O Estado de São Paulo (2020-05-31)

(Antfer) #1

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A4 DOMINGO, 31 DE MAIO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


COLUNA DO


ESTADÃO


Política


»Cenário. O resultado do
PIB no primeiro trimestre
foi de queda de 1,5%, pior
resultado desde 2015. Já as
mortes por covid-19 ultra-
passam 28 mil no Brasil.

»Pera lá. A atuação do mi-
nistro da Defesa, Fernando
Azevedo e Silva, tem susci-
tado críticas dentro das For-
ças Armadas. Alegam que
ele estaria encampando de
forma excessiva e pública o
discurso do presidente.

»Pera lá 2. O desconforto
vem em especial de coman-
dantes da ativa. Azevedo e
Silva endossou as críticas
do ministro Augusto Hele-
no ao Judiciário, como reve-
lou a Coluna.

»Trocando... Segundo um
ex-ministro da pasta, ele
deveria agir como “ponte”,
mas tornou-se um “muro”.

»... em miúdos. Explica-se:
quem comanda a Defesa
tem de atuar, diz esse ex-
ministro, como interlocu-
tor das Forças Armadas
com o governo e a socieda-
de. Para esses críticos, Aze-
vedo está endossando ex-
cessivamente o presidente
e perdendo a capacidade de
fazer o meio de campo

»‘Sertinhos’. Ministro da
articulação política do gover-
no, Luiz Eduardo Ramos en-
trou na mira dos olavistas.
Resgataram uma foto sua
antiga com o “comunista”
Aldo Rebelo (ex-PCdoB),
para criticá-lo. Rebelo é ex-
ministro da Defesa e, na fo-
to, Ramos era comandante.

»Contra-ataque. O minis-
tro da Secretaria de Gover-
no respondeu na mesma
arena: publicou no Twitter
uma foto sua ao lado do
presidente. Disse que ten-
tam “distorcer fatos anti-
gos e retirados de contex-
to”, mas que continua “fir-
me e forte” ao lado de seu
amigo de 46 anos.

»Cautela... A OAB vai espe-
rar o STF avançar no in-
quérito que investiga se
Jair Bolsonaro interferiu na
Polícia Federal para decidir
sobre um eventual pedido
de impeachment. Conselhei-
ros defendem prudência
neste momento para não
banalizar o instrumento.

»...e canja. A entidade en-
viou um ofício ao ministro
Celso de Mello, responsá-
vel pelo inquérito, com o
pedido de mais informa-
ções. O documento ainda
não foi respondido. A OAB
também pediu mais infor-
mações ao presidente e a
Moro, sem sucesso.

»De que lado. Fernando
Collor, disse, em uma webi-
nar promovida pelo IREE
(Instituto para a Reforma
das Relações entre Estado e
Empresa), que boa relação
com os EUA não significa
alinhamento automático..

»Amigos, pero... Em 1989,
na Casa Branca, George
Bush quis saber o que ele
achava sobre uma eventual
intervenção militar em Cu-
ba. “Estarei contra toda e
qualquer intervenção mili-
tar (...). Cuba, muito me-
nos”, teria dito o então pre-
sidente ao americano.

COM MARIANNA HOLANDA.

D


iante do agravamento da crise na última semana, o
ex-presidente Michel Temer cobrou uma resposta
unificada de Jair Bolsonaro, Davi Alcolumbre e
Dias Toffoli. Em comentário enviado à Coluna, o emede-
bista faz um apelo por um gesto das instituições para tran-
quilizar a economia e combater o coronavírus. “Presiden-
tes dos três Poderes, ajam conjuntamente e urgentemen-
te. Agora é a responsabilidade acima de todos. É a unidade
acima de tudo”, escreveu Temer, sem citá-los nominal-
mente e parafraseando o slogan bolsonarista.

‘Responsabilidade acima


de todos’, diz Temer


MARIANA HAUBERT (INTERINA*)
TWITTER: @COLUNADOESTADAO
[email protected]
POLITICA.ESTADAO.COM.BR/BLOGS/COLUNA-DO-ESTADAO/

‘Tudo aponta para


uma crise’, afirma


Bolsonaro. Pág.A


Presidente


Com 2,9 mil cargos, Forças


Armadas temem desgaste


Executivo. Militares já se preocupam com imagem por participação no governo; Exército


lidera ocupação, com 1.595 membros na gestão, seguido pela Marinha, com 680, e FAB, 622


Tânia Monteiro
Adriana Fernandes /BRASÍLIA

As Forças Armadas já pre-
veem que terão uma “enor-
me” conta para pagar ao fim
do mandato do presidente
Jair Bolsonaro pela presença
de militares na cúpula e na ba-
se do governo. Em conversas
nos quartéis e gabinetes de
Brasília, oficiais admitem
que a nova incursão na políti-
ca, após 35 anos do fim da di-
tadura militar, trará desgas-
te à imagem da instituição e
temem perder a credibilida-
de duramente reconquistada
por causa do envolvimento
com o governo e a perspecti-
va de seu naufrágio.
O Exército é quem deve ficar
com o maior ônus por ter um
maior contingente no quadro
da máquina pública bolsonaris-
ta. Levantamento do Ministério
da Defesa, feito a pedido do Es-
tadão, mostra que militares da
ativa já ocupam quase 2,9 mil
cargos no Executivo. São 1.
integrantes do Exército, 680 da
Marinha e 622 da Força Aérea
Brasileira (FAB).
Destes, 42% estão emprega-
dos na estrutura da Presidência,
especialmente no Gabinete de
Segurança Militar, um órgão
que foi reforçado no atual gover-
no. Três oficiais ocupam o pri-
meiro escalão: Walter Braga Net-
to (Casa Civil), Augusto Heleno
(Gabinete de Segurança Institu-
cional) e Luiz Eduardo Ramos
(Secretaria de Governo). O incô-
modo com uma possível cobran-
ça ocorre diante da constatação
de que o pessoal da ativa nas

Forças Armadas está não ape-
nas em cargos estratégicos,
mas em postos comissionados.
São vagas de Direção e Assesso-
ramento Superior, os DAS, com
vencimentos que vão de R$
2.701 a R$16.944 por mês.
Na prática, seja qual for o go-
verno, sempre haverá desgaste
para quem participar dele. No
caso da gestão Bolsonaro há
um adicional. É um governo
que vive em crise constante e
são frequentes as cobranças pa-
ra que os oficiais se manifes-
tem sobre todos os atos polêmi-
cos do presidente, como partici-
par de manifestações antide-
mocráticas. O que tem exigido
do ministro da Defesa, Fernan-
do Azevedo, divulgar notas pa-
ra reafirmar o compromisso
constitucional das Forças com
a democracia.
Na última semana, o minis-
tro Luiz Eduardo Ramos, que é
general da ativa, se viu obriga-
do a dar explicações a seus cole-
gas de turma da Academia Mili-
tar das Agulhas Negras (A-
MAN) após o Estadão revelar
que ele tem oferecido cargos
ao Centrão, bloco fisiológico
de partidos, em troca de apoio
ao governo no Congresso. “É
pelo respeito que tenho ao
meu Exército que estou divul-
gando essa mensagem”, disse,
ressaltando não ser “político”
e estar cumprindo uma “mis-
são”. O ministro já havia causa-
do desconforto ao usar farda
numa solenidade, ao lado do
presidente, em 30 de abril, no
Comando Militar do Sul, em
Porto Alegre.
Até mesmo a fama de bons

gestores dos militares é coloca-
da em xeque. Chocou ministros
do Supremo o fato de nenhum
dos generais presentes já na fa-
mosa reunião de Bolsonaro
com sua equipe ter pedido mo-
deração aos seus colegas que
atacaram outros poderes com
palavras de baixo calão. Um mi-
nistro ouvido pelo Estadão ob-
servou que os generais, no míni-
mo, não deveriam ter permiti-
do a gravação do encontro.
A presença dos militares no
Ministério da Saúde também
causa preocupação. Eles toma-
ram conta da pasta no momen-
to em que o novo coronavírus
avança e dois médicos civis pe-
diram demissão por discorda-
rem da orientação do presiden-
te na condução da crise, o que o
atual cumpre à risca.
Especializado em logística,
Pazuello já nomeou 20 milita-
res e pretende chamar mais 37,
no mínimo por três meses. A mi-
litarização também avançou pa-
ra postos que requerem expe-
riência específica. Na quarta-
feira, por exemplo, o coronel do
Exército Luiz Otávio Franco
Duarte foi nomeado secretário

de Atenção Especializada, res-
ponsável por habilitar leitos de
UTI e distribuir recursos para
Estados e prefeituras.

Marinha. Mesmo com menos
pessoal no governo, a Marinha
já espera uma cobrança por sua
atuação na gestão Bolsonaro. A
presença do almirante Flávio
Rocha, recém-promovido a qua-
tro estrelas, no Palácio do Pla-
nalto preocupa a instituição. Ro-
chinha, como é chamado no
meio, tem recebido diferentes
missões do presidente, como
contornar a crise na Secretaria
da Cultura. O outro almirante é
Bento Albuquerque, que co-
manda Minas e Energia.
De todas as forças, a Aeronáu-
tica é, até agora, a mais preserva-
da de eventuais desgastes. Ape-
sar de ser tenente-coronel da re-
serva no comando do Ministé-
rio da Ciência, Tecnologia e Ino-
vação, Marcos Pontes não foi es-
colhido por ser da FAB.
Na avaliação do cientista po-
lítico e pesquisador da Funda-
ção Getúlio Vargas (FGV) Car-
los Pereira, “é natural” que Bol-
sonaro “vá buscar apoio no se-
tor onde dispõe de maior con-
fiança”. Pereira alertou, porém,
que as Forças Armadas correm
risco muito grande ao embar-
car, com essa proporção, em um
governo. “As Forças Armadas
demoraram muito tempo para
limpar seu nome e cumprir seu
papel constitucional. Agora, cor-
rem o risco de se comprometer
mais uma vez”, afirmou o cien-
tista político e colunista do Esta-
dão. / COLABORARAM MATEUS
VARGAS e FELIPE FRAZÃO

KLEBER SALES/ESTADÃO O


mantra do Palácio do Planalto é válido. Este não é
um governo militar. É um governo com militares
na administração. Pois é. Ainda. E essa equação
não pode fugir do controle. O completamento de qua-
dros civis com pessoal do efetivo do Exército, Marinha e
Aeronáutica é definido por um integrante do Alto Co-
mando como “uma solução fácil na procura por compro-
metimento, dedicação e caráter”. Para ele, “são pessoas
que, convocadas, vão encarar o trabalho como uma mis-
são a ser cumprida”.
O oficial lembra que os 2,9 mil cargos até agora ocupados
pelos oficiais representam uma proporção pequena em rela-
ção ao total de 617 mil postos distribuídos pelas 300 carrei-
ras do funcionalismo federal. Durante os primeiros quatro
dos cinco governos do regime pós-golpe de março de 1964
foi bem pior. No final do período, sob o então presidente
João Batista Figueiredo, general com longa experiência no
tenebroso Serviço Nacional de Informações (SNI), extinto

em 1990, foi organizada uma saída discreta e gradual dos mi-
litares de dentro da capilarizada malha da administração.
Foram criados estímulos para a volta aos quartéis e às bases.
Ainda assim, pouco antes da posse de José Sarney em
abril de 1985, havia cerca de 10 mil militares em atividades
do governo, de acordo com um ex-analista do Estado
Maior das Forças Armadas (Emfa), desativado em 1999. O
fluxo da retirada se manteve nos anos seguintes. O que
houve depois foi um longo empenho na profissionalização
das Forças Armadas. Mudanças nos currículos e exigên-
cias das escolas superiores de formação, qualificação de
especialistas e “adequação ao pensamento geopolítico de
um mundo em transformação”, na opinião do oficial do
Alto Comando ouvido há dois dias pelo Estadão.
A preocupação política passou a ser uma questão pes-
soal principalmente nas faixas operacionais, oficialida-
de de média patente que cuida das ações de campo. Os
mesmos que atuam agora na Operação Verde Brasil 2 de
vigilância contra ilícitos na Amazônia Legal. A ação que
destrói tratores e escavadeiras de desmatadores e garim-
peiros clandestinos apreendeu 6,3 mil m³ de madeira
clandestina, prendeu traficantes e aplicou R$ 16 milhões
em multas.

Elena Landau


»SINAIS
PARTICULARES.
Fernando Azevêdo
e Silva, ministro
da Defesa

Objetivo é manter equilíbrio de


uma gestão civil com militares


lComprometimento


PRONTO, FALEI!


ALBERTO BOMBIG
*O colunista está em férias.

]
ANÁLISE: Roberto Godoy

DIDA SAMPAIO/ESTADAO

“As Forças Armadas
demoraram muito tempo
para limpar seu nome e
cumprir seu papel
constitucional. Agora,
correm o risco de se
comprometer mais
uma vez.”
Carlos Pereira
CIENTISTA POLÍTICO DA FGV

Generais. Luiz Eduardo Ramos (Governo) e Augusto Heleno (GSI) são representantes no primeiro escalão do governo


“O Brasil precisa superar FHC, Lula e Bolsonaro,
criar novas lideranças. Tem tanta gente boa
aparecendo. Parar com essa de salvador da pátria”.

Economista


»CLICK. O deputado esta-
dual de SP pelo PSL, Dou-
glas Garcia (à esq. aci-
ma), alvo do inquérito
das fake news no STF,
jantou com Jair Bolsona-
ro nesta sexta-feira.

REPRODUÇÃO/TWITTER
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