicados anos30 desmo-


ralizou o arcabouço teórico e


prático do capitalismopuroe va-


lidouasobservaçõesmaisimpor-


tantes de Keynes e de um peque-


no númerode economistasao


seu redor. Mas o boomeconômi-


co no pós-guerra nos Estados


Unidospermitiu que umanova


leituramaisrealistados ideólo-


gosreligiososdocapitalismofos-


se desenvolvida,principalmente


nas universidades americanas.


Chicagopassoua ser a novaRo-


ma na defesados princípiosrees-


critosechamadosdeneoclássi-


cos. Pouco apoucouma sériede


mecanismos criados nos anosda


depressãoforamsendodesmon-


tadosou reescritos commenor


capacidadede intervençãodos


governosnosmercados.


Coma ascensão de Ronald


Reagan,umanovageração de


políticos do PartidoRepublicano


retomoua “cruzadasanta”dos


clássicosde negarao Estado odi-


reitode restringira liberdadein-


dividualdeinvestidoreseempre-


sários. O sucessoeconômicodos


anos Reagantrouxede voltaa


ilusãoda racionalidade do siste-


ma eque havia sido perdidanos


anosterríveisdadepressão.


Mas mesmo marginalizados


peladominânciadopensamento


neoclássicoalgunseconomistas


continuaram a atualizaros prin-


cipais conceitos desenvolvidos


por Keynes em relaçãoàinstabi-


lidade estrutural das economias


demercado.UmdelesfoiHyman


Minskyque, apesar de formado


em matemáticapela Universida-


de de Chicago, acabouse dedi-


cando profissionalmenteao es-


tudodeeconomiaapartirdotra-


balhoteóricodesenvolvidopor


Keynes.Em 1986publicou um li-


vro — “Stabilizing an Unstable


Economy”—noqualfaziauma


releiturada fragilidadedas eco-


nomiasde mercado quando, no


fim de um ciclo de expansãoeco-


nômica,aeuforiaeaambição


acabam dominandoas decisões


dosagenteseconômicos.


Olivro de Minskyfoi adotado


por membrosimportantes do


universode Wall Street,como


Paul McCulleyda Pimco,quando


ocorreu a crise financeira de



  1. McCulleychamoude mo-


mentoMinskyoponto do ciclo


econômicoem que os especula-


doresendividados são obrigados


a venderem massaos seus ativos,


para fazerfrenteàs suas necessi-


dades de liquidez.Nesseponto,


começaaliquidação de posições,


masnenhumcomprador pode


ser encontradoapreçostão ele-


vados, o que leva a umaqueda


abruptanos preçosdos ativos e a


umaacentuadareduçãodaliqui-


deznomercado.


Omomento Minskynormal-


menteocorre depois de um lon-


go períodode prosperidade e de


investimentoscrescentes,o que


incentiva o aumentoda especu-


laçãousandodinheiroempresta-


do. Alguns,comoMcCulley,con-


sideram o inícioda crisefinan-


ceira de 2007-2010comoum


momentoMinsky.McCulleyesta-


belece este momentoem agosto


de 2007, enquantooutrosconsi-


deramque tenhasido um pouco


antes,em junho de 2007,com a


quebradaBearStearns.


Agora,dez anosdepoisda cri-


se de 2008que fez de Minskyum


economistarespeitado até pela


comunidade financeirade Wall


Street,voltamosaviver uma crise


financeiraquevaijogaromundo


novamenteem uma possível de-


pressãoeconômica. Mas,como


sempreacontecequandoseutili-


za eventos históricoscomorefe-


rência paramelhorconhecero


presente, éprecisoanalisaras


condiçõesdecontornoatuaisem


relaçãoàs do passado.Asecono-


miasdemercadosãoorganismos


que evoluemcom otempoemu-


danças importantes podem


ocorrer em um períodode 10


anos. Quandoolhamosacrise


que estamosvivendoe a compa-


ramoscomoque ocorreuem


1997 e 1998duasmudançasme


chamamaatenção.


L

ogo mais,o Copomvai


definirataxa Selicpara


as próximas seis sema-


nas. Evai fazê-loem am-


biente difícil, dado onível de in-


certeza que tomouos mercados


desdeaeclosãoda covid-19em


meadosde janeiro. Os desdobra-


mentosdo contágiointerrompe-


ram a produçãoem vários seg-


mentosda economia mundiale


promoverambruscasegrandes


flutuações nos preçosdos ativos


reaise financeiros. Seu impacto


sobreo preçodo petróleopode


ter efeitosprolongados sobrea


atividadeeconômica.


Em particular, as moedas emer-


gentes sofrerambrutalmente pela


corrida dos investidores, ora para


odólar, ora para outras moedas


fortes. Os jurosque ativospúblicos


em taismoedaspagamtiveram


outrarodada de queda, atingindo


níveisinimaginavelmente baixos.


Os bancoscentrais de tais países


entraram maisfundoem nova ro-


dadade expansãomonetária ede


seusbalanços,buscando elidira


incertezaeabrutalpreferênciape-


laliquidez.


Os ativos de riscoforamenor-


memente desvalorizados, os prê-


miosderisco,multiplicados.Asva-


riáveisdo balançode risco do Co-


pom(Comitê de Política Monetá-


ria do BC) estãoclaramentepon-


deradas: o ambiente internacional


desinflacionário, paraser breve, a


elevada ociosidade de fatores na


economia brasileira, a capacidade


de ainflaçãonão acelerarcom os


vários choques dos últimos anos,a


expectativa de inflação abaixo da


metano horizonte relevante, a in-


certeza sobre apotência da políti-


ca monetária, os efeitos da redu-


çãodejurosjárealizada.


E omais importante atual-


mente,“a consequênciadesses


efeitosparaaconduçãodapolíti-


camonetáriadependerádamag-


nituderelativada desaceleração


da economiaglobalversusarea-


çãodosativosfinanceiro”, leia-se,


obom evelhopass-throughda


variação cambialpara a variação


dospreçosemreais.


Já antes da covid-19, as expecta-


tivassobreaatividadeeconômica


entraram em revisão —para baixo.


O terceiro ano sob os esperados


efeitos das reformas foi frustrante


para quemnelasconcentrava con-


fiança.Assim, osinal sobre aeven-


tual pressão de preços decorrente


da atividadeeconômicaincompa-


tívelcomarespostadaofertapode


ser considerado desprezível ainda


por um bomtempo. Mais tempo


agora. A demandaexterna mais


Diferentemente do que foi publicado


na ediçãode sexta-feira, dia 13, na re-


portagem“Butantan tem capacidade


para dobrar produção”(páginaB5), o


Instituto Butantannão tem planos,por


ora, de fabricarumafutura vacina para


a covid-19. Na unidadereferida na re-


portagem,a produçãoé voltadapara a


vacina da gripedo tipo influenza


A primeiraé que tantoem


1998 comoem 2008foramten-


sõestípicasda superexcitação


de otimismo dos mercadosque


provocaram abrupta ruptura


das cotações dos principais ati-


vos e omergulhona recessão.


Não houvenenhumCisneNegro


externoparainterrompero oti-


mismode todos.Destavez, em


2020,apesarde já existiremas


condiçõesde excessodeotimis-


mo nos Estados Unidos,foi o


eventona saúdemundialprovo-


cadopelocoronavírusque pro-


vocouacrisedeconfiançaeo


pâniconos investidores.


Asegundaéque pela primeira


vezexperimentamosumperíodo


de pânicode extensãomundial


com ofuncionamento plenodas


chamadas mídiasdigitaise das


redessociais.Nestanovaconfi-


guraçãodas relações entrehabi-


tantesdo mundotodo,adisse-


minaçãode notíciasverdadeiras


e falsasse faz a umavelocidade


incrívelesem o controleda ver-


dadeque semprefoi responsabi-


lidadedamídiainstitucional.


Mas o fim destacriseestá lon-


ge de ocorreremuita água—ou


melhorsangue—vai correrde-


baixodaponte.


Luiz CarlosMendonçadeBarros,


engenheiro e economista,é presidente do


Conselhoda Foton Brasil. Foi presidente


do BNDESe ministro das Comunicações.


Escreve mensalmente às segundas.


fraca, os termosde troca em dete-


rioração, as decisões de investir no


setor óleoe gás, a política fiscal


contracionista,a incertezaeleva-


da, tudoconspiraparamenos ati-


vidadeadiante.


Umacoisaéaalta do dólare


das outrasmoedasfortescontra


as moedas emergentes.Quase


nadahá parafazera este respei-


to. Nestespaíses,a preferência


pela liquidezé apreferênciape-


los mesmosativosque são dese-


jadoslá fora:aquelasmoedas.E


os juros pagos pelas moedas


emergentessãooprêmioexigido


por quemabre mão daquelas.O


BancoCentralpodeapenas,co-


mo tem feitonos últimosanos,


lembrarque o regimeé de metas


de inflação, e não de metasde


câmbio, e atuarparatentarmo-


derarasoscilaçõesdocâmbio.


Parece que aúnica maneira de


moderar apreferência pelaliqui-


dez é criar aexpectativa de que


abrir mãodela é rentável, isto é,


criaraexpectativadequeproduzir


e/ou encomendar máquinas é


maisrentáveldo quereceber osju-


ros. Mas éexatamente essaexpec-


tativafrustrada queeleva a prefe-


rência pela liquidez:nessas condi-


ções,“vocêpodelevaroburroatéo


rio, mas não podeobrigá-lo a be-


ber água”ou “a política monetária


podeesganaraeconomia,masnão


podeempurrá-la”.


Para que apolíticamonetária


seja efetiva,isto é, para que redu-


ção de jurosajudearecuperara


atividade econômica,é preciso


que a preferência pelaliquidez


seja moderada.Apenasum gasto


que não seja movidopela renta-


bilidade é capazde desarmara


armadilha,ogastopúblico.


O gasto, não a renúncia fiscal


ou a redução de impostos.O ra-


cional parao privadoque paga


menosimpostos é converter a di-


ferença “economizada” em pou-


pança, não em gasto. Se o governo


contrata um privadopara produ-


zir, estesó recebese contratar tra-


balhoe outros recursos. Ao fa-


zê-lo, detona arealização da ren-


da oferecida pelo governo. Renda


que pode gerarmais renda se seus


titulares não a pouparem, senão


que gastarem. Não se trata de des-


cobrir omoto perpétuo,mas de


dar chanceaos privadosde assu-


mirem riscos em condições mais


favoráveis. Esperar que um priva-


do assuma o riscode dar o ponta


pé inicial édemasiado ingênuo. Já


vimos que não acontece.


Aguardar que as reformaste-


nhamocondão de libertar os “es-


píritos animais dos empresários” é


imobilismo. Sempre se podedizer


que o que já foi reformadoainda


não é o suficiente e que o proble-


mafoiBrumadinho,Argentina,ca-


minhoneiroseumvírusnovo.


Mas semprese podelembrar


de que o prêmio exigidopara se


abrirmão da liquidezéamedida


de nossa inquietação. Inquietos


ficamos aguardandoa voltada


confiançapelasreformas, arecu-


peraçãodaconfiançapelosresul-


tadosde uma políticafiscalcon-


tracionista, a preferência por


umarestrição ao gastopúblico


que negaao Estadoa capacidade


defazerpolíticacontracíclica.


Inquietosficamoscomomedo


da trajetória explosivada dívida


pública?Que tal usar a situação


atualcomopontode partida?A


situação atual,diz o Tesouro, é de


umadívidaque não passados


80%doPIB.


Para rompercírculosviciosos,


éprecisoum argumentoteórico


quedêsustentaçãoàdecisãocor-


reta, uma motivaçãopolíticaque


lhe dê sentidoprático,compe-


tênciaeousadia.

Se alguémjá confundiupolíti-


ca contracíclicacom estímuloao


crescimento,não se segueque a


confusão sejainevitável. Eal-


guémlúcido podevigiarpara


que aconfusãonão ocorra.Um


governo comprometido como


ajustefiscale o controledas con-


taspúblicaspodeconvenceraso-


ciedadedequenãoapenasépos-


sível,comoédesejável,excluirin-


vestimentosdo teto de gastose


mostrarcompetênciaparareali-


zá-lossem cair na tentaçãode


desperdiçar ou malbaratar re-


cursospúblicos.


JoséFranciscoLimaGonçalvesé


economistachefe do BancoFator e


professordo Departamento de Economia


da FEA-USP.


Cartasde


Leitores


Fiscalizando a política monetária

Frase do dia


BPC


Chegaaserdesumanaavisãocrí-


ticaaoCongressopelaampliação


doBPCaidososedeficientesque


vivemcomrendainferiorameio


saláriomínimomensalenquan-


tobeneficiaoutrassetores,como


asForçasArmadascomamplia-


çãodeinvestimentosembilhões


eisentaoutrostantospoderosos


deimpostos.Umpoucomaisde


consciênciasocialecompaixão


porfavor!EstácertooCongresso.


Quecontingenciemsobrequem


menosprecisa.Economizarem


cimadosmaispobresentreos


pobreséumabsurdo.


ElianaFrançaLeme


[email protected]


Coronavírus


Tenhoacompanhadoatenta-


mentepelainternetoavanço


noscasosdecoronavírusetodos


ospaísesestãoadotandomedi-


dasseverasparacontençãodoví-


rus,comosuspensãodeaulas,


eventos,restriçãodepessoasnas


ruas,fechamentodemuseus,


atraçõesturísticasetodaativida-


dequehajaacúmulodepessoas.


AUnescodizque14paísesfe-


charamescolasemtodooterri-


tórionacional,outros13fecha-


ramalgumasescolas,enquanto


noBrasilapenasalgumasescolas


particularessuspenderamasau-


las.Nossasautoridadessãoirres-


ponsáveisaopermitiremofun-


cionamentonormaldasescolas,


eventoselocaisqueacumulam


pessoas,principalmenteconsi-


derandonossodeficientesiste-


madesaúdequeatuaemcolap-


soporfaltadeequipamentos,


agenteseleitos.AOMSdeveria


intervirjuntoaoMinistérioda


Saúdebrasileiroparaosorientar,


vistoquepodemosestarcami-


nhandoparaumatragédiaevitá-


velesemprecedentesnahistória


denossopaís.


DanielMarques


[email protected]


DelfimNetto


Poucoseimportandocomseus


anos,DelfimNettocontinuaum


observadorprivilegiadodoque


ocorrenopaís,escudadonasua


enormeexperiênciatantonoExe-


cutivocomonoLegislativo.Clau-


diaSafatle,noseuartigonoValor


de13/3/2020(A2),“Umavisãocrí-


ticadainteligêncianacional”,dá


vozaoex-ministroquecontinua


afiadíssimoaoanalisarnosso


atualquadropolítico.Criticade


formacontundenteessabatalha


insanaentreoExecutivoeoLegis-


lativo,cujoresultadofinalpoderá


custarmuitocaroaopaís,princi-


palmentenummomentoqueexi-


geuniãonacionaldeesforçospara


venceracovid-19.


DirceuLuiz Natal


Aguardar que as


reformastenhamo


condão de libertaros


“espíritos animaisdos


empresários”é


imobilismo. Sempre se


podedizerque as


reformasnão foram


suficientese que o


problema foi


Brumadinho e


um vírusnovo


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