A alegria de Nurenahar, ao descer em sua terra, era surpreendente,
comunicativa. Observá-la, nos seus volteios febricitantes, nas suas idas e
contra-idas, era um delicioso encanto. Comovia-me aquele interesse
patriótico da “filha do meu tio”,^8 a siamesa do meu coração. Cumprimentava
um, saudava outro, acenava com simpatia para um terceiro e beijava as
raparigas (em geral formosas e sorridentes) que surgiam aos grupos, com as
caras molhadas pela chuva. As jovens siamesas dançavam e cantavam; as
roupas encharcadas punham em relevo, em relevo bem vivo, as formas
esculturais de suas donas.^9 (Louvado seja Alá, que fez a mulher! Louvado
seja Alá, o Criador da beleza!)
Um siamês ricamente trajado, com punhos dourados e alardeando um
chapéu afunilado e alto como um obelisco,^10 aproximou-se de Nurenahar. O
seu rosto redondo, mongólico, era de um moreno carregado. Na ponta do
queixo, o encartelado figurão exibia uma barbinha redonda,
caprichosamente pintada de preto. Protegia-o da chuva um toldo amarelo
que era carregado por quatro servos seminus. Com calculada solenidade, o
recém-chegado parou diante da minha esposa, infletiu respeitoso o joelho
(equilibrando sempre o perigoso chapéu-obelisco) e desandou a falar,
moxinifando, em siamês, coisas para mim incompreensíveis:
— Iak nug okesa okesa trug.
Com tudo aquilo (que ele dizia) a querida Nurenahar parecia concordar,
repetindo, a todo instante, risonha:
— Kopliai! Kopliai!^11
E as frases do siamês dos punhos dourados soavam, a meus ouvidos,
como uma sucessão de enigmas indecifráveis.
— Que pretende esse janota — indaguei bastante intrigado, pois, nesse
tempo, ainda não conhecia o siamês.
Logo que o encartolado se afastou numa solenidade cômica, enterrando
os pés na lama viscosa, Nurenahar traduziu o discurso que ele fizera e, em
poucas palavras, explicou o mistério:
— Este nobre e honrado siamês, Krome Luang (é o seu nome), é um dos
gurus^12 do rei Phra-Sondetch-Mongkut,^13 nosso bom amigo e protetor.
Apresentou-nos, agora, em nome de Sua Majestade, os votos de boas-vindas