Olharam-se nos olhos, Harry com uma expressão inquiridora no olhar.
– Como a deusa, sabes.
Uma sombra caiu-lhe sobre um dos lados do rosto. Harry desviou os olhos.
Já vira o suficiente. A curva das costas dela a suplicar um companheiro de
dança, um pé em frente do outro como se indecisa se devia avançar ou recuar,
o peito a erguer-se, e o pescoço esguio com as veias que ele imaginava ver a
latejar. Sentiu-se quente e um pouco fraco. O que é que ela dissera? «Não
devias ter sido tão rápido a libertares-te.» Fora rápido a fazê-lo?
– Harry...
– Tenho de ir – disse ele.
Puxou-lhe o vestido por cima da cabeça, e ela caiu para trás sobre o lençol
branco a rir-se. Anna desapertou-lhe o cinto enquanto a luz turquesa, que
brilhava por entre as palmeiras oscilantes do screensaver do portátil,
bruxuleava sobre os diabos e demónios de boca escancarada que rosnavam na
cabeceira esculpida da cama. Anna dissera-lhe que era a cama da avó e que
estava ali há quase oitenta anos. Ela mordiscou-lhe a orelha e sussurrou-lhe
doces nadas numa língua desconhecida. Depois parou de sussurrar e montou-
o ao mesmo tempo que gritava, ria, implorava e invocava forças externas, e
ele apenas desejou que aquilo pudesse continuar para sempre. Estava prestes a
vir-se quando ela se conteve subitamente, tomou-lhe o rosto entre as mãos e
segredou:
– Meu para sempre?
– Nem pensar. – Ele riu-se e virou-a de modo a poder ficar por cima. Os
demónios de madeira sorriram-lhe.
– Meu para sempre?
– Sim – resmungou ele e veio-se.
Depois de o riso morrer e estarem ali deitados a transpirar, mas ainda
abraçados, Anna contou-lhe que a cama fora oferecida à avó por um nobre
espanhol.
– Depois de um concerto que ela deu em Sevilha em 1911 – disse, a erguer
ligeiramente a cabeça de modo a que Harry lhe pudesse colocar o cigarro
aceso entre os lábios.
A cama chegara a Oslo três meses depois a bordo do SS Elenora . Entre
outras coisas, o acaso fez com que o capitão dinamarquês, Jesper qualquer
coisa, fosse o primeiro amante da avó – embora não o primeiro de todos os