Folha de São Paulo - 14.11.2019

(C. Jardin) #1

aeee


ilustrada


Quinta-Feira,14DenovembroDe2 019 C5

cinema
OIrlandês




eua, 2019. Direção: martin Scorsese.
Com:robertDeniro, al PacinoeJoe
Pesci. 16 anos.estreia nestaquinta
(14)noscinemas.Disponívelna
netflixaparti rde27denovembro



  • Inácio Araujo


Há um momento, em “O Irlan-
dês”,emqueFrankSheeran, o
irlandês em pessoa,diz auma
filha quetudooque feznavida
foicomoobjetivodeproteger
afamília.Afrase parecerouba-
da de “O Poderoso Chefão”,de
1972 ,mas osentidoéoutro: o
de demonstraroquantoavi-
sãodeMartin Scorsese sobre
amáfiaédistante daquelade
FrancisFordCoppola.
Isso,aliás, estavaclarohá
muitotempo.Amáfiadeque
Scorsesese ocupousempre
foiados pequenosgângste-
res, uns pés de chinelo que
setomam por grandecoisa
por pertenceremaumgru-
po,até perceberem que não
passam de bucha decanhão
de mais poderosos.
Éumtantodiferenteoque
ocorreem“OIrlandês”,em
que pela primeiravezScor-
seseoptapor um tratamen-
to realmente épicoparaasa-
gada organização criminosa
nos EUA. Aquiestão envolvi-
dos desdeFrank (RobertDeNi-
ro), que trabalhacomo moto-
rista,até otemívelRuss Bufali-
no (Joe Pesci), chefemafioso.
Amáfia vistapor Scorsese
nãotemnada deromântica.
Nemmesmo possuiacerebra-
lidade dos Corleone. Elaésuja,
baixa, sangrentavisceralmen-
te.Mas não simples.Eanarra-
tivapassa pelas aliançasprovi-
sórias, pelas lealdades movedi-
ças, quese fazemedesfazem
ao sabordos acontecimentos
edas ambições decada um.
Oirlandês nãoéumhomem
de grandes ambições.Trata-
se de uma figurasecundária,
braçoarmado de seus superi-
ores,ouseja, um matador.Es-
se papelfazdele um bomnar-
rador e, juntocomele,cabe
aScorsese alternaropresen-
te eopassado,uma persona-
gemeoutra,um localeoutro.
Essa históriacheia dereali-
zaçõesepercalçosénarrada
de maneira prodigiosamente
clara, dada suacomplexidade.
Bem, Scorsese semprefoi
um narrador exemplar. Desta
vezele seexcede, seja ao deta-
lhar as baixezas quecaracte-
rizam os grandes momentos
dosgângsteres, ao descrever
sem palavras um assassinato
secoevil, ou ao se deter nos
diálogos cheios de não ditos.
Sim, Scorsese é, emtudo
que dizrespeitoàmáfia, um
anti-Coppola. Mastambém
emrelação ao ritmoesses dois
cineastasoptaram porcami-
nhos bem diversos.
OndeoandamentodeCop-
pola ao tratardamáfiaéele-
gíaco, em Scorseseénervo-
so,como se quisessechamar
atenção não paraacerebrali-
dade dos, digamos, Corleone,
mas parasevoltaràvitalidade,
aessaforçaque impulsiona os
seus personagens naaventura
eque os levaacompor uma
de suas obras-primas.
Talvez,aexemplo de outras
vezes, alguém critiqueocine-
astanova-iorquino peloex-
cesso,ouantes, peladuração
longa do filme.Épossível.Mas
tambémpode-se dizeromes-
mo dosromancesdeDostoi-
évski.Enempor isso...


Obra-prima, ‘O


Irlandês’ revela


Scorsese como


um anti-Coppola


visão do cineasta sobreamáfiaem


filme da neftlix se distancia daquela


existenteem‘oPoderoso Chefão’ RobertDeNiroemcena do filme ‘O Irlandês’,emque viveummotoristaque se envolvecomamáfia Divulgação

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