Novas Lendas Orientais

(Carla ScalaEjcveS) #1

e benfeito. Em seu braço esquerdo, moreno e roliço, rebrilhavam três largas
pulseiras de ouro.


À direita da graciosa Najat postou-se, logo, o primeiro marido. Era um
tipo forte, muito moço, de aparência sadia, rosto avermelhado. Trazia sobre a
cabeça, retorcido para a esquerda, um gorro sujo de pele de coelho. Os seus
trajes descuidados davam a impressão desagradável de pessoa grosseira e
desleixada.


O outro, o “segundo marido”, ficou, um pouco enleado, à esquerda da
esposa. Era bem mais velho e bem diferente do primeiro. Teria, talvez,
cinquenta ou 55 anos ( sanat ). Sentia-se a distinção inconfundível de sua
figura, desde o turbante de seda (elegante e discreto) até os sapatos escuros,
de bico fino, que reluziam em seus pés. Fazia-se acompanhar de soberbo cão
vermelho de fina raça (como era belo o animal!). Logo que o dono parou (ao
lado de Najat), o cão deitou-se, com solenidade, a seus pés.


Tudo recaiu em silêncio. Não bolia o mais leve sussurro.
Liatakalam az-zauj al-aual! (Que fale o primeiro marido!) — ordenou
o justo cádi^13 com voz serena.


O jovem do rosto avermelhado, para atender o juiz, passou a mão pelo
queixo, ajeitou a cinta, cuspiu para o lado, relanceou um olhar de ódio ao
rival e assim falou, desenvolto, de semblante iroso:


— Chamo-me Hassã Rida e sou natural de Oran,^14 onde, ainda em
Djelfa, em trabalhos de estrada, conheci Najat, filha de Jamil,^15 o carpinteiro.
Casamo-nos. Fomos muito felizes. Juntamente com seus pais, levei-a, mais
tarde, para Blida;^16 de Blida fomos para Argel. Nessa cidade conheci vários
mercadores gregos. Desejoso de viajar pelo mundo e enriquecer depressa,
coloquei-me a serviço dos aventureiros gregos e parti, em grande veleiro,
para Kubros.^17 Deixei Najat aos cuidados de minha sogra. Não fui feliz nessa
viagem. Ocorreu uma desgraça. O nosso navio, em alto-mar, foi atacado por
piratas turcos e incendiado. Juntamente com vários companheiros fui
aprisionado pelos piratas e vendido, como escravo, em Constantinopla.
Passei três anos sofrendo todos os horrores do cativeiro. Durante a minha
longa e involuntária ausência, a mãe de minha esposa fez constar, entre
amigos e parentes, que eu havia perecido em naufrágio. Preocupada em

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