O Estado de São Paulo (2020-06-02)

(Antfer) #1

%HermesFileInfo:A-2:20200602:
A2 Espaçoaberto TERÇA-FEIRA, 2 DE JUNHO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO






Enquanto as tensões aumenta-
vam nos EUA após um policial
branco ter sufocado George
Floyd até a morte, os manifes-
tantes receberam um apoio
inesperado: o setor privado
americano. Empresas como
Nike, Twitter e Citigroup se
alinharam ao movimento
Black Lives Matter. A Netflix


postou na sua conta no Twit-
ter no sábado: “Ficar em silên-
cio é ser cúmplice. Vidas ne-
gras são importantes. Temos
uma plataforma e temos o de-
ver de divulgar nossos mem-
bros, funcionários, criadores
e talentos negros.”

http://www.estadao.com.br/e/movimentonegro

E


m meio a uma trágica
pandemia, a maior ca-
tástrofe vivida pelas
atuais gerações, devastadora
para vidas humanas e avassala-
dora para o sistema produtivo,
o Brasil se obriga a enfrentar
outra frente desafiante: a defe-
sa da democracia como um va-
lor essencial para organizar a
nossa sociedade. Espantosa
missão, seja porque há pouco
mais de três décadas saímos de
uma ditadura, seja porque já te-
mos problemas demais a supe-
rar, seja porque “estamos em
pleno século 21 sendo afronta-
dos com discursos, ameaças e
situações medievais”. Inacredi-
tável, mas terrivelmente real.
A partir de 1964, foram 21
anos de arbítrio, com censura
à imprensa e às artes, exílio
forçado de concidadãos, cassa-
ção de direitos políticos, desa-
parecidos e presos políticos,
torturas e mortes nos porões
da opressão, supressão de elei-
ções, interdições a liberdades
civis e políticas (opinião, reu-
nião, organização, etc.), entre
tantas tragédias urdidas nos
“anos de chumbo”. Ao fim, o
poder civil recebeu o País com
um endividamento externo ir-
responsável e a economia em
frangalhos.
Nos anos 1970, na universi-
dade, entrei nos movimentos
sociais em busca da retomada
das liberdades em nosso país.
Nesse tempo de embates e for-
mação política, tive um apren-
dizado fundamental: a demo-
cracia é um valor universal a
nortear as formas de conquis-
ta e exercício do poder em to-
da e qualquer sociedade que
se queira civilizada e huma-
nística.
Sob a Constituição de 1988,
reconstruímos a democracia.
Não foi um tempo perfeito, co-
mo nenhum foi ou será, até
porque a política não é feita
por deuses, mas por seres hu-
manos, suscetíveis de erros e
imperfeições. Mas é inegável
que percorremos um período
de avanços socioeconômicos,
com o funcionamento do Esta-
do Democrático de Direito e
as devidas correções de ru-
mos e penalizações de des-

vios, por exemplo.
Entre as conquistas, pode-
mos citar a criação do Sistema
Único de Saúde (SUS), a uni-
versalização do acesso à educa-
ção básica, a derrocada do fla-
gelo da inflação e a criação do
Real, a ocorrência de eleições
periódicas e transparentes,
com alternância de poder, os
avanços nas agendas dos direi-
tos humanos, do meio ambien-
te e da sustentabilidade, e uma
abrangente rede de proteção
social (Bolsa Família e outros).
Enfim, ainda que lidando
com desafios gigantescos e
mal administrando uma impo-
sitiva agenda de reformas es-
truturantes, mas incrementan-
do nossa incipiente experiên-
cia democrática, o Brasil torna-
va-se pouco a pouco um país
que jamais tinha sido, em seus
mais de 500 anos de História.
Há uma agenda de ajustes?

Sim! Pelo nível de suas entre-
gas, temos uma estrutura go-
vernamental cara e ineficiente,
além de atravessada por vícios
de corrupção e assaltada por
corporações cercadas de privi-
légios. Temos um País inaceita-
velmente injusto, inseguro e
desigual. A educação precisa se
qualificar e se tornar contem-
porânea. A produção deve in-
crementar a sustentabilidade
de seus processos, além de am-
pliar sua produtividade e com-
petitividade. As instituições
precisam se digitalizar, promo-
vendo o reencontro do modus
operandi governativo com o mo-
dus vivendi da sociedade.
É patente que, em função
dessa realidade, agravada por
ampliações de privilégios de
grupo nas áreas pública e priva-
da, recessão econômica e es-
cândalos de corrupção, há uma
insatisfação crescente da socie-
dade. Mas não há atalho para
superarmos os desafios, espe-
cialmente atalhos à via demo-
crática. O conserto disso tudo
não é substituir a democracia

pelo autoritarismo. Até porque
os diversos períodos ditato-
riais por que passamos não re-
solveram problemas históricos
e quase sempre os agravaram.
A democracia não é um regi-
me pronto e acabado, nem per-
feito, mas é o melhor já produ-
zido pela humanidade para or-
ganizar o exercício do poder
em sociedades livres, igualitá-
rias e fraternas. Como bem re-
sumiu Winston Churchill, “a
democracia é a pior forma de
governo, exceto todas as ou-
tras que foram tentadas”.
Fora das luzes democráti-
cas, o que temos é a escuridão
institucionalizada, abrindo es-
paço a toda sorte de violên-
cias, perversões e injustiças
que se alastram no submundo
da ação política articulada em
torno do obscurantismo e da
deslegitimação da vontade e
do poder do povo.
Como disse recentemente o
ministro Luís Roberto Barro-
so, a “democracia não é o regi-
me político do consenso, mas
aquele em que o dissenso é le-
gítimo, civilizado e absorvido
institucionalmente”. E, neste
tempo em que tanto necessita-
mos de lucidez, recomendou:
“Precisamos de denominado-
res comuns e patrióticos. Pon-
tes, e não muros. Diálogo, em
vez de confronto. Razão públi-
ca no lugar das paixões extre-
madas. (...) Precisamos armar
o povo com educação, cultura
e ciência”.
Que a sociedade, a partir do
entendimento e mobilização
de todas as suas forças vivas,
sustente a democracia como
um valor central ao Brasil.
Que sejamos capazes de supe-
rar este tempo excepcional-
mente difícil como uma nação
livre e plural e, assim, apta a
transformar em plena realida-
de as nossas potencialidades
de justiça social e prosperida-
de compartilhada.

]
ECONOMISTA, PRESIDENTE EXECUTI-
VO DA INDÚSTRIA BRASILEIRA DE
ÁRVORES (IBÁ), MEMBRO DO CONSE-
LHO DO TODOS PELA EDUCAÇÃO, FOI
GOVERNADOR DO ESTADO DO ESPÍRI-
TO SANTO (2003-2010 E 2015-2018)

A tecnologia tem sido imple-
mentada nas mais diversas
ligas de futebol do mundo.

http://www.estadao.com.br/e/var

E-INVESTIDOR


Empresas apoiam ‘Black Lives Matter’


Contratado pelo Fluminen-
se, atacante disse que vai
pedalando para a nova casa
e doará cestas básicas para
cada km percorrido.

http://www.estadao.com.br/e/fred

l“O povo não tem o que comer e vai comprar arma? Fazer curso? Que
piada. A intenção é armar meia dúzia para defender suas maluquices.”
FÁBIO AMARAL

l“Uma das promessas do presidente era a de o cidadão capacitado ter
acesso fácil às armas. E Moro sabia desta bandeira. Quem está errado?”
BETO BREJO

l“Parem este homem. É psicótico e incita a violência. Imaginem ar-
mas na mão de ‘cabeças de bagre’? Já não basta a violência atual?”
SHEYLA CORDEIRO

l“Imaginem se, no último domingo, os dois lados dos manifestantes
na Avenida Paulista estivessem armados.”
ALEXANDRE CAROLI

INTERAÇÕES

CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO
PRESIDENTE: ROBERTO CRISSIUMA MESQUITA
MEMBROS
FERNANDO C. MESQUITA
FERNÃO LARA MESQUITA
FRANCISCO MESQUITA NETO
GETULIO LUIZ DE ALENCAR
JÚLIO CÉSAR MESQUITA

Congresso do clube paulista
começa hoje e vai ter a parti-
cipação de profissionais de
times internacionais e perso-
nalidades do futebol.

http://www.estadao.com.br/e/palmeiras

Espaço Aberto


U


m dos exemplos mais
educativos para quem,
ensurdecido pela guer-
ra entre a alta e a baixa nobre-
za da privilegiatura, não con-
segue mais discernir o que é
democracia são as votações
para aprovar ou rejeitar a con-
tratação de dívida para a con-
secução de cada obra a cargo
do poder público ou para
criar ou alterar impostos, na
democracia americana.
Há duas semanas foi publi-
cado um balanço dessas deci-
sões entre 2008 e 2019. 113
“bond issues” no valor de
US$ 77,1 bilhões foram a voto
direto dos interessados. 105,
no valor de US$ 53 bilhões, fo-
ram aprovados e oito, no va-
lor de US$ 24 bilhões, foram
rejeitados.
O direito de propriedade é
um pilar inegociável da demo-
cracia. O Estado não pode to-
mar dinheiro do povo a me-
nos que o povo explicitamen-
te concorde. Essa é a base do
sistema de emissão e aprova-
ção de “bond issues”, uma
proposta que sobe à cédula de
eleições do calendário ou em
“eleições especiais”, que lá po-
dem ser convocadas a qual-
quer momento, envolvendo
um ou mais distritos eleito-
rais específicos. Governos es-
taduais, governos municipais
e escolas públicas, para as
quais a referência são os bair-
ros, têm a prerrogativa de sub-
meter “bond issues” ao povo.
São títulos de empréstimos
bancários com valor e prazo
de resgate definidos para pa-
gar obras e outros melhora-
mentos públicos, a serem res-
gatados apenas pelos eleito-
res beneficiados por cada pro-
jeto. Pode ser um melhora-
mento numa escola pública,
caso em que o resgate será fei-
to só pelos eleitores do bairro
por ela servido mediante um
aumento por prazo e valor de-
terminado no IPTU daquela
área. Ou pode ser um aumen-
to de salário para determina-
dos funcionários, a compra de
um novo carro de bombeiros,
o asfaltamento de uma rua, a
construção de uma estrada in-
termunicipal, a desapropria-


ção de um bem para serviço
da comunidade, no caso de
“bonds” emitidos por gover-
nos estaduais ou municipais.
Em todos eles cada ação se-
rá descrita e avaliada, o valor
do empréstimo, o prazo de
resgate, os juros contratados
e a parcela da população que
irá pagá-los serão especifica-
dos e somente esses eleitores
serão chamados a votar aque-
le “issue” na cédula da eleição
geral, o que poderá ser positi-
vamente conferido, no siste-
ma de eleição distrital puro,
pelo endereço de cada eleitor.
Na última eleição presiden-
cial a média nacional de “bal-
lot measures” (questões deci-
didas no voto) tomando caro-
na nas cédulas – “bonds”, leis
de iniciativa do povo, referen-
dos, “recall”, etc. – foi de 62.
A fidelidade da representa-
ção do país real no país oficial

é outro pilar fundamental da
democracia. Só a eleição dis-
trital pura garante transparên-
cia quanto a isso. Nela cada
candidato só pode concorrer
pelos votos de um distrito. Di-
vide-se o total da população
pelo número de representan-
tes que se deseja ter (na câma-
ra municipal ou estadual) e
desenham-se no mapa físico
os distritos eleitorais com
aquele número de habitantes.
Assim, cada representante
eleito sabe o nome e o endere-
ço de cada um dos seus repre-
sentados, que, a qualquer mo-
mento, podem convocar uma
votação extra para destituí-lo.
As cédulas de cada eleição
trarão também inúmeras “tax
measures”. Nenhuma medida
envolvendo impostos pode
ser passada sem consulta es-
pecífica, no voto, a quem vai
pagá-los. Aumentos, redu-
ções, deduções, renovações
de impostos temporários,
qualquer alteração só pode
ser feita mediante aprovação
dos contribuintes. Entre 2008

e 2019, 36 “tax measures” fo-
ram decididas em 17 Estados.
Duas eram meras consultas
“non-binding” (não vinculan-
tes), um entre dezenas de mo-
delos de “ballot measure” que
a democracia americana dis-
ponibiliza para os eleitores,
no caso para acabar com aque-
las famosas “verdades estabe-
lecidas” em nome das quais
tantos crimes têm sido come-
tidos. As “consultas non-bin-
ding” servem só para estabele-
cer positivamente no que é
que o povo de fato acredita e
podem ser levadas à cédula da
próxima eleição por qualquer
cidadão que colha o número
estabelecido de assinaturas.
A maioria das “tax measu-
res” são “legislative inicia-
ted”, isto é, o legislativo esta-
dual ou municipal, antes de
pensar em votar ele mesmo a
questão, já põe sua proposta
na cédula da eleição mais
próxima ou convoca uma es-
pecial, porque sabe que votá-
la, só ele, seriam dois traba-
lhos, pois o povo convocaria
um referendo para derrubar
sua tentativa. Mas pode haver
também “tax measures” de
iniciativa popular. Das 36 re-
gistradas pela pesquisa referi-
da, uma foi um referendo,
duas foram “consultas non-
binding”, 20 foram iniciativas
de legislativos estaduais e 13
de cidadãos.
Esses mesmos instrumen-
tos existem em todos os go-
vernos municipais e até em di-
visões menores do sistema
distrital, de modo que literal-
mente tudo o que afeta a vida
dos americanos, para além da
cloroquina que o Bolsonaro
deles toma ou deixa de tomar,
é decidido desse modo. As-
sim, quando você ouvir de no-
vo discursos tonitruantes so-
bre a intocabilidade do “Esta-
do democrático de direito”
em vigor no Brasil, corra para
o banheiro e alivie-se ou vá fa-
zer alguma outra coisa de útil,
pois é só mais um dono de te-
ta tentando te fazer de idiota.

]
JORNALISTA, ESCREVE
EM WWW.VESPEIRO.COM

PUBLICADO DESDE 1875

LUIZ CARLOS MESQUITA (1952-1970)
JOSÉ VIEIRA DE CARVALHO MESQUITA (1947-1988)
JULIO DE MESQUITA NETO (1948-1996)
LUIZ VIEIRA DE CARVALHO MESQUITA (1947-1997)
RUY MESQUITA (1947-2013)

FRANCISCO MESQUITA NETO / DIRETOR PRESIDENTE
JOÃO FÁBIO CAMINOTO / DIRETOR DE JORNALISMO
MARCOS BUENO / DIRETOR FINANCEIRO
MARIANA UEMURA SAMPAIO / DIRETORA JURÍDICA
NELSON GARZERI / DIRETOR DE TECNOLOGIA

CENTRAL DE ATENDIMENTO AO LEITOR:
FALE COM A REDAÇÃO:
3856-
[email protected]
CLASSIFICADOS POR TELEFONE:
3855-
VENDAS DE ASSINATURAS: CAPITAL:
3950-
DEMAIS LOCALIDADES:
0800-014-
VENDAS CORPORATIVAS: 3856-

MUDANÇA
Fred irá de BH até o
Rio de bicicleta

Palmeiras discutirá
impacto da pandemia

COMENTÁRIOS DE LEITORES NO PORTAL E NO FACEBOOK:

NILTON FUKUDA/ESTADÃO CÉSAR GRECO/AGÊNCIA PALMEIRAS

]
Fernão Lara Mesquita


Tema do dia


Prefeitura de Florença vai
plantar 172 árvores para lem-
brar mortos da pandemia.

http://www.estadao.com.br/e/arvores

‘Estado democrático de direito’?


Corra para o banheiro!


Cuidado com os
donos de teta
tentando te
fazer de idiota

Democracia,


valor universal


Fora das luzes
democráticas, o que
temos é a escuridão
institucionalizada

AMÉRICO DE CAMPOS (1875-1884)
FRANCISCO RANGEL PESTANA (1875-1890)
JULIO MESQUITA (1885-1927)
JULIO DE MESQUITA FILHO (1915-1969)
FRANCISCO MESQUITA (1915-1969)

AV. ENGENHEIRO CAETANO ÁLVARES, 55
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DEMAIS LOCALIDADES: 0800-014-77-
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PREÇOS VENDA AVULSA: SP: R$ 5,00 (SEGUNDA A
SÁBADO) E R$ 7,00 (DOMINGO). RJ, MG, PR, SC E DF:
R$ 5,50 (SEGUNDA A SÁBADO) E R$ 8,00 (DOMINGO).
ES, RS, GO, MT E MS: R$ 7,50 (SEGUNDA A SÁBADO)
E R$ 9,50 (DOMINGO). BA, SE, PE, TO E AL: R$ 8,
(SEGUNDA A SÁBADO) E R$ 10,50 (DOMINGO). AM, RR,
CE, MA, PI, RN, PA, PB, AC E RO: R$ 9,00 (SEGUN-
DA A SÁBADO) E R$ 11,00 (DOMINGO)
PREÇOS ASSINATURAS: DE SEGUNDA A DOMINGO


  • SP E GRANDE SÃO PAULO – R$ 134,90/MÊS. DEMAIS
    LOCALIDADES E CONDIÇÕES SOB CONSULTA.
    CARGA TRIBUTÁRIA FEDERAL: 3,65%.


Para Bolsonaro, Moro


dificultou política de


armar população


Presidente afirmou a apoiadores que
ex-ministro foi ‘covarde’ e ‘estava aliado
a outra ideologia que não era nossa’

]
Paulo Hartung

PATRICK T. FALLON/REUTERS ENCONTRO

No estadao.com.br


FUTEBOL

Árbitros de vídeo da
Uefa treinam em casa

ITÁLIA

Árvores em memória
às vítimas da covid-
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