Sabor Club - Edição 35 (2019-12)

(Antfer) #1

44 | Sabor. club [ ed. 35 ]


DA CENOURA REFOGADA NA LARANJA ELA JAMAIS ESQUECE, entre os
muitos legumes presentes na mesa de nove filhos e pouca grana. Assim como
o bolinho de vagem, e tortinha de batata com carne moída, e o arroz molhado
de tomate que lhe trouxe revelação recente, quando encontrou o prato em
Portugal. Os olhos brilham enquanto Kátia Barbosa recorda as receitas que
servirá no Sofia, o restaurante que vai abrir em homenagem à mãe, de 89 anos.
Uma década depois de colocar a feijoada entre o polegar e o indicador, no
bolinho mais falado do país, a cozinheira autodidata que teve infância pobre
em casa de estuque, no subúrbio carioca de Ramos, chega ao horário nobre da
Rede Globo louvando os ingredientes que lhe ensinaram mexer nas panelas.
A bordo do reality Mestre do Sabor, ela quer passar aos integrantes de seu time
o que a vida lhe ensinou: técnica sem tradição não fica em pé.
“Temos que olhar para a criatividade das donas de casa. O momento da
nossa cozinha é fantástico, mas exige cuidados para não se perder e virar

exibição de produtos. Provei vários peixes com banana no programa e alguns
não disseram nada, enquanto outros foram de comer de olhos fechados.
Receitas você pode copiar, mas o que é alma ninguém tira de ninguém”, reflete.
Horas antes de embarcar para o aniversário do chef português José Avillez,
com Claude Troisgros e o mineiro Leo Paixão, em Portugal (onde a atração
também é exibida), a cozinheira exibiu sem retoques a personalidade autêntica
da Katita que os amigos prezam – e o Brasil passou a conhecer. Em mesa
do Aconchego Carioca, mistura de bar e restaurante que criou na Praça da
Bandeira, Zona Norte do Rio, foi da gargalhada estridente aos olhos molhados
em poucos segundos, com os sentimentos à flor da pele.
“A missão é saber que aqui não existe cabelo ruim ou cabelo bom, carne
de primeira ou de segunda. Existe aquilo que você cuida”, afirma. “Insisto
tanto que o pessoal já disse que vai fazer um meme com a minha cara e a frase:
comida brasileira é comida de panela”.

“Temos que olhar para a criatividade das donas de casa.
O momento da nossa cozinha é fantástico, mas exige
cuidados para não se perder e virar exibição de produtos”

Bunda-de-fora
Boteco, para poucos
e bons, é xodó da
cozinheira

Panela de barro
com feijão fradinho,
linguiça, toucinho,
quiabo, abóbora e
maxixe. Mungunzá
salgado com
mocotó. Moqueca
de ovo. Sem falar no
‘sonho’ de aipim com
bobó de camarão,
e na rabanada de
brioche sobre calda
de tapioca com doce
de leite e flor de sal,
candidata a melhor
sobremesa do Rio.
Esse é o Bar
Kalango, botequim
estilo bunda-de-fora
que Kátia abriu há
dois anos em rua
pequena da Praça
da Bandeira, com
o sócio Emerson
Pedrosa, ex-
subchef de Roberta
Sudbrack. Ele está
na cozinha todos os
dias e o resultado é
primoroso: Claude
Troisgros, sempre
ele, chorou de
emoção durante
um almoço.
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