20 de novembro, 2019 59
no xilindró João de Deus: ele
disse ter exorcizado “endemoniado”
Federal (STF), garrafas de água mineral
benzida na Casa Dom Inácio de Loyola,
em Abadiânia (GO), onde o médium
atendia antes de ser preso. Ayres Britto
confirmou a VEJA ter recebido a enco-
menda, mas disse não se lembrar se foi
antes ou depois da prisão de João de
Deus. “Ele mandou mesmo uma água
benta, uma coisa assim, ao meu escritó-
rio. Uma pessoa me mandou, não lembro
quem foi. Nem sei se bebi essa água.”
VEJA teve acesso às cópias das pri-
meiras nove denúncias do Ministério
Público de Goiás contra João Deus,
por assédio sexual a 48 vítimas. Aos
investigadores, as mulheres disseram
que, para assediá-las, o médium afir-
mava ter sido marido delas em vidas
passadas. Elas também contaram que
sofriam uma espécie de “congelamen-
to” e não conseguiam reagir às investi-
das. Segundo laudo apresentado pelo
MP, congelamento é um fenômeno psi-
cológico denominado “imobilidade
tônica”, uma reação física de paralisia
extrema apresentada por vítimas de
abuso. Os advogados de João de Deus
admitem que ele tocava as partes ínti-
mas dos pacientes durante o atendi-
mento, mas alegam que os contatos
eram feitos sem “libidinagem”.
Nos esforços para garantir a liberta-
ção do cliente, a defesa afirma até que
João de Deus é impotente desde 2015 e
sofre de sérios problemas de saúde, co-
mo hipertensão arterial, insuficiência
coronária e cardiopatia. Sob a alegação
de que ele poderia morrer na prisão por
falta de tratamento adequado, os advo-
gados pediram sua transferência para
um hospital. O pedido fracassou. Na
quinta-feira 7 houve outro revés: o mé-
dium foi condenado em primeira ins-
tância a quatro anos de prisão por por-
te ilegal de armas. De forma correta,
com base em provas e testemunhas, a
justiça dos homens tem sido implacável
com João de Deus. ƒ
sem feito um jogo de cena como forma
de atraí-lo e depois matá-lo. O local on-
de aconteceu o atendimento espiritual
de emergência é ocupado por presos de
alta periculosidade. Além disso, mes-
mo que não tivesse ocorrido uma em-
boscada, a cura praticada por João de
Deus, se bem contada, poderia ser usa-
da para atenuar a sua imagem e, assim,
ajudar nos esforços para garantir a sua
libertação. Os advogados, então, ques-
tionaram João de Deus sobre o episó-
dio. A resposta teria sido a seguinte:
“Deus me deu autoridade para expul-
sar aquele espírito maligno. Quando
Deus me inspira, eu sinto minha boca
ficar como mel”. Difícil de acreditar.
Uma pessoa próxima alega que ele
continua a prestar serviços espirituais a
figuras importantes dos três poderes,
que, diante das circunstâncias, passa-
ram a optar pelo atendimento às escon-
didas. Ao ressaltar esse ponto, o mé-
dium tenta convencer a opinião pública
de que a espiritualidade do cliente não
era mero pretexto para a série de crimes
sexuais dos quais ele é acusado. Há dois
meses, João de Deus teria enviado ao
ministro aposentado Carlos Ayres Brit-
to, ex- presidente do Supremo Tribunal
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