Vingança a Sangue-Frio

(Carla ScalaEjcveS) #1

H


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Rei Branco


arry acenou a um dos clientes habituais e sentou-se a uma mesa sob
os estores estreitos e ondulados da janela sobranceira à avenida Waldemar
Thranes. Na parede atrás dele, pendia um enorme quadro de um dia solarengo
em Youngstorget com mulheres a segurar guarda-sóis e a serem alegremente
cumprimentadas por homens que passeavam de chapéu alto. O contraste com
a luz eternamente outonal e sombria, e o silêncio quase piedoso da tarde no
restaurante Schrøder’s não podia ser maior.


– Obrigado por teres vindo – disse Harry ao homem corpulento, já sentado
à mesa. Era fácil ver que não era um cliente habitual. Não devido ao elegante
casaco de tweed nem devido ao laço de bolas vermelhas, mas porque mexia
uma colher numa caneca branca de chá sobre uma toalha a cheirar a cerveja e
furada por queimaduras pretas de cigarro. O cliente improvável era Ståle
Aune, um psicólogo, um dos melhores do país na sua área e um especialista
ao qual a polícia recorria com frequência. Às vezes com prazer e outras com
arrependimento, já que Aune era um homem verdadeiramente rígido, que
preservava a sua integridade e num tribunal nunca se pronunciava a respeito
de assuntos que não podia provar ao máximo com provas científicas.
Contudo, como existem poucas provas para o que quer que seja na psicologia,
acontecia com frequência que a testemunha de acusação se transformava na
melhor amiga da defesa, e as dúvidas que ele semeava regra geral viravam-se
a favor do acusado. Como agente da polícia, Harry usava há tanto tempo os
conhecimentos de Aune em casos de homicídio que já o considerava como
um colega. Como alcoólico, Harry colocara-se tão completamente nas mãos
daquele homem inteligente, de bom coração e correctamente arrogante que –
se encurralado – lhe teria chamado amigo.


– Então este é que é o teu refúgio? – perguntou Aune.
– Sim – respondeu Harry, a erguer uma sobrancelha a Maja que se
encontrava ao balcão e que em resposta se apressou a atravessar as portas de
acesso à cozinha.


–   E   o   que é   que tens    aí?


  • Japone . Pimentos.

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