enfermeiras Emília e Helena e uma única criada: Rosália.
«Estava sempre presente», recorda ela. «Nesse período mais próximo do fim,
só saía da beira do senhor doutor quando lhe faziam as lavagens ao estômago,
pois não aguentava ver aquilo.» As enfermeiras, embora esforçadas, gostavam
de a ter por perto «para ajudá-lo a mudar de roupa, a tirá-lo da cama e a sentá-
lo».
Na manhã fatídica, uma delas despertou, abruptamente, o médico de
«faxina», informando-o de que Salazar não respirava. Catorze minutos depois
das nove, o sacerdote interroga os médicos com um olhar. A governanta não
esboça um gesto de carícia, não solta um ai, mantém-se impenetrável. É o fim.
Salazar já não pertence a este mundo. São 9h15.
Vitimara-o, além da sua própria debilidade, uma embolia de última hora. O
seu rosto falecido mete dó: nota-se na pele, nas rugas, a lenta agonia que só
uma resistência física invulgar permitiu suportar além dos limites do comum
dos mortais.
O clínico de serviço que confirma o óbito tem ordens para abrir um envelope
que repousa há dias na secretária de Salazar. Recebera instruções para, assim
que o doente falecesse, telefonar para o contacto que estava escrito num papel,
sem nome nem endereço. Do outro lado da linha, atendê-lo-á uma voz que o
médico não reconhece nem se deixa reconhecer. Talvez um responsável da
PIDE, presume, sustentando a tese no facto de, pouco tempo depois, uma dupla
de agentes da polícia política irromper pela casa adentro.
Os santos óleos voltam a crismar a fonte do moribundo. Repete-se a extrema-
unção. Ungido pela derradeira vez, em breve Salazar será saudade para os que
o rodeiam, alívio para os que se lhe opõem. Mas não se vislumbraram
«quaisquer sinais de tristeza alterada e, menos ainda, de euforia redentora»,
escreverá Miguel Torga, no seu Diário.
Em Portugal, no mesmo dia, os presos políticos em Caxias entraram em
greve de fome e o padre Mário, de Macieira da Lixa, seria detido pela PIDE.
Quinze minutos antes do falecimento de Salazar, estudantes iniciavam nas
escolas o exame de Português, partindo da análise de um excerto de Frei Luís
de Sousa, de Almeida Garrett: «Meu Deus, meu Deus! (ajoelha) Levai o velho
que já não presta para nada. Levai-o por quem sois!»
A azáfama tomou conta de toda a manhã daquele dia na residência oficial.
Começara a arrumação da casa e a organização dos serviços fúnebres. Maria,