— Atenção! Flor-Azul-Celeste vai oferecer o seu presente de noivado ao
príncipe Lapa-Uck!
Fez-se profundo silêncio. Todas as atenções convergiram para a cabeceira
da mesa, isto é, para os jovens cujo noivado, dentro de poucos instantes,
seria anunciado.
Flor-Azul tomou a caixinha (que havia recebido de seu tio) e, num gesto
de simplicidade, entregou-a ao príncipe.
Lapa-Uck, depois de espraiar, orgulhoso, o olhar pelos circunstantes,
rompeu a tampa. Ora, nesse instante saltou de dentro da tal caixinha um
ratinho, que se pôs a correr entre as iguarias que cobriam a mesa.
O empavonado príncipe, que não passava, afinal, de um gato, ao ver o
camundongo sentiu despertar em si, na sua consciência, o ímpeto daquela
paixão que ele havia recalcado.
E os nobres, convidados e servos viram todos, com assombro, o futuro
noivo de Flor-Azul sair, de gatinhas, a correr também ao longo da mesa, em
alucinada perseguição ao camundongo.
E, naquela carreira de louco, derrubava tudo, pisava nas iguarias,
esfrangalhava as jarras, quebrava os castiçais, entornava os copos, virava as
sopeiras.
— Esse príncipe não é príncipe! — gritou um dos presentes. — É um
gato! Vejam como ele corre veloz atrás do rato!
— É gato! É gato! — confirmavam os outros.
E os servos, alarmados com o inominável escândalo, aos socos, pauladas e
pontapés, expulsaram o príncipe do castelo.
Esmagado pelo vexame, com o pensamento obscurecido pela recordação
da cena vergonhosa, Lapa-Uck, o gato recalcado, fugiu para um bosque
vizinho e nunca mais apareceu.
Dizem que, mais tarde, perdeu-se no meio das inextrincáveis selvas
cambojanas e virou gato-do-mato. Bem dizia o mágico: “Este orgulhoso,
egoísta, gato foi, gato é e gato sempre será!”