Folha de São Paulo - 14.11.2019

(C. Jardin) #1

aeee


cotidiano


B4 Quinta-Feira,14DenovembroDe2 019


Nosso olhar amaasimetria,
que identificamoscomaideia
de harmonia, ordemebeleza.
Oassimétrico, quepode até
parecermonstruoso,costu-
ma ser no mínimo meio per-
turbador.Oprópriocorpo


humanoésimétrico,dividi-
do longitudinalmenteemdu-
as metades que se espelham.
Apalavravem,via latim,
do grego“symmetria”,que
associaaideia de “syn”(jun-
to) comademedida. É, por-


tanto, umvocábulo aparen-
tado da sinfonia, da simpa-
tiaedasimbiose,termos em


que se unemrespectivamen-
te sons, sentimentosevidas.
Talvez seja inevitável trans-
por paraoreino das abstra-
ções mentais aquilo quetem
tantaforçano plano materi-
al.Aoagrupar nossas ideias
simetricamente,temosasen-
saçãoconfortável de ordenar
ecompreenderomundo. Isso
ébom,mas só enquantonão
induz erros de percepção.
Agoraque Lula deixouapri-
são,voltaaganharforçano
debatepolíticoaideia de que
olíder petistacompõecomJa-
ir Bolsonaroumtableaudivi-

didoemduas metades espe-
lhadas, umaoexatooposto
da outraeambastendentes
àsextremidades do quadro.
Seráque Lulaforadaca-
deiavaiacirrarapolariza-
ção,favoreceraradicaliza-
ção, quem sabeacabar dan-
doaBolsonaro opretextogol-
pista que eleeseus filhos an-
siosamenteaguardam, dedos
coçando no gatilho?
Arespostaaindanãoes-
táclara, mas umacoisa pa-
rece certa:comLula preso,
demos uma bela desandada
como civilização.Isso não

querdizer queomaior líder
popular do país sejainocen-
te,mas significareconhecer
que jogaramsujocom ele.
Vaza-jatoàparte,sóofato
de Lulatersidocondenado
pelofuturoministrodaJusti-
çade seu maiorrival jáéfeio
obastante. Um despautério
desses não passaria batido
em nenhum país decentedo
mundo.Aquipassou,oque
provaque ainda não somos
um país decente.
Ocorreque,comLula naca-
deia, éramos umpoucome-
nos decentes do que hoje—e

por enquantoacoluna, que
começoupor tratar de estéti-
ca,estáfalando mais de mo-
ralque de política. Na última
semanaoBrasil virouumlu-
garumpoucomenostorpe,
um poucomenosrepulsivo
aos olhos do mundo.
Oque viráagora éoutrahis-
tória.Atese da simetriaécul-
tivada sobretudo porgente
que,não se sentindorepresen-
tada por nenhumdos lados,
gostaria de quebraradinâ-
micadapolarização que mar-
couaúltimaeleição presiden-
cialeque prometemarcara
próxima, se próxima houver.
No entanto, seapolariza-
çãoparecepor orainevitá-
velnum país em quetodas
asvozesintermediárias soam
débeis —isso quando nãofi-
camemsilêncio mesmo—, a
ideiadeequivalência entreas
partesestridentesédeuma
falsidadeóbviaaqualquer
sensibilidadedemocrática.

Que simetriaéessa em que
de um ladotemos um grupo
políticomanifestamentegol-
pistaeaté debochadocomas
regras do jogo, quefala em vi-
rada de mesacomo sefalasse
de um piquenique,edooutro...
Bem, do outroladoestáum
grupo que, emboratenha ma-
culado suas boas obrascom
um showdearrogânciaecor-
rupção,nuncaameaçou as
instituições —nem quando,
montado numa popularidade
de mais de 80 %, Lulateriaum
cacifeetantoparabrigar pe-
la PECdoterceiromandato.
Éverdade que esquerdae
direitarejeitamaideiadesi-
metriaproposta pelocentro,
masofazemcomargumen-
tos, bem, simétricos—ode
queooutrotimeépior.
Detodo modo,parececlaro
que interessa estrategicamente
aambos os lados essa arquite-
turaemque acatedraltemduas
torres espelhadasenada mais.

elanos dáasensação de ordenaromundo,mas pode ser enganadora



  • SérgioRodrigues


escritorejornalista, autor de “o Drible”e“vivaaLíngua brasileira”


Sobreasimetria


|dom.Antonio Prata|seg.TabataAmaral,Thiago Amparo |ter.VeraIaconelli|qua.Ilona Szabó de Carvalho, Jair oMarques |qui.SérgioRodrigues|sex.Tati Bernardi|sáb.Oscar VilhenaVieira, LuísFrancisco Carvalho Filho


sÃoPauLoOs moradoresdo
Copan deram nestasemana
um passoparaconcretizar
orestaurodoprédio pro-
jetado por Oscar Niemey-
er nocentrodeSãoPaulo.
OInstitutoPedra,OSC
(organização da sociedade
civil sem fins lucrativos) es-
pecializadaemprojetosna
área de patrimônio cultu-
ral, foiaempresa escolhida
paradesenvolveroprojeto
derecuperaçãodafachada.
Oprojetodeveser entre-
gueàadministração do Co-
pan em seis meses. Há qua-
se oito anos,aondulantesi-
lhuetadoedifícioencontra-
se cobertapor umatela.
Em dezembro de 2011 ,o
Conpresp,conselho muni-
cipal de preservaçãodopa-
trimônio, autorizouains-
talaçãodetelaebandeja de
proteção nafachada princi-
pal,evitando acidentespe-
lo descolamento de pasti-
lhas.Oórgãoanalisava,des-
de 1992 ,otombamentodo
prédio,que se deu em 2012.
Pelo mesmo motivo, tu-
dooque dizrespeitoaores-
taurodaconstruçãotemde
passar pelo Conpresp —a
escolha do InstitutoPedra
foianunciada emreunião
do órgãonasegunda ( 11 ).
Dirigido pelo arquiteto
LuizFernando de Almei-
da, que por dez anos pre-
sidiuoIphan (Institutodo
Patrimônio HistóricoeAr-
tísticoNacional),oInstitu-
to Pedrafoi escolhido em
seleçãointerna do Copan.
Oprocesso de escolha,ca-
pitaneado por EduardoFer-
roni ePablo Hereñú,arqui-
tetosemoradores doedifí-
cio,levouemcontacurrícu-
lo,experiência, prazo, avis-
toriatécnica, propostade
desenvolvimentoecustos.
Entreostrabalhos desen-
volvidos pelo institutoes-
tãoorestaurodoPalácio da
Aclamação,emSalvador,
eodaVila Itororó, em SP.
Nosseis meses de ela-
boração do projeto, espe-
ra-se queaOSC chegue a
soluções paraatrocadas
pastilhas dasfachadas. En-
quantoaadministração do
Copan pretendia substitu-
ir todoorevestimentopor
pastilhas novas, oConpresp
defendia que as peçasdere-
posiçãofossem idênticasàs
originaiseque fossem subs-
tituídas só asqueapresen-
tassem riscodequeda.
Depois daentregadopro-
jeto, oCopanfará nova con-
corrência paradefinirares-
ponsávelpelaexecução das
obras.Francesca Angiolillo

Após8anos


com telas,


Copan iniciará


processo de


restauro



  • JúliaZaremba


sÃoPauLoUm jovem morreu
eoutroficouferido apósode-
sabamentodamarquise de
um prédio residencial na rua
Bela Cintranaesquinacom
aalameda Tietê, nosJardins,
regiãocentral deSãoPaulo.
Elefoiidentificadocomo
ThiagoNery, 18 .Era alunodo
terceiroano do ensino médio
do ColégioSantaCruz, em Al-
to dePinheiros (zona oeste).
Oacidente atingiutambém
outroaluno da escola, identi-
ficadocomoJoãoTess Portu-
gal. Elefaz 18 anos nestaquar-
ta-feira( 13 )ecomemoravao
aniversáriocomamigos no
prédio,doqualémorador,
quandooacidenteocorreu.
Ainformação inicial dos
bombeirosera de queJoãote-
ve traumatismo notórax. Se-
gundooHospitalSírio-Liba-
nês, paraondefoilevado,ele
sofreu uma fraturanotorno-
zelo esquerdoeescoriações.
Ànoite,passava porexamese
nãocorriariscodevida.
Moradores doedifício Vila
Américarelatamter sentido
um tremornomomentoem
queamarquise desabou.
AgarçoneteGermana Silva,
20 ,que trabalha em frente ao


Estudante morre após desabamento


de marquise de edifício nosJardins


outrojovem,morador do local, ficouferido; prédio nãofoicomprometido,afirma aDefesa Civil


Fachada
do edifício
na rua Bela
Cintra, nos
Jardins, após
aqueda da
marquise,
que
matou um
estudantee
feriu outro
Alfredo Henrique/
Folhapress

prédio,diz tertestemunhado
omomentodaqueda.
Segundo ela, asduas vítimas
estavamconversando na por-
ta doedifício quandoamar-
quisecaiu. “Donada despen-
cou. Nãodeutempo de eles
correrem”, conta. “Eu espera-
vaparacomeçaratrabalhar
ederepenteouvi um estron-
do.Depois, só viamarquise
caídaeque os moços havi-

am sumido.”
Germanarelatouainda que
os bombeiros chegaram em
poucosminutos parapres-
tarsocorro.Seisviaturasfo-
ramencaminhadas ao local.
OcoordenadordaDefesa
Civil MarcosSantana afirma
queamarquise tinha emtor-
no de 15 metros decompri-
mentoe“provavelmentees-
tava comprometida”,oque só

serácomprovado apósavalia-
ção. Já aestrutura doprédio,
disse, nãofoiafetada.
“A guardamosaavaliação de
um engenheiroparasaber o
quefezaestruturacair.Oque
se pode afirmaréque havia
pontos de infiltração”,disse
Santana, que não soube in-
formaropeso da estrutura.
Segundoozelador do pré-
dio, amarquise havia sidore-

formada hácercadedoisanos.
Centenas de alunos, pro-
fessoresepais de estudantes
do ColégioSantaCruz sere-
uniram na instituiçãoànoite
paraapoiar uns aos outros e
fazeruma oração paraThia-
go.Entresilêncios, choroe
abraços,oclima no local era
deconsternação.
“É um momentodeprofun-
da tristeza paratodaacomu-
nidade”, dizodiretor da esco-
la,Fabio Haidar.
Asatividades doensino mé-
dio ficarão suspensas nesta
quinta-feira( 14 ).
ThiNery,como Thiagoera
conhecido pelosamigos, ti-
nha paixão pormangáeRPG.
Aáreadeexatas eraoseu
forte—queria estudar enge-
nharia químicanafaculdade.
Amãe, professoradequímica
da escola,foiuma inspiração.
“Eraumcaraalegre. Nun-
ca,literalmentenunca, esta-
va mal”,diz um amigo.
Elecostumava conversar
comamigos embaixoda mar-
quise quecaiu, segundo Ana
Gimenez, mãe de umrapaz
que estudoucomThiago. “Fi-
copensando que poderiater
sido meu filhotambém. Por
acaso,não estavajunto”,diz.
Colaborou alfredo Henrique, do agora

Alunosefuncionários do Colégio SantaCruz, onde estudavam os dois jovens, reunidos após o
acidentenanoitedestaquarta (13) JúliaZaremba/Folhapress
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