Descalçou-se. Cobriu o rosto com as mãos. Foi até ao telefone e levantou o
auscultador. O número do hotel onde ela estava hospedada estava escrito num
Post-it amarelo, colado ao espelho. Pegou nele e reparou no reflexo do
primeiro e-mail enviado por S2MN. Imprimira-o e pregara-o na parede. Um
velho hábito. Na Brigada Criminal decoravam sempre as paredes com
fotografias, cartas e outras pistas que os poderiam levar a fazer uma
associação ou que pudessem despertar o subconsciente para alguma coisa.
Harry não conseguia ler o reflexo no espelho, mas não precisava de o fazer.
Vamos jogar? Vamos imaginar que foste jantar com uma mulher e no dia
seguinte ela aparece morta. O que é que fazes?
S2MN
Mudou de ideias, dirigiu-se à sala de estar, acendeu a televisão e deixou-se
cair na poltrona. Depois levantou-se com um salto, dirigiu-se ao vestíbulo e
marcou o número.
Rakel soava cansada.
– No Schrøders’s – disse Harry. – Acabei de entrar.
– Devo ter ligado umas dez vezes.
– Passa-se alguma coisa?
– Estou assustada, Harry.
– Hm. Muito assustada?
Harry estava encostado à soleira da porta que dava para a sala de estar, o
auscultador apertado entre o ombro e o ouvido enquanto baixava o volume da
televisão com o controlo remoto.
– Não muito – disse ela. – Apenas um pouco.
– Um pouco assustada não te vai magoar. Ficas mais forte se ficares um
pouco assustada.
– Mas, e se ficar muito assustada?
– Sabes que irei aí de imediato. Basta pedires.
– Já disse que não podes vir, Harry.
– Dou-te neste momento o direito de mudares de ideias.
Harry olhou para o homem de turbante e camuflado que surgiu na televisão.
Havia algo de estranhamente familiar no seu rosto, uma semelhança próxima
com alguém.