Dossiê Superinteressante - Edição 398-A (2019-01)

(Antfer) #1
as característcas físicas dos negros, com
cabelos black power, na África do Sul
o buraco era mais embaixo. O lema ali
signifcava que o negro deveria olhar
para si mesmo como um ser humano.
Parece óbvio, mas não quando o gover-
no lhe tata a pontapés. O fato é que, a
partr dos anos 1970, o regime entou
em declínio irrecuperável, questonado
inclusive pela minoria branca. Em 1973,
outa resolução da ONU considerou o
Apartheid “crime conta a humanidade”
e, em 1974, a África do Sul foi excluída
da Assembleia Geral.
Com a queda mundial do preço do
ouro, um dos seus principais produtos
de exportação, em 1985, veio um novo
tpo de crise: infação e desemprego. Os

bairros negros se tornaram cada vez
mais violentos. Etnias e grupos polítcos
diferentes brigavam inclusive ente os
próprios negros. E agora havia uma no-
vidade constangedora para o governo:
a mídia internacional passou a cobrir a
violência da repressão. Empresários do
país buscaram diálogo com líderes do
CNA no exílio. Afnal, a África do Sul
em colapso não era boa para os negó-
cios. Esse estado de emergência durou
até 1989, quando Frederik Willem de
Klerk assumiu a presidência e acelerou
as medidas antapartheid. Foi o últmo
branco no cargo.

Isolados do mundo
A queda do regime contou com uma
mobilização internacional nunca vista
em relação a outos países africanos. Para
se ter uma ideia do quanto a segregação
repercutu mundo afora, tês atvistas
sul-africanos negros ganharam o No-
bel da Paz: o professor e líder religioso
Albert Lutli (1960), o bispo Desmond
Tut (1984) e Nelson Mandela (1993).
Outas sanções viriam. Nos anos 1980,
os EUA, o Reino Unido e mais 23 países
proibiram que suas empresas fzessem
comércio com fábricas e bancos sul-a-
fricanos. O boicote atngiu a cultra, o
trismo e até o esporte.
No dia em que foi solto, em 1990,
Mandela já era um septagenário, após
27 longos anos de cadeia. O carro que
o levava do presídio para fazer um dis-
curso foi imobilizado, chacoalhado e
golpeado por um mar de pessoas, ébrias
de alegria. “Sent que a multdão estava
prestes a nos matar com seu amor”, di-
ria mais tarde. Não era para menos. A
libertação de Madiba, como os negros
chamavam seu líder, era um sinal ine-
quívoco de que o regime segregacionista
realmente estava com os dias contados.
O fm ofcial veio quato anos depois,
quando Mandela foi eleito presidente
numa eleição multrracial e ordenou
que reescrevessem a Consttição da
África do Sul. Foi quando o preso po-
lítco mais famoso do mundo cumpriu
sua promessa de libertar a maioria ne-
gra da repressão de uma sequência de
governos racistas.

Um homem
remove o grafte
“Mandela livre”
das paredes da
Igreja de King’s
College, em Cam-
bridge, Inglaterra,
1965.

O APARTHEID


RUANDÊS
O ódio entre as etnias
hutus e tutsis, em
Ruanda, vem desde o
século 15, quando os
tutsis – cuja origem
remonta às margens do
Rio Nilo – invadiram a
região em que os hutus
estavam estabelecidos,
no oeste do continente.
Já chegaram submetendo
os hutus à servidão e
estabelecendo uma
sociedade segregada,
na qual os tutsis teriam
“superioridade racial”.
Esse sistema, chamado
de “ubuhake”, durou até
o fm dos anos 1950, e era
uma espécie de Apartheid


  • só que de negros domi-
    nando outros negros. A
    rivalidade entre as etnias
    nunca esfriou e, em 1990,
    a Frente Patriótica Ruan-
    desa, formada por tutsis
    exilados do país, invadiu
    Ruanda. Um acordo de
    paz viria em 1993, assim
    como um governo de
    transição, mediado pela
    ONU, reunindo represen-
    tantes das duas etnias.
    Em abril de 1994, o
    presidente ruandês
    Juvénal Habyarimana, um
    hutu, foi morto em um
    atentado contra o seu
    avião. Era a desculpa que
    os hutus precisavam para
    executar um dos maiores
    genocídios da história.
    Sem nenhuma prova
    de que o ataque tivesse
    partido da etnia rival, um
    extermínio começou logo
    no dia seguinte ao aten-
    tado. Em cerca de três
    meses, mais de 800 mil
    tutsis estavam mortos.


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