O Estado de São Paulo (2020-05-21)

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O ESTADO DE S. PAULO QUINTA-FEIRA, 21 DE MAIO DE 2020 Economia B


PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


Renato Jakitas


Entre os setores que mais acu-
mulam processos pelo não pa-
gamento de verbas rescisó-
rias na Justiça durante a pan-
demia está o de comércio va-
rejista, bares e restaurantes,
com 119 ações protocoladas
diariamente nos últimos 30
dias. O segmento foi um dos
primeiros a serem afetados
com as medidas de restrição
de circulação e, mesmo apli-
cando a Medida Provisória
936, que criou a redução de sa-
lários, demitiu ao menos 1 mi-
lhão de trabalhadores desde
o início da crise, segundo da-
dos da Associação Brasileira
de Bares e Restaurante.

O setor só perde para o da in-
dústria de transformação em nú-
mero de ações diárias (155 pro-
cessos), e é seguido pelo seg-
mento de serviços financeiros
(74 processos) e pelos trabalha-
dores de transportes (47).
Dono de oito estabelecimen-
tos em São Paulo, entre eles os
bares Quintana e Veríssimo,
Marcos Livi já demitiu 89 funcio-
nários desde março. Hoje, dos
205 que restam, só 40 estão em
atividade, nas operações de deli-
very. Os demais estão com con-
trato suspenso. “Tenho conheci-
mento de gente que já está demi-
tindo sem caixa para pagar”, diz.


“Ninguém tem dinheiro para
mandar embora todo mundo.
Eu mesmo seguro como está até
julho. Se não retomar a atividade
até lá, eu quebro em agosto e não
tenho como pagar ninguém.”

‘Fato do príncipe’. Entre as em-
presas que demitiram sem pa-
gar integralmente as verbas res-
cisórias em função da pande-
mia está a churrascaria Fogo de
Chão, que desde 2018 pertence
ao fundo de investimentos ame-
ricano Rhône Capital. A rede de-
mitiu 436 funcionários em suas
oito unidades, e pagou cerca de
80% dos direitos trabalhistas.
Mas, neste caso, o motivo não é
falta de caixa. A conta dos 20%
que restam, uma parte da multa
de 40% aplicada aos depósitos
do FGTS, o Rhôde Capital diz
que mandará aos governadores
estaduais.
A Fogo de Chão quer, com is-
so, aplicar um expediente jurídi-

co conhecido como “fato do
príncipe”, que rege o Artigo 486
da CLT, segundo o qual em caso
de paralisação deliberada pelos
governos municipal, estadual
ou federal, os encargos traba-
lhistas ficariam com o ente pú-
blico.
Entre advogados, a expectati-
va é que a medida da Fogo de
Chão acabe na Justiça. Para o
sócio do Mattos Filho Advoga-
dos, Cleber Venditti da Silva, di-
ficilmente a decisão será favorá-
vel à companhia. “Esse é um as-
sunto que surgiu forte entre as
empresas. Mas eu não estou re-
comendando essa estratégia
por acreditar que o Judiciário
não vá acolher o ‘fato do prínci-
pe’, já que a restrição de circula-
ção é por motivo de saúde, de
força maior.”
Mesmo assim, entre empresá-
rios do setor existe uma expecta-
tiva a respeito do fim dessa his-
tória. Se a Fogo de Chão conse-
guir transferir parte da conta da
rescisão para os governadores,
a tendência é que outros empre-
sários sigam pelo mesmo cami-
nho. “Eu não gosto da medida,
porque acho que o governo vai
encontrar uma forma de não pa-
gar os trabalhadores. Mas, se
não tiver jeito, como último ex-
pediente, eu entro com esse ‘fa-
to do príncipe’”, diz o fundador
da pizzaria 1900, Edrey Momo.

Ele mesmo conta que demitiu
110 de seus 400 funcionários e,
sem dinheiro para pagar todas
as rescisões, dividiu a conta em
seis parcelas. “Foi uma espécie
de licença poética que adotei,
porque ninguém tem dinheiro

para mandar 110 pessoas nesse
mercado. Então pode ser que eu
ainda tenha algum passivo na
Justiça Trabalhista em função
disso”, afirma.
Desde o início da escalada da
pandemia, há 60 dias, o número

de processos em geral na Justi-
ça Trabalhista caiu a um quarto
na comparação com o mesmo
período de 2019. “Na verdade, a
Justiça está operando com ape-
nas parte de sua capacidade ( em
função das medidas de isolamento
social). Vamos observar um es-
touro de processos daqui para
frente relacionados ao corona-
vírus”, diz a desembargadora
Ana Flávia de Moraes Garcia
Cuesta, do Tribunal Regional
do Trabalho da 15.ª Região, em
Campinas.
Os prazos para os processos
em trânsito na Justiça foram re-
tomados no início de maio, após
suspensão por um mês pelo Con-
selho Nacional de Justiça (CNJ).
Além disso, os escritórios estão
operando em sistema de home
office, o que dificulta o acesso
aos advogados pelos trabalhado-
res com demandas judiciais.

l Perspectiva

Guedes estuda nova versão da Carteira Verde Amarelo. Pág. B4 }


Restaurantes estão


entre os que mais


enfrentam ações


Segmento foi um dos primeiros a sentir os efeitos das medidas


de isolamento impostas para reduzir disseminação da covid-


“Ninguém tem dinheiro
para mandar embora todo
mundo. Eu seguro até julho.
Se não retomar a atividade,
eu quebro e não tenho
como pagar ninguém”
Marcos Livi
EMPRESÁRIO

Valor das ações

Principais Estados
em número de
processos

Evolução do número de
processos (por semana)

●Histórias de empresas que demitem sem pagar verbas rescisórias chegam aos fóruns; SP,
Minas e Rio Grande do Sul lideram em número e valor de ações

PANDEMIA CHEGA À JUSTIÇA DO TRABALHO

FONTES: FINTEDLAB E DATALAWYER INFOGRÁFICO/ESTADÃO

São Paulo
Minas Gerais
Rio Grande do Sul
Rio de Janeiro
Pernambuco

3.
3.
1.
1.
1.

30/12/
6/1/
13/
20/
27/
3/
10/
17/
24/
2/
9/
16/
23/
30/
6/
13/
20/
27/
4/
11/
18/

1
6
14
27
50
86
137
192
211
258
311
676
1.
3.
4.
7.
10.
13.
16.
18.
18.

MAIS DE
R$ 90 MILHÕES

DE R$ 0,2 MILHÕES
A R$ 15 MILHÕES

Valor das ações

Principais Eststadaoss
em número de
processos

Evo
pro

FONTES: FINTEDLAB E DATALAWYER

São Paulo
Minas Gerais
Rio Grande do Sul
Rio de Janeiro
Pernambuco

3. 7793
3. 06655


  1. 8444
    1.5 966

  2. 1577


30 / 12 /
6/ 1 /

MAIS DE
R$ 90 MILHÕES

DE R$ 0,2MIMILHLHÕES
A R$1$ 15 MILHÕESS

RS

SC

PR

SP

MS

GO

RO TO

AM

AC

RR

MT

RJ

ES

BA

SE

AL

PE

PB

RN

CE

PI

PA MA

AP

MG

DF

DE R$ 16 MILHÕES
A R$ 90 MILHÕES

VALOR DAS
CAUSAS É MAIOR
EM MINAS, ONDE
JÁ CHEGA A
R$ 228 MI

MARCOS LIVI

Corte. Marcos Livi afirma já ter demitido 89 funcionários
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