O Estado de São Paulo (2020-03-25)

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O ESTADO DE S. PAULO QUARTA-FEIRA, 25 DE MARÇO DE 2020 A


BRASÍLIA, SÃO PAULO E RIO


O Ministério da Saúde anun-
ciou ontem que pretende
aplicar 22,9 milhões de tes-
tes do novo coronavírus pelo
País. A promessa, porém, en-
volve produção acima da ca-
pacidade da Fiocruz, labora-
tório público responsável
por fornecer boa parte dos
exames. Outro obstáculo, di-
zem especialistas, é a com-
pra de kits de diagnóstico no
mercado internacional, on-
de já é difícil encontrar insu-
mos para produzir esses ma-
teriais. O Brasil já registra 46
mortes e 2.201 casos confir-
mados pela doença.

A testagem em massa é consi-
derada uma das medidas mais
efetivas para identificar o avan-
ço do vírus e criar estratégias de
controle. Um exemplo de suces-
so apontado pela Organização
Mundial da Saúde (OMS) é a Co-
reia do Sul. O governo brasilei-
ro afastava a possibilidade de
exames em larga escala, mas
passou a prever esse modelo
desde o fim de semana.
Segundo o ministério, 5,6 mi-
lhões de exames estariam à dis-
posição nos próximos cinco
dias. O governo pretende agora
intensificar a aplicação entre
profissionais de saúde e de segu-
rança, além de verificar casos
graves e óbitos. A ideia é focar
inicialmente cidades com mais
de 500 mil habitantes, para con-
ter maiores surtos. “Possivel-
mente o Brasil será um dos que
vão registrar o maior número
de casos, porque vamos testar
muita gente”, diz Wanderson
de Oliveira, secretário de Vigi-
lância em Saúde da pasta.
Segundo ele, o Brasil precisa-
rá produzir de 30 mil a 50 mil
testes por dia no período de pi-
co do coronavírus. Hoje, a capa-
cidade do Brasil é de cerca de 7
mil diários. A Coreia faz até 15
mil testes por dia. Até agora, fo-
ram cerca de 350 mil testes, em
uma população de 51 milhões.
Do total previsto, 14,9 mi-


lhões de testes são os molecula-
res, ou PCR, que incluem a cole-
ta de material no nariz e na farin-
ge, com uso de cotonete. Esse
teste demora mais tempo para
ter o resultado conhecido, mas
é preciso e mais seguro, confor-
me o protocolo da OMS. Ou-

tros 8 milhões de testes rápi-
dos, que ainda precisam ter sua
eficácia analisada e que devem
ser usados na triagem de pacien-
tes, também estão previstos pa-
ra as próximas semanas.
Os dados de produção da Fio-
cruz indicados pelo ministério
para fazer os kits estão além da
capacidade de Biomanguinhos,
fábrica da Fiocruz. A pasta afir-
mou que a fundação entregaria,
até o dia 30, 2 milhões de testes
moleculares, e mais 1 milhão
em três meses. Ao Estado , Mar-
co Krieger, vice-presidente de
Produção e Inovação em Saúde
da Fiocruz, evitou contradizer
o governo, explicando que pre-
visões de produção mudam a ca-
da dia, mas informou dados

mais modestos. Segundo ele, a
produção inicial de kits de PCR
em Biomanguinhos foi pensada
para fornecer material para os
30 laboratórios de referência
do País. “Estávamos falando,
no começo da epidemia, de pro-
duzir, no máximo, 7,5 mil kits
por dia, porque essa era a capaci-
dade de execução dos laborató-
rios.” Até agora, foram entre-
gues pouco mais do que 30 mil.
“Mas como casos cresceram
muito em todo o mundo, e surgi-
ram evidências científicas de
que testes em larga escala trou-
xeram resultados, o governo co-
meçou esforço para aumentar a
capacidade dos laboratórios”,
diz. “Saímos de março, em que a
expectativa era abaixo de cem

mil testes, para entrar em abril,
em que poderemos facilmente
produzir até 500 mil durante o
mês (no lugar de 2 milhões previs-
tos pelo governo) e, quem sabe,
com uma rede capaz de execu-
tar esses números.”
Paralelamente, segundo ele,
a Fiocruz está negociando com
três fornecedores a compra de 5
milhões de testes sorológicos,
que avaliam a presença de anti-
corpos ao vírus no corpo. Esse
material ainda não chegou e pre-
cisará ser validado antes de ser
colocado à disposição. “O teste
molecular é mais sofisticado. O
sorológico é mais rápido e de
mais fácil execução, o que des-
centraliza o serviço, mas tem a
desvantagem de fazer uma de-

tecção mais tardia da doença.”
Mas Krieger diz que ainda
não é garantia de que todos os 5
milhões poderão entrar no siste-
ma, pois dependem da valida-
ção. Isso é feito com a checa-
gem de casos já identificados co-
mo positivos ou negativos. Ele
afirma que unindo exames mo-
leculares com os rápidos “é pos-
sível chegar aos números” anun-
ciados pelo governo.
“Estamos falando de duas
aplicações, dois custos e duas
dificuldades diferentes de exe-
cução.” Krieger estima ainda
que, com esse volume, será pos-
sível baratear os testes rápidos,
de cerca de R$ 80 para em torno
de R$ 20; e os moleculares, com
aumento da escala de produ-
ção, de R$ 200 para menos de
R$ 100. Segundo o ministério, a
testagem em massa custaria ao
menos R$ 436,4 milhões.
Paralelamente, o governo ne-
gocia a compra de mais 10 mi-
lhões de exames completos e es-
pera doação de 5 milhões de tes-
tes rápidos prometida pela mi-
neradora Vale. A Petrobrás
anunciou doação de 600 mil. O
governo sinalizou buscar testes
no mercado internacional, mas
tem dificuldades. “A Índia aca-
bou de fazer bloqueio por 21
dias de todo o seu território. A
China está com dificuldade de
fornecimento de insumos. For-
necedores de máquinas não
conseguem suprir o mercado in-
ternacional”, diz Oliveira

Economia. Segundo o Estado
apurou, o presidente Jair Bolso-
naro já pediu ampliação de tes-
tes. A leitura é que isso pode tra-
zer vantagem para a economia.
Ao realizar maior número de
diagnósticos, pessoas com qua-
dros leves poderiam retornar
ao trabalho após 14 dias. Sem o
exame, a pessoa poderia ficar se-
manas em isolamento para evi-
tar contágio, pois não saberia
que está infectada. /GIOVANA
GIRARDI, ANDRÉ BORGES, JULIA
LINDNER, MATEUS VARGAS, FABIO
GRELLET E FABIANA CAMBRICOLI

Metrópole


Talita Nascimento

Em meio ao avanço da pande-
mia do novo coronavírus pelo
País, a Prefeitura de São Paulo,
a Ambev, a Gerdau e o Hospital
Israelita Albert Einstein anun-
ciaram ontem que uniram esfor-
ços para construir um novo cen-
tro de tratamento para a doen-
ça na capital paulista. O hospi-
tal terá cem leitos comuns que
atenderão o público exclusiva-
mente pelo Sistema Único de
Saúde (SUS).
Ele será construído de forma
anexa ao Hospital Municipal
M’Boi Mirim – Dr. Moysés
Deutsch, na zona sul de São Pau-
lo. O Einstein já é responsável
pela gestão dessa unidade. As
obras começaram ontem e a no-
va área terá os primeiros 40 lei-
tos entregues em 20 dias, de

acordo com um comunicado en-
viado em primeira mão ao Esta-
dão/Broadcast. O total de cem
leitos deve ser finalizado até o
dia 30 de abril.
A nova unidade de saúde não
se trata de um hospital de cam-
panha, como o que será cons-
truído no Estádio do Pacaem-
bu, para atender pacientes de
baixa e média complexidade.
Dessa forma, após o combate à
pandemia, o centro de trata-
mento será entregue à Prefeitu-
ra de São Paulo e passará a inte-
grar a rede pública de saúde do
Município.
O custo do empreendimento
está estimado em R$ 10 milhões
e os organizadores buscam mo-
bilização de empresas para

transformar os leitos comuns
em estruturas de UTI.
“Esse momento pede colabo-
ração e união de esforços. Cada
um deve fazer o que está ao seu
alcance para, juntos, superar-
mos essa situação o quanto an-
tes”, diz Jean Jereissati, CEO da
Ambev. A fabricante de bebi-
das, que fará a gestão do projeto
e arcará com os custos de cons-
trução, informa que os leitos se-
rão estruturados com a técnica
de construção modular, criada
pela Brasil ao Cubo, uma cons-
trutech brasileira.
Essa técnica permite entre-
gar obras em caráter definitivo
e com velocidade que já que é
quatro vezes mais rápida do
que uma construção comum. O
Hospital Israelita Albert Eins-
tein ficará com a gestão do aten-
dimento. Aproximadamente
200 profissionais entre médi-
cos e equipe multidisciplinar,
que integram a equipe do Eins-
tein, serão deslocados para a no-
va unidade, que contará com
atendimento 24 horas.

Matéria-prima. A Gerdau, que
providenciará a estrutura me-
tálica da construção, reforça
que “o momento pede colabora-
ção”. O aço fornecido pela em-
presa é a principal matéria-pri-
ma para o método construtivo
escolhido.

Bruno Ribeiro


O governador de São Paulo,
João Doria (PSDB), afirmou on-
tem que detentos do sistema
prisional paulista vão passar a
produzir máscaras de proteção
contra o novo coronavírus. Se-
rão 320 mil peças no total, 26
mil por dia. As peças terão um
custo de R$ 0,80 por unidade.
Doria também afirmou que
haverá registro online de ocor-
rências policiais do Estado para
casos de roubo ou furto a resi-
dência, carga, ou a estabeleci-
mento comercial; crimes con-
tra o consumidor, ameaça, este-
lionato, entre outros. As exce-
ções são ocorrências que preci-
sam de coleta de provas, como


estupro, violência doméstica,
homicídio ou latrocínio.
Começou a valer a partir de
ontem no Estado de São Paulo a
quarentena em todas as 645 ci-
dades. A medida vale até o dia 7
de abril. A determinação prevê
o fechamento do comércio e ser-
viços não essenciais. Doria des-
cartou a possibilidade de “lock-
down” no Estado, por ora, ou
fechamento de rodovias e aero-
portos. E também descartou a
possibilidade de o Estado ter
um toque de recolher.

Isolamento. Após a confirma-
ção da contaminação pelo novo
coronavírus pelo infectologista
David Uip, chefe do centro de

contingenciamento da covid-
19 de São Paulo, a gestão Doria
quer alterar a regulamentação
das regras de isolamento previs-
tas pelo governo federal.
O secretário estadual da Saú-
de, José Henrique Germann,
afirmou que São Paulo vai pedir
alteração na portaria do Minis-
tério da Saúde que solicita o iso-
lamento de pessoas que confir-
madamente tiveram contato
com pessoas infectadas. “Os
profissionais de saúde têm a
obrigação e têm a missão de tra-
tar os pacientes e por isso nem
aqueles acima de 60 anos de ida-
de foram dispensados do traba-
lho. Todos eles estão trabalhan-
do, todos estão exercendo suas
funções normalmente.”
“Uma série de pessoas que ti-
veram contato com pessoas po-
sitivas passa então, agora, a não
trabalhar? Isso pode ser para o
público em geral, não para os
profissionais de saúde. Então,
estamos fazendo essa revisão,
estamos alinhados com o minis-
tério e até amanhã teremos
uma determinação nova”, con-
cluiu o secretário.
São Paulo tem, de acordo
com a Secretaria Estadual da
Saúde, 30 mortes e 745 casos
confirmados da doença. É o Es-
tado mais afetado até o mo-
mento pelo novo coronavírus
no País.

PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


Governo promete testar 22,9 milhões e


prevê entrega além do limite da Fiocruz


l Próximos dias

l Esforços

l Teste negativo
Ontem, o governador de São Pau-
lo, João Doria, e o prefeito Bruno
Covas, ambos do PSDB, anuncia-
ram que deu negativo o resulta-
do do teste para coronavírus.

Em 10 dias, governo empenha R$ 1,8 bi. Pág. A10}


ROBIN VAN LONKHUIJSEN/EFE

5,6 milhões
é a quantidade de exames que
estariam disponíveis nos próxi-
mos cinco dias, segundo estimati-
vas do Ministério da Saúde; o go-
verno federal pretende intensifi-
car testes em profissionais de
saúde e de segurança.

Secretário do Ministério da Saúde estima fazer de 30 mil a 50 mil exames diários no período de pico da pandemia por coronavírus, mas


promessa esbarra na capacidade de produção de laboratório público; outro obstáculo é a dificuldade de encontrar insumos no mercado


Exame. Laboratorista mostra kit de teste; no País, cidades com mais de 500 mil habitantes devem receber o material antes

“Esse momento pede
colaboração e união de
esforços. Cada um deve
fazer o que está ao seu
alcance.”
Jean Jereissati
CEO DA AMBEV

Prefeitura, Ambev,
Gerdau e Einstein
fizeram parceria para
abrir unidade com 100
leitos na zona sul

Empresas vão fazer


centro de tratamento


Governo anuncia a


produção diária de 26 mil


peças e questiona regras


de isolamento para


profissionais de Saúde


Presos de SP farão


máscaras e registro


de crime será online


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