CRISE NA TUNDRA 91
Por norma, é difícil prever qual o ponto de vi-
ragem que desencadeia a ocorrência destes acon-
tecimentos circulares. “Sabemos que há limiares
que não queremos transpor”, disse Chris Field,
director do Instituto Woods para o Ambiente da
Universidade de Stanford. “Mas não conseguimos
defini-los com precisão.”
No caso do solo permanentemente gelado, há
mesmo muito que não conseguimos ver. Em vez
disso, os cientistas estudam amostras pequenas,
acompanham outras à distância e inferem o res-
to – ao contrário do gelo marinho do Árctico, que
pode ser sempre medido por satélite. “Podemos
aceder à Internet e ver exactamente o que acon-
teceu ao gelo marinho”, disse o especialista Ted
Schuur, da Universidade do Norte do Arizona.
“No caso do solo permanentemente gelado, temos
dificuldade em observá-lo. Temos escassas ferra-
mentas necessárias para medir o que se passa.”
Um tipo de permafrost preocupa particular-
mente os investigadores: os cerca de 20% que con-
têm enormes depósitos de gelo sólido. Parte desse
gelo formou-se quando a água penetrou nos solos
e congelou ao atingir o permafrost. Outra parte
foi criada ao longo de milhares de anos, durante
os invernos árcticos, quando o solo se contraiu e
rachou em padrões poligonais. Na Primavera, a
água do degelo encheu essas fendas, que voltaram
a congelar mais tarde. Ao longo do tempo, o gelo
enterrado cresceu e transformou-se em gigantes-
cas cunhas envoltas em solo permanentemente
gelado. Duvanny Yar está repleto delas.
Uma estrutura destas pode desagregar-se rapi-
damente. Quando o permafrost se desintegra, o
mesmo acontece ao gelo enterrado. À medida que
a água escoa, transporta calor que dissemina o de-
gelo, deixando atrás de si um rasto de túneis e bol-
sas de ar. O solo afunda-se para preencher essas
cavidades, criando depressões à superfície preen-
chidas com água do degelo e da chuva. A água au-
menta a profundidade dos charcos e corrói as suas
margens de gelo: os charcos transformam-se em
lagoas e as lagoas transformam-se em lagos. Isto
leva a que uma área maior de solo aqueça e, con-
sequentemente, que mais gelo derreta.
O “degelo abrupto”, como os cientistas desig-
nam este processo, muda toda a paisagem. De-
sencadeia deslizamentos de terras. Na ilha de
Banks, no Canadá, os cientistas puderam docu-
mentar que as derrocadas de grande escala au-
mentaram 60 vezes entre 1984 e 2013. O degelo
abrupto derruba florestas. Há 15 anos que Merritt
Turetsky, ecologista da Universidade de Guelph,
monitoriza o degelo abrupto numa floresta de
abetos negros nos arredores de Fairbanks. Ela
descobriu que, neste local, as cheias estão a de-
sestabilizar raízes e troncos de árvores. Merritt
suspeita que todas as árvores da sua “floresta
bêbeda” cairão em breve e serão engolidas por
novas zonas pantanosas. “Ainda há pequenas
bolsas de terra, mas temos de atravessar alguns
sítios muito húmidos para lá chegar”, disse.
Todo o degelo do permafrost gera emissões de
gases com efeito de estufa. No entanto, as águas
estagnadas aceleram o processo. O gás borbu-
lhante que provém da lama privada de oxigénio
existente sob lagoas e lagos não é unicamente
composto por dióxido de carbono, mas também
por metano, um gás com efeito de estufa 25 vezes
mais potente do que o CO 2. Há duas décadas que a
ecologista Katey Walter Anthony da Universidade
do Alasca mede o metano emitido pelos lagos do
Árctico. Segundo os seus cálculos mais recentes,
publicados em 2018, os novos lagos criados pelo
degelo abrupto poderão quase triplicar as emis-
sões de gases com efeito de estufa.