Exame - Portugal - Edição 439 (2020-11)

(Antfer) #1

  1. EXAME. NOVEMBRO 2020


Macro


N


a conferência de im-
prensa de apresentação
do Orçamento do Esta-
do para 2021, uma jor-
nalista perguntou a João
Leão se, tal como não queria repetir a fór-
mula de austeridade de 2011-2015, tam-
bém não queria regressar à fórmula (ex-
pansionista) dos últimos anos do governo
de José Sócrates. O ministro das Finanças
esboçou um sorriso e, embora não tenha
respondido de forma direta, sublinhou
a necessidade de um equilíbrio entre “a
preocupação grande com a recuperação
da economia e proteção dos rendimentos”
e “a gestão responsável”. Na verdade, este
orçamento não repete Passos nem Sócra-
tes: é mais uma espécie de homenagem a
Mário Centeno.


À imagem do que o agora governa-
dor do Banco de Portugal foi fazendo nos
quatro anos e meio em que foi responsá-
vel pelas contas públicas nacionais, este
OE concede alguns benefícios às famílias
e (em menor medida) às empresas, mas
fá-lo de forma contida, mantendo como
preocupação central o controlo – ou, pelo
menos, não descontrolo – do défice.
Essa conclusão é-nos dada pelos gran-
des números. Após um excedente de 0,1%
em 2019, o Governo deixou o défice inchar
significativamente para -7,3% do PIB em


  1. Foi o preço a pagar pelo layoff sim-
    plificado e outros gastos relacionados com
    o combate à pandemia, assim como uma
    economia que implodiu com o confina-
    mento. No entanto, o plano é começar já
    a inverter essa tendência: para o próximo


ano, a expectativa é que o saldo comece
logo a descer, com uma previsão de -4,3%
inscrita no OE.
Onde começamos a ver a influência
de Centeno é no facto de este resultado
não ser alcançado com cortes na despesa
ou aumentos generalizados de impostos.
O IVA da eletricidade até desce e existem
outros pequenos alívios fiscais (além da
redução das retenções na fonte, mas que
se refletirão em reembolsos mais baixos
em 2022). Do lado da despesa, o Gover-
no contabiliza mais de três mil milhões
em medidas – com destaque para o apoio
ao emprego e uma nova prestação social
negociada com o BE – que empurram os
gastos totais do Estado para valores su-
periores à barreira psicológica dos 100
mil milhões de euros. Contudo, mesmo

CONTAS PÚBLICAS

OE 2021.


Leão veste


a pele de


Centeno


O Orçamento do Estado para
2021 afasta o debate sobre um


regresso à austeridade, mas
não se veste com a roupa


expansionista que BE e PCP
pretendiam. Na realidade,


é um OE à Mário Centeno:
contido nas medidas


de estímulo e deixando
ao crescimento
económico a tarefa


de começar a fazer
descer o défice


Texto Nuno Aguiar

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