Descalçou os sapatos com um pontapé, e sorriu quando viu o gravador a
piscar no corredor para o informar de que recebera uma mensagem. Não
precisava de ser vidente para saber que fora Rakel que lhe ligara mais cedo.
Mais ninguém ligava para a casa de Harry Hole.
– Então como é que sabes que me amas? – arrulhou Rakel. O eco
desaparecera.
– Sinto o meu... como é que se chama?... a aquecer.
– Coração?
– Não, é um pouco mais atrás e abaixo do coração. Rins? Fígado? Baço?
Sim, é isso. Consigo sentir o baço a aquecer.
Harry não teve a certeza se eram gargalhadas ou soluços que ouviu do outro
lado da linha. Pressionou o PLAY no gravador.
«Olá, sou eu de novo...»
Harry sentiu o coração saltar e reagiu antes de pensar. Pressionou o STOP.
Mas era como se o eco das palavras proferidas naquela voz feminina
encantadora e ligeiramente rouca continuasse a lançar-se para a frente e para
trás entre as paredes.
– O que é que foi isso? – perguntou Rakel.
Harry respirou fundo. Um pensamento esforçava-se por o atingir antes de
responder, mas chegou demasiado tarde:
– Apenas o rádio. – Pigarreou. – Quando tiveres a certeza, diz-me em que
voo é que vens para te ir buscar ao aeroporto.
– Claro que digo – disse ela, com um tom de surpresa na voz.
Seguiu-se uma interrupção tensa.
– Agora tenho de desligar – disse Rakel. – Falamos hoje às oito?
– Sim. Quero dizer, não. A essa hora vou estar ocupado.
– Oh? Espero que seja algo de agradável para variar.
– Bem – disse Harry a respirar fundo –, vou mesmo sair com uma mulher.
– Quem é a felizarda?
– Beate Lønn. Uma agente nova da Unidade de Assaltos.
– E qual é o acontecimento?
– Uma conversa com o marido de Stine Grette. Foi morta a tiro durante