Vizir (com um sorriso tranquilo) — Nada de mau, ó príncipe do Islã,
nada de mau! Os cristãos, por todos os recantos do mundo, festejam, na data
de hoje, o nascimento de Issã, filho de Maria, a quem eles veneram sob o
nome de Jesus Cristo, o Salvador!
Califa (com certo espanto) — Mas Issã, filho de Maria, é citado, com alta
e elogiosa distinção, no Livro Sagrado!^4
Vizir — Sim, ó rei magnânimo, o incomparável Issã, filho de Maria, por
suas incontáveis virtudes e divinos atributos, é citado dezenove vezes no
Alcorão, o Incriado. Uma das cinco preces que nós, muçulmanos,
proferimos todos os dias, é feita em homenagem a Issã, filho de Maria, o
inspirado de Alá!
Califa (arrebatado) — Sei que és sábio, ó vizir! Sei que já leste todos os
livros que ensinam os ritos, os hadiths^5 e as tradições. Conta-me, ó insigne
Yasbek, conta-me um episódio da vida desse admirável Issã, filho de Maria,
cujo nome é consagrado pelas nossas preces e pela nossa profunda
veneração!
Vizir — Escuto-vos e obedeço-vos. Vou narrar-vos um dos muitos
episódios que aureolam a vida exemplar de Issã, filho de Maria.
Califa — Fala. As tuas palavras serão como brincos de ouro para os meus
ouvidos!
Vizir — Achava-se, certa vez, Issã, filho de Maria, em Jerusalém e
ensinava aos homens o caminho da justiça e da bondade. Com suas palavras
cheias de divina sabedoria conquistava a simpatia dos humildes e ameigava o
coração dos mais rebeldes. Mas os pérfidos fariseus e os ricos sacerdotes
decidiram prendê-lo. Como atirar a culpa sobre um justo? Como acusar um
inocente? Queriam um pretexto que legitimasse, aos olhos da multidão, a
captura violenta, a iníqua prisão do Mestre. E esse pretexto surgiu. Os
pérfidos arquitetaram um plano.
Califa (impressionado) — Que Alá castigue os pérfidos judeus!
Vizir — Irrompeu, num pátio em que se achavam as mulheres, violento
tumulto. Uma das infelizes fora surpreendida em adultério. Escribas e
fariseus arrastaram a desventurada pecadora para diante de Jesus. Queriam,
com o consentimento do Mestre, condená-la à morte!