Público - 14.10.2019

(Barry) #1
Público • Segunda-feira, 14 de Outubro de 2019 • 3

Como escrevia Adérito Caldeira,
no semanário Verdade , citando Samo-
ra Machel, o primeiro Presidente de
Moçambique, “a vitória prepara-se,
a vitória organiza-se”. E a Frelimo
parece ter levado essa máxima à letra
no processo de recenseamento em
Moçambique.
Com essa vantagem à partida e já
sem a presença do líder histórico da
Renamo, Afonso Dhlakama, falecido
a 3 de Maio de 2018, agora substituído
por Ossufo Momade, como principal
opositor, Nyusi pôde fazer uma cam-
panha mais descansada, sem grandes
compromissos, nem entusiasmos,
cumprindo o périplo pelo país com
comícios garantidamente cheios.
A questão das “dívidas ocultas” e
os problemas económicos do país
foram secundarizados perante um
recandidato que trazia como trunfo
de Ænal de mandato a assinatura do
acordo de paz (pretensamente deÆ#
nitivo) com a Renamo e a visita do
Papa Francisco, chegado ao país em
plena campanha eleitoral.

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ACAMO MAQUINASSE / FRELIMO PRESS BUREAU/EPA

Ficou claro que


os partidos não


prepararam


adequadamente


os seus membros


e simpatizantes para


a campanha


Dércio Alfazema
Responsável da Sala da Paz,
plataforma de organizações
da sociedade civil


Quatro candidatos lutam pela presidência em Moçambique


Filipe Nyusi, Frelimo
Do primeiro mandato de Nyusi
como Presidente da República
resgata-se muito pouco capaz de
se transformar em trunfo
eleitoral, daí o tom morno do
discurso político (ao contrário do
clima violento da campanha).
Com o caso das “dívidas ocultas”
a ensombrar o ambiente, houve
dissidências internas que a
Frelimo acabou por conseguir
calar com sabe-se lá qual
promessa a Samora Machel Jr.,
que de crítico com ambições de
ser candidato a Presidente se
remeteu ao silêncio. Mesmo
assim, Nyusi não se coibiu na
campanha de falar na sua “boa
governação”, garantindo que
este seu mandato serviu para
“consolidar” as bases para o
“próximo ciclo”. As críticas à
corrupção do partido e do
Governo obrigaram Nyusi a
assumir um discurso
anticorrupção: “A ética
governativa e a integridade serão
fundamentais para o
fortalecimento das instituições
do Estado”, disse. Com o
assassínio do observador
eleitoral Anastácio Matavel por
agentes da polícia, irrompeu na
campanha o tema da existência
de esquadrões da morte em
Moçambique que teriam sido
responsáveis por dezenas de
execuções sumárias durante o
mandato de Nyusi. Num reflexo
de uma sociedade violenta, onde
os raptos e as agressões a
cidadãos se tornaram comuns.

Ossufo Momade, Renamo
Na sua estreia em campanhas
eleitorais como líder da
oposição, Ossufo Momade
parece ter tido uma prestação
razoável, nem entusiasmando

por aí além, nem lastimando as
hipóteses do seu partido.
Assinou o acordo de paz com
Filipe Nyusi num timing que
parece ter servido melhor à
propaganda eleitoral da Frelimo
do que à da Renamo, o que lhe
trouxe dissabores internamente,
com os dissidentes militares do
partido que se recusam a aceitar
o acordo a acusarem-no de ser
um joguete nas mãos do
Presidente. “Eu acho que ele não
é político e nem está interessado
em ser. Como bom militar que
deve ser, está ali a cumprir uma
missão e vai ficar aliviado
quando tudo isto terminar”,
explica o sociólogo
moçambicano Elísio Macamo.
Uma opinião que contrasta com
a de Dércio Alfazema, da Sala da
Paz, que classifica como “boa
prestação” a campanha de
Momade. “Havia muitos
questionamentos antes da
campanha porque as suas ideias
não eram conhecidas”, mas
acabou por se mostrar melhor
do que o esperado, defende.
Mesmo assim, não serviu para
acalmar os mais críticos dentro
da Renamo, principalmente
entre os guerrilheiros que se
sentem traídos pelo acordo
assinado. No mês passado, o
coronel João Machava,
guerrilheiro da Renamo em
Inhambane, mostrava-se muito
crítico e pedia a demissão do
sucessor de Dhlakama.

Daviz Simango, MDM
Na quinta-feira, o cabeça de lista
do Movimento Democrático de
Moçambique na província de
Maputo, Augusto Pelembe,
sofreu um atentado a tiro, do
qual saiu ileso. Foi mais um
incidente de violência no

percurso de campanha do
partido de Daviz Simango, o
presidente do município da Beira
que lidera a terceira maior força
política moçambicana desde a
sua criação, em 2009. Simango
condenou o incidente num
comício na Gorongosa, no
centro do país, considerando
tratar-se de um atentado contra
a democracia, levado a cabo por
quem sente que a oposição,
nomeadamente o MDM, está a
ganhar espaço no eleitorado.
“Eles estão a ver que o galo está
a bater em Maputo”, referindo-se
ao símbolo do seu partido. “O
grande problema da violência é
que o partido no poder não está
preparado num processo
democrático, muito menos num
processo de Estado de direito”,
disse Simango em conversa com
a RFI.

O quarto candidato
À primeira vista, as eleições
moçambicanas parecem ter
apenas três candidatos
presidenciais, mas é apenas
ilusão redutora, porque há um
quarto candidato na corrida,
Mário Albino Muquissinse, o líder
do pequeno partido sem assento
parlamentar Acção do
Movimento Unido para a
Salvação Integral (AMUSI), que
tem uma base de apoio
relativamente reduzida. Formado
por dissidentes do MDM, o
AMUSI é um partido de
implantação local, com
influência restrita à província de
Nampula, no Norte do país.
Albino tentou no ano passado
eleger-se para o conselho
municipal da cidade de
Nampula, mas o resultado que
obteve, 4,2%, não lhe permitiu
cumprir essa ambição. A.D.

Uma eleição
que deve
terminar com o
resultado de
sempre, a vitória
da Frelimo e a
reeleição do
chefe de Estado
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