Público • Sexta-feira, 1 de Novembro de 2019 • 27
ECONOMIA
Fusão levará a PSA para os EUA
e vai modernizar a Fiat Chrysler
O conglomerado ítalo-americano Fiat
Chrysler Automobiles (FCA) vai jun-
tar-se ao gigante francês PSA (Citroën,
Peugeot, Opel, Vauxhall, DS) numa
fusão que dará origem ao quarto
maior grupo automóvel do mundo e
que será comandado por um gestor
português, Carlos Tavares. O noivado
foi conÆrmado nesta quinta-feira e
dá à FCA acesso a tecnologia e plata-
formas mais modernas.
Para a PSA, esta união abre as por-
tas do mercado norte-americano,
onde o grupo francês prima pela
ausência. E a boda tem a bênção do
Estado francês, que teria sempre
uma palavra a dizer, porque detém
12% do grupo PSA. Depois de ter fei-
to ruir em Junho uma hipotética
fusão da Fiat com a Renault-Nissan,
Paris dá agora luz verde ao casamen-
to FCA-PSA, que só por si aponta para
uma pressão crescente na indústria
— cortar custos.
A condução do novo grupo Æca nas
mãos do presidente executivo (CEO)
da PSA, Carlos Tavares, um gestor
com créditos Ærmados nesse campo.
“Esta união traz um valor signiÆcativo
para todos os accionistas e abre um
futuro risonho para a entidade que
surgirá desta fusão. Estou satisfeito
com o trabalho que já foi feito com o
Mike [Manley, presidente executivo
da Fiat] e Æcarei muito feliz por traba-
lhar com ele para construir uma gran-
de empresa juntos”, diz o executivo
português.
“Ainda há muito trabalho a fazer
antes de haver um acordo formal,
mas já é claro que isto é uma grande
oportunidade para as duas empre-
sas”, comentou, por seu lado, o líder
da FCA, Mike Manley.
Tavares é visto como um homem
capaz de segurar esta aliança. Deu a
volta às operações da Renault, onde
foi número dois do então líder Carlos
Ghosn, e depois de passar pela Nis-
san, no Japão, foi contratado pela
Peugeot/Citroën para recolocar o gru-
po PSA (com fábrica em Mangualde)
no caminho certo. Fez dele o player
com as melhores margens da indús-
tria, com controlo de custos e maiores
Paris e Roma abençoam “casamento” entre a família Peugeot/Citroën, que aspira a entrar
em novos mercados, e a família Fiat/Jeep, que se atrasou em desaÄos como a electriÄcação
CHRISTIAN HARTMANN/REUTERS
O português Carlos Tavares lidera a PSA desde 2014
comentou o ministro francês da Eco-
nomia, Bruno Le Maire.
A possibilidade de haver despedi-
mentos é uma preocupação séria em
França. Na crise 2012-2014 da PSA,
10% dos mais de 100 mil trabalhado-
res iriam ser despedidos, antes de se
desfazer a aliança dos franceses com
a norte-americana GM. Despedir é a
forma mais rápida de poupar. PSA e
FCA esperam obter “sinergias” de
3700 milhões de euros com esta
fusão. Prometem não encerrar fábri-
cas. O ministro Le Maire prometeu
“vigilância apertada”.
Roma, por seu lado, aplaudiu esta
“ousada decisão” de fundir dois gran-
des grupos com raízes europeias. O
ministro da Indústria italiano, Stefano
Patuanelli, garantiu que o negócio “é
bom” e que não põe em causa postos
de trabalho.
Resta saber se a “fava” sobra para
a Opel (cujas fábricas maiores estão
na Alemanha e em Espanha, e as uni-
dades mais pequenas na Sérvia, Poló-
nia e Hungria), ou para a Vauxhall
(que tem duas unidades no Reino
Unido). FCA e PSA somam 400 mil
trabalhadores e comercializam 8,7
milhões de carros por ano, Æcando
atrás da Volkswagen, da Toyota e da
Renault-Nissan.
A fusão é uma troca de acções
50%-50%, mas no mercado bolsista
as reacções foram distintas: enquan-
to as acções da Fiat chegaram a valo-
rizar 11%, as do grupo PSA chegaram
a cair 14%. O que pode ter a ver com
o facto de os franceses estarem, na
prática, a pagar um prémio de 32%
para assumir o controlo, o que para
os investidores signiÆca que os
accionistas do grupo liderado por
Tavares assumem riscos maiores do
que os da FCA.
Os franceses comprometem-se
ainda a dispersar pelos accionistas os
46% que detêm na Faurecia (que
fabrica peças e componentes), que
tem cinco unidades em Portugal:
Vouzela, Nelas, São João da Madeira,
Palmela e Bragança. Já os italianos
pagarão um dividendo especial de
5500 milhões de euros aos accionis-
tas, mais as acções da Comau, que
produz robôs.
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Automóveis
Victor Ferreira
vendas graças a mais modelos, aqui-
sições (Opel e Vauxhall) e uma nova
marca, autonomizando a DS.
Desta união nasce um novo gigan-
te mundial, talvez com novo nome,
com sede Æscal na Holanda e um con-
selho de administração com 11 mem-
bros, presidido pelo chairman da
Fiat, John Elkann.
Para a FCA, este negócio signiÆca
no imediato três coisas. Por um
lado, é a concretização de um objec-
tivo perseguido desde que o negócio
de carros da família Agnelli era geri-
do por Sergio Marchionne, o gestor
de ferro que recuperara a Fiat e a
Chrysler e que morreu aos 66 anos,
em 2018.
Além disso, uma envelhecida FCA,
que se deixou atrasar face à concor-
rência mais relevante em desaÆos
importantes como a electriÆcação,
ganha acesso às plataformas e tecno-
logias mais modernas da PSA.
Uma terceira consequência é que a
Fiat pode ganhar ritmo na redução
das emissões dos carros que fabrica.
Um facto relevante, quando a Europa
está a dois meses de baixar ainda mais
os limites de emissões de CO2 nos
motores novos, com regras que
entram em vigor em 2020 e multas
pesadas para quem não cumprir.
Os franceses, em contrapartida,
podem assim cumprir mais facilmen-
te um dos desígnios da administra-
ção, a reentrada no mercado dos
EUA, onde não estão.
E Paris, que tinha na prática invia-
bilizado a fusão da FCA com a
Renault, passa a ver dois grupos com
controlo francês no top cinco mun-
dial, com as alianças Renault-Nissan
(número dois do mundo) e FCA-PSA
(futuro número quatro). “Este negó-
cio dá-nos massa crítica para enfren-
tar o duplo desaÆo da condução
autónoma e dos carros eléctricos”,
400
FCA e PSA somam 400 mil
trabalhadores e comercializam
8,7 milhões de carros por ano,
ficando atrás da Volkswagen, da
Toyota e da Renault-Nissan