O Estado de São Paulo (2020-03-25)

(Antfer) #1

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A6 Política QUARTA-FEIRA, 25 DE MARÇO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


ROSÂNGELA


BITTAR


A


discussão sobre o adiamen-
to das eleições municipais,
por causa do avanço incon-
trolável do coronavírus, começou
invertida. Em tempos de guerra, al-
guns argumentos contra uma mu-
dança, como a imposição do calen-
dário pela Constituição, por exem-
plo, devem vir depois daqueles que
possam preservar a vida.
Para evitar estresse maior nos mu-
nicípios do que o que já vigora no
País confinado, o ministro Luiz
Henrique Mandetta sugeriu aos pre-
feitos que pensassem no assunto.
Falou ao público certo na ocasião
adequada, em meio à discussão so-

bre o surto epidêmico que exigirá cada
dia mais o esforço do sistema de saúde
que operam. Mandetta teve a delicade-
za de não abordar a questão com a crue-
za da realidade.
Duas autoridades competentes para
o assunto reagiram mal à hipótese. O
futuro presidente do Tribunal Supe-
rior Eleitoral, ministro Luís Roberto
Barroso, que se prepara para assumir o
cargo, o centro do palco, e brilhar, ale-
gou o calendário constitucional.
Não disse, mas é bom lembrar que
ano eleitoral é o ano em que a Justiça
Eleitoral e seu corpo de funcionários
justificam sua existência.
O outro foi o presidente da Câmara,

Rodrigo Maia, com um argumento da-
queles ligeiros, próprios para ganhar
tempo: é cedo. Ainda lembrou que o
próprio ministro da Saúde havia previs-
to declínio da pandemia em agosto. Ha-
vendo, portanto, tempo para fazer cam-
panha. Em declínio não significa extin-
ta, e sobre o tudo que não se sabe nada
está a questão do momento, se reinicia-
se a contaminação depois do declínio.
Maia estava falando, certamente, aos
que querem eleição. A estimativa é de
que haverá, este ano, 470 mil candida-

tos concorrendo às 5.560 prefeituras e
57 mil cadeiras de vereador. Ficariam
frustrados, mas a redimensão do dese-
jo é própria de períodos como os atuais.
Cinco cenários sobre os quais Man-
detta deve ter apoiado sua proposta:


  1. Cerca de 80% dos 5.560 municípios
    têm até 20 mil eleitores. Sobretudo nes-


ses, não se faz campanha sem reuniões,
aglomerações, corpo a corpo.


  1. Será quase imoral as campanhas
    utilizarem fundo eleitoral num momen-
    to em que o País, em plena recessão,
    com os números do desemprego explo-
    dindo, precisará dos recursos para a
    saúde e alguns setores da economia.

  2. A ideia de os partidos destinarem
    as verbas do fundo para o combate à
    pandemia não é solução, pois possibili-
    tará uma campanha absurdamente de-
    sigual, que favorecerá o candidato rico
    e o candidato à reeleição.

  3. As campanhas municipais, em
    qualquer lugar do mundo, acirram riva-
    lidades, até artificialmente. Num mo-
    mento em que se está pregando união e
    solidariedade, o País viverá em choque.

  4. Em qualquer município brasileiro,
    o principal motivo da queixa do eleito-
    rado é a saúde. Candidatos de oposi-
    ção vão criticar a condução das ações
    contra o coronavírus?
    São apenas algumas das razões que
    provam o pandemônio da campanha
    eleitoral este ano. Há outras. Por


exemplo, sugere-se o adiamento
por alguns meses, três ou quatro.
Aí o Brasil teria uma eleição em fe-
vereiro, no carnaval, com a campa-
nha no Natal. E em três meses não
haveria alteração significativa do
quadro de dificuldades.
O cientista político e sociólogo
Antonio Lavareda tem feito ensaios
sobre o assunto. Sua ideia principal,
até o momento, seria fazer uma PEC
prorrogando os mandatos até 2022,
com proibição de candidaturas dos
que tiverem seu mandato prorroga-
do. A coincidência de eleições redu-
ziria o seu custo drasticamente; e os
legisladores poderiam aproveitar o
recolhimento para uma avaliação so-
bre a oportunidade de fazer a refor-
ma do sistema eleitoral.
É muito difícil imaginar o Brasil
que vai sair desta pandemia, com cri-
se de saúde pública, crise econômi-
ca e crise social. Insistir em cumprir
um calendário, porque é a regra, in-
terditando o debate, é contratar
uma quarta crise.

E-MAIL: [email protected]
ROSÂNGELA BITTAR ESCREVE SEMANALMENTE ÀS
QUARTAS-FEIRAS

Insistir em cumprir um
calendário, interditando o
debate, é contratar nova crise

O que não se perdeu em duas décadas perdidas


V


amos encerrar este ano com crescimento
econômico muito aquém do que precisa-
ria um país com taxa de desemprego que
atingeamaisde11milhõesdepessoas.Sópor
milagrefecharemosestadécadacomumPro-
duto Interno Bruto (PIB) próximo de 10%.
Diante de tal cenário, o Brasil somará duas
décadasperdidasemtermoseconômicose
sociais; no campo das reformas estruturais,
quepoderiamteravançadomuitomais;na
perda de espaço no comércio mundial, espe-
cialmentenoquedizrespeitoàexportaçãode
produtos com valor agregado. Isso sem falar
dos investimentos não efetuados em saúde,
educação e infraestrutura. A capacidade e a
produtividadedoparqueindustrialbrasileiro
seguiram na contramão do mundo. Idem no
que se refere ao patrimônio intelectual (nos-
sostalentosseforamecontinuambuscando
oportunidades em outras nações).
Assim, difícil contrariar prognóstico do
banco Goldman Sachs, para quem desperdi-
çamos20anosemoportunidadesdeevolu-
ção, refletindo a sucessão de erros de políticas
econômicas, excetuando-se, obviamente, o
PlanoRealeosexcelentesprincípiosdaagen-
da econômica do atual governo.
Quem viveu nos anos 80 enfrentou a hipe-
rinflação,acrisedadívidadospaísesdaAmé-
ricaLatina,oestourodabolhadomercado
imobiliário no Japão. O mercado imobiliário
nacional foi surpreendido com a extinção do
BancoNacionaldaHabitação(BNH)eode-
saparecimento dofinanciamento imobiliário.
A criatividade dos empreendedores impediu
a paralisação das atividades com a venda de
imóveisapreçodecustoeoutrasinovações
que evitaram mais desemprego e recessão.
Emmeadosdosanos90,aturbulênciavol-
tou aos mercados emergentes. Crise do Méxi-
co, dos países do Sudeste Asiático (1997), da
Rússia. Ofluxo de recursos internacionais se
esvaiu.OBrasildesvalorizouorealemjaneiro

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Jornalista Responsável: Maria Silvia Carneiro - MTb - 19.466 | Ano 38 | Nº 1968 |25 de março de 2020

Mauro Pincherle*

Diante da
recessão global,
a continuidade do
MCMV é decisiva
para ativar
economia doméstica

*DiretordoSecovi-SP

de1999.Osanos2000indicavammelhorias.
Então, em 2008, houve o estouro da bolha
imobiliária norte-americana (subprime).
Mais que o relato histórico, importa saber
queamaioriadospaíses,mesmoosemer-
gentes, retomou algum ritmo de crescimento.
MasoBrasilnãoseguiuatendência.Suaeco-
nomia permanece oscilante.
Nemtudo,porém,foiruimparaaindústria
imobiliária nacional. Em 1997, nasceu o Sistema
FinanceiroImobiliário(SFI).Em2004veioomar-
coregulatóriodocréditoimobiliário.Commaior
segurança a compradores,financiadores e em-
preendedores, os bancos privados voltaram afi-
nanciarcomprazosmaislongosejurosmenores.
Massehouvealgoquerealmentenãoseper-
deunessasduasdécadasperdidasfoioMinha
Casa Minha Vida (MCMV), programa de Esta-
do criado em 2009 quefinanciou cerca de 5,
milhões de moradias, 4,1 milhão já entregues,
equecorresériosriscosdecontinuidade.
Além de recursos do FGTS serem desviados
de suasfinalidades precípuas, a União não tem
verbasparagarantiroprograma. Enote-seque,
apesar do sucesso do MCMV, o déficit habita-
cionaléestimadoem7,5milhõesdemoradias.
A sustentação do MCMV, não importa o
nome com que venha a ser rebatizado, é deci-
siva para a dinâmica econômica e, mais ain-
da,paraativaraeconomiadoméstica,aqual,
sabe-se lá por quanto tempo, responderá pela
geração de empregos e impostos no Brasil.

Expediente do Secovi-SP suspenso até 7 de abril – ComooDecretoEstadualnº64.865,de18de
março de 2020, determinou quarentena em todo o Estado de São Paulo, o expediente presencial
da entidade está suspenso até o próximo dia 7 de abril. O atendimento permanece on-line. Con-
fira a relação de serviços em http://www.secovi.com.br.

Informe Publicitário

Jussara Soares / BRASÍLIA
Ricardo Galhardo


Após reunião com o presiden-
te Jair Bolsonaro na manhã


de ontem, governadores das
regiões Sul e Centro-Oeste
cobraram mais ações da área
econômica para lidar com a
pandemia do coronavírus.

Apesar de anunciar R$ 88,2 bi-
lhões para Estados e municí-
pios, o presidente ouviu pedi-
dos de esclarecimentos sobre
a distribuição da verba.

Os chefes dos Executivos esta-
duais do Centro-Oeste, embora
tenham considerado a reunião
produtiva e com Bolsonaro aber-
to ao diálogo, solicitaram que a
prorrogação do pagamento das
dívidas com a União seja de um
ano, não de seis meses, confor-
me anunciado anteontem.
Outra medida do governo fe-
deral que ficou aquém da expec-
tativa foi o anúncio de R$ 16 bi-
lhões para recompor o Fundo
de Participação dos Estados (F-
PE) e o Fundo de Participação
dos Municípios (FPM). Segun-
do os governadores do Distrito
Federal, Goiás, Mato Grosso e
Mato Grosso Sul, ela não aten-
de às necessidades diante da
perda da arrecadação.
O governador do Distrito Fe-
deral, Ibaneis Rocha (MDB),
disse ao Estado que o adiamen-
to do pagamento da dívida por
seis meses não é suficiente para
solucionar a crise. “A proposta
não resolve o meu problema or-
çamentário, porque estarei den-
tro do mesmo orçamento”, afir-
mou Ibaneis. “Se forem 12 me-
ses, vou ter condição de ver evo-
lução econômica, fazer uma
provisão de realidade do orça-
mento do próximo ano e, assim,
retomar o pagamento”, disse.
O governador de Goiás, Ro-
naldo Caiado (DEM), afirmou
ter pedido que a União recom-
ponha as perdas do ICMS para
atravessar a pandemia. “No
Centro-Oeste temos previsão
de queda na arrecadação do
ICMS, que pode chegar a R$ 4,
bilhões até dezembro. Afeta
nossa economia, a condição de
quitar compromissos, nossa fo-
lha de pagamento, e provoca
um efeito dominó, porque 25%
do ICMS é repassado aos muni-
cípios”, alegou Caiado.

Sul. Os governadores do Rio
Grande do Sul, Eduardo Leite

(PSDB), e do Paraná, Ratinho
Junior (PSD), consideraram a
reunião positiva, mas fizeram
novas reivindicações. Além de
cobrar o esclarecimento dos cri-
térios para o repasse dos R$ 88
bilhões, pediram mais ações na
área econômica. A principal de-
las é a suspensão do pagamento
de precatórios à União. Só no
ano passado o Paraná pagou R$
1,7 bilhão em precatórios. O Rio
Grande do Sul estima que o va-
lor destas dívidas para este ano
seja de R$ 600 milhões.

Leite e Ratinho Jr., no entan-
to, elogiaram Bolsonaro. “O
mais importante é saudar a mu-
dança de postura do presiden-
te. O presidente teve uma pri-
meira postura que não colabo-
rou na coordenação das ações.
Agora, chama estas reuniões e
isso é saudável”, disse o tucano.
Hoje, Bolsonaro tem video-
conferência com os governado-
res de São Paulo, João Doria
(PSDB), e do Rio, Wilson Wit-
zel (PSC), hoje dois de seus prin-
cipais adversários políticos.

PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


BRASÍLIA

Seis dias após o deputado
Eduardo Bolsonaro (PSL-SP)
se envolver em uma polêmica
com a Embaixada da China no
Brasil por culpar o país pela dis-
seminação do novo coronaví-
rus, o presidente Jair Bolsonaro
e o presidente da China, Xi Jin-
ping, conversaram ontem por
telefone. Segundo Bolsonaro, a
reunião tratou de ações contra
a pandemia e da ampliação do
comércio entre as duas nações.
“Ambos reiteraram o com-
promisso com a estabilização e
ampliação da parceria comer-
cial, em especial neste contexto
desafiador, contribuindo res-

ponder ao impacto causado pe-
la covid-19 na economia mun-
dial e se empenhar para reto-
mar o crescimento econômico
e comercial no mundo”, escre-
veu no Twitter o embaixador da
China no Brasil, Yang Wan-
ming, que, na semana passada,
exigiu um pedido de desculpas
de Eduardo pela declaração.
A China é o principal parcei-
ro comercial do Brasil. Só no
ano passado, o país asiático
comprou US$ 65,4 bilhões em
produtos brasileiros. Já com re-
gistro de queda nos casos de co-
ronavírus, os chineses têm ofe-
recido apoio a outros países.
Segundo Wanming, a conver-
sa entre os dois líderes ocorreu
em um “ambiente muito cor-
dial e amistoso”. Pouco antes,
Bolsonaro já havia publicado
que o contato reafirmou os “la-
ços de amizade”.
O ministro das Relações Exte-
riores, Ernesto Araújo, que de-
fendeu Eduardo após o episó-

dio e exigiu que o embaixador
da China se retratasse, afirmou
ontem que Bolsonaro e Xi Jin-
ping tiveram um “ótimo diálo-
go, reafirmando os laços de coo-
peração e comércio”. “O telefo-
nema mostra que, para a China,
a relação é tão importante quan-
to para o Brasil, e que nossa po-
lítica externa com a China está
no caminho correto”, escreveu
o chanceler nas redes sociais.

Tuíte. No dia 18, Eduardo Bol-
sonaro publicou tuíte em que
acusou a China de ter escondi-
do informações sobre o início
da pandemia do coronavírus.
“A culpa é da China e liberdade
seria a solução”, escreveu o de-
putado do PSL, seguindo a li-
nha do presidente dos Estados
Unidos, Donald Trump, que
tem se referido ao novo corona-
vírus como “vírus chinês”.
Wanming exigiu um pedido
de desculpas ao povo chinês.
Numa das mensagens, o diplo-
mata escreveu que Eduardo
contraiu um “vírus mental” ao
voltar dos Estados Unidos, on-
de esteve com a comitiva presi-
dencial – que já tem 22 infecta-
dos com covid-19. Diante das
críticas, Eduardo publicou uma
nota em que disse que jamais
quis ofender o povo chinês e
que o Brasil não quer proble-
mas com o país asiático. / J.S.

Pandemônio


Em reunião com Bolsonaro e ministros, representantes das regiões


Centro-Oeste e Sul pedem esclarecimentos sobre repasse de verba


Videoconferência. Leite durante reunião com presidente

OMS diz que EUA caminham para ser epicentro da pandemia de coronavírus. Pág. A7 }


Após polêmica de


Eduardo, Bolsonaro


fala com Xi Jinping


MARCOS CORRÊA/PR

Governadores têm


dúvidas e voltam


a cobrar o governo


Seis dias após seu filho
acusar China de espalhar
vírus, presidente diz
que reforçou amizade
com país asiático

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