34 • Público • Sexta-feira, 1 de Novembro de 2019
MUNDO
Corbyn e Johnson querem ser
anti-sistema à sua própria maneira
HENRY NICHOLLS/REUTERS
Jeremy Corbyn abriu a campanha para 12 de Dezembro no Sul de Londres
Jeremy Corbyn deu ontem o pontapé
de saída na campanha do Partido Tra-
balhista para as eleições de 12 de
Dezembro, no Reino Unido, determi-
nado em neutralizar o principal slo-
gan eleitoral de Boris Johnson, que
acusa as elites do Parlamento de que-
rerem frustrar a vontade popular de
cumprir o “Brexit”.
O líder do Labour apresentou a sua
própria versão de uma mensagem
reconhecidamente populista, argu-
mentando que as verdadeiras elites
estão no Partido Conservador e pro-
metendo que é contra elas que vai pôr
em marcha a “maior e mais radical
campanha popular da História”, para
“transformar o país” e pô-lo ao servi-
ço de todos, não apenas “dos poucos
que dirigem um sistema corrupto”.
“O primeiro-ministro quer fazer-
vos acreditar que estamos a realizar
esta eleição porque o ‘Brexit’ está a
ser bloqueado pelas elites do sistema.
Mas a população não é enganada tão
facilmente porque sabe que os con-
servadores é que são a elites do siste-
ma”, atirou Corbyn num discurso
ambicioso, no Sul de Londres, denun-
ciando o seu adversário e os que o
rodeiam, por quererem “lutar da for-
ma mais dura e suja de sempre”.
“Vão atirar-nos com tudo o que
têm, porque sabem que não temos
medo. Por isso, vamos atrás dos que
fogem aos impostos, dos senhorios
duvidosos, dos maus patrões e dos
grandes poluidores. Porque nós sabe-
mos de que lado é que estamos”,
aÆançou o líder trabalhista.
Três anos e meio depois do referen-
do e com a saída do Reino Unido da
União Europeia ainda por resolver
— devia ter sido ontem mas foi adiada
até Janeiro de 2020 —, os britânicos
preparam-se para uma eleição atípi-
ca. Apesar de ter falhado a promessa
de cumprir o “Brexit” “ou morrer a
tentá-lo”, Johnson é o favorito.
Uma sondagem da IPSOS Mori para
o Evening Standard, publicada ontem,
põe o Partido Conservador com 17
pontos percentuais de vantagem
sobre o Labour — 41% contra 24% — e
sugere que o principal prejudicado
no divórcio com a UE ou no que con-
sidera ter sido a sua obstrução propo-
sitada pela classe política parlamen-
tar. Há várias semanas que já o faz.
“Se o Parlamento fosse um reality
show, os deputados já teriam sido
todos expulsos. Os eleitores têm mais
coisas interessantes para dizer sobre
o I’m a Celebrity do que sobre esta
Câmara dos Comuns, que se recusa a
cumprir o ‘Brexit’ ou fazer alguma
coisa construtiva”, criticou no con-
gresso do partido, em Setembro.
Ontem, o primeiro-ministro andou
em campanha por escolas e hospitais,
não sem antes divulgar um comuni-
cado a insistir que foi a oposição que
“impediu” propositadamente a apro-
vação do seu “excelente acordo” de
saída da UE no Parlamento, em nome
de “mais hesitações, mais atrasos e
mais incertezas para as famílias e as
empresas” e da “incessante indecisão
de Corbyn” — que, segundo Johnson,
quer organizar “mais dois referendos
tóxicos” e “fatigantes”, ao “Brexit” e
à independência escocesa.
Entre desistências, afastamentos e
reformas antecipadas de diversos
deputados de moderados e remai-
ners, a verdade é que a lista que o
Partido Conservador pretende apre-
sentar às eleições deve ser a mais
brexiteer possível e aquela que o pri-
meiro-ministro acredita que lhe ofe-
rece mais garantias na transmissão da
mensagem “povo versus Parlamento”
por todo o país.
Trabalhista inicia campanha determinado em contrariar estratégia do primeiro-ministro de culpabilizar
as elites de Westminster pelo fracasso do “Brexit”. “Os conservadores é que são as elites do sistema”
Eleições no Reino Unido
António Saraiva Lima
tárias, eliminar os custos das receitas
e cuidados médicos para os idosos,
reduzir os preços das creches, com-
prar e, acima de tudo, garantir que o
NHS (sistema nacional de saúde) “não
é posto à venda”.
Boris outsider
Foi empunhando a bandeira de outsi-
der da política britânica, que Boris
Johnson deu a cara pelo Leave no
referendo de 2016 e que chegou à
liderança do Partido Conservador em
Julho. E é nesse papel de dirigente
político anti-sistema que quer con-
vencer agora os eleitores a oferece-
rem-lhe uma maioria estável para
cumprir o “Brexit”.
Johnson aparenta ter todo o inte-
resse em manter a campanha focada [email protected]
por um novo adiamento do divórcio
com a UE não foi o primeiro-ministro,
mas o líder da oposição: 79% dos
inquiridos consideram que Corbyn
fez um “mau trabalho” na gestão do
dossier do “Brexit” nos últimos
meses, ao passo que Johnson recebe
47% de avaliações positivas ao seu
desempenho sobre o mesmo tema.
Os números pouco simpáticos não
assustam, ainda assim, Corbyn, que
mesmo assegurando que vai resolver
o “Brexit” “em seis meses” se for elei-
to primeiro-ministro, prefere focar-se
nos temas sociais, que lhe são mais
queridos e que lhe valeram, durante
décadas, o rótulo de outsider dentro
do seu próprio partido. No seu discur-
so em Battersea, o trabalhista prome-
teu acabar com as propinas universi-