Vingança a Sangue-Frio

(Carla ScalaEjcveS) #1

– Está tudo bem – disse Harry. – Continua.
Beate moveu o copo, e Harry pensou detectar um sorriso ligeiro e triunfante
a esboçar-se na sua pequena boca.


– Ele estava a usar uma balaclava meio enrolada para cima. E um par de
óculos escuros e enormes que lhe tapava uma parte do rosto. Disse que levava
um saco desportivo preto que parecia ser muito pesado.


O café de Harry desceu pelo caminho errado.




Um par de sapatos velhos pendurados pelos atacadores num arame
estendido entre as casas em Dovregata. As luzes no arame faziam o que
podiam para iluminar o passeio empedrado, mas era como se a escura noite de
Outono já tivesse sugado toda a luz da cidade. Isso não incomodou Harry;
encontrou o seu caminho entre a avenida Sophies e a Schrøder’s na mais
profunda das escuridões. Já o fizera muitas vezes antes.


Beate tinha uma lista de nomes de pessoas que tinham marcado aulas de
squash ou aeróbica no Focus à mesma hora em que o homem do fato-macaco
ali estivera, e ia começar a ligar-lhes no dia seguinte. Se não encontrasse o
homem, ainda havia uma boa hipótese de alguém ter estado no vestiário
quando ele trocara de roupa e lhes pudesse fazer uma descrição.


Harry passou por baixo dos sapatos pendurados no arame. Há anos que os
via ali pendurados e há muito que se conformara com o facto de que nunca
iria encontrar uma resposta para o modo como tinham ido ali parar.


Ali estava a lavar os degraus quando Harry chegou à entrada do prédio.
– Deves odiar os Outonos noruegueses – disse Harry, a limpar os pés. –
Apenas fuligem e água lamacenta.


– No Paquistão, na minha terra natal, a visibilidade resumia-se a cinquenta
metros devido à poluição. – Ali sorriu. – Durante todo o ano.


Harry conseguiu ouvir um som distante mas familiar. Era o princípio que
diz que os telefones começam a tocar assim que os ouvimos, mas que nunca
se consegue chegar a eles a tempo. Olhou para o relógio. Dez horas. Rakel
dissera que lhe ligaria às nove.


– Aquela arrecadação na cave... – começou Ali, mas Harry já partira a toda
a velocidade, deixando a pegada de um Doc Martens a cada passada.


O   telefone    parou   de  tocar   quando  abriu   a   porta.
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