National Geographic - Portugal - Edição 215 (2019-02)

(Antfer) #1
FEVEREIRO | EDITORIAL

Luzes e sombras


da tecnologia


POR SUSAN GOLDBERG

A
TECNOLOGIA
EM EXAME

17 DE OUTUBRO DE 1989, 17H04.
Eu era editora no jornal “San Jose Mercury
News”. As placas tectónicas deslocaram-se
sob as montanhas de Santa Cruz, no Norte
da Califórnia, e o solo começou a tremer.
Quando o terramoto finalmente parou,
dezenas de pessoas tinham perdido a vida.
Algumas áreas nas proximidades da baía
de São Francisco demoraram uma década
a recuperar por completo.
Ao mesmo tempo, outras forças agita-
vam Silicon Valley, embora muitos de nós
não nos tivéssemos apercebido disso.
A indústria da informação estava a ser
radicalmente transformada por tecnolo-
gias que ganhavam vida à nossa volta, uma
reviravolta ainda em curso e que produz
enormes implicações.
A jornalista Michelle Quinn acompanha
a revolução de Silicon Valley desde os
primeiros dias até à actualidade. Sabe
melhor do que ninguém que, graças à
tecnologia desenvolvida em Silicon Valley,
as nossas vidas tornaram-se exponencial-
mente mais ricas e fáceis. Em contrapar-
tida, também somos assombrados por
violações de segurança, usos não autori-
zados de dados pessoais e dificuldade em

Devido ao custo elevado
das casas em Silicon
Valley, muitas pessoas
optam agora por viver
em autocaravanas, aqui
alinhadas ao longo de
El Camino Real em Palo
Alto, nas imediações
do campus da Universi-
dade de Stanford.


discernir a verdade no meio da tempes-
tade de informação ao nosso alcance.
Na edição deste mês, Michelle relata
os milhões de euros produzidos pela
venda de startups “que resolviam proble-
mas que eu não sabia que as pessoas
tinham”. Este sucesso é óptimo para os
criadores de uma invenção e frequente-
mente para os utilizadores, mas gera
desigualdades económicas e o afasta-
mento de comunidades que não tinham
condições para viver numa região onde
os preços médios das casas atingem agora
um milhão de dólares. “Poder-se-á argu-
mentar que tudo o que é importante na
era digital terá consequências não inten-
cionais”, comenta a jornalista. “Como
limitamos essas ondas de choque?”
Juntamente com Silicon Valley, anali-
samos a matéria-prima que alimenta a
maior parte dos brinquedos tecnológicos:
o lítio. Enviámos o jornalista Robert Draper
e o fotógrafo Cédric Gerbehaye à Bolívia,
onde o maior salar do mundo cobre um
dos maiores depósitos de lítio do planeta,
com reservas calculadas em cerca de um
quinto do total global. “Aquilo que o ouro
representou em tempos passados e o petró-
leo no século anterior poderá ser eclipsado
pelo lítio nos próximos anos”, escreve Dra-
per. É “um componente essencial para as
baterias dos computadores, telefones por-
táteis e outros dispositivos electrónicos”,
bem como para os carros eléctricos.
A extracção de lítio tem potencial para
retirar a Bolívia do limiar da pobreza, mas
também suscita questões urgentes sobre a
aplicação dos benefícios desse “ouro
branco” e as consequências ambientais da
sua extracção. Também o turismo no salar
será fortemente afectado. À semelhança da
história de Silicon Valley, a história do lítio
da Bolívia é igualmente complicada, for-
çando-nos a compreender a necessidade
de um equilíbrio entre as fontes geradoras
de riqueza e a sociedade beneficiária.

LAURA MORTON
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