Maeve Haran - A Dama do Retrato PT (2013)

(Carla ScalaEjcveS) #1

  • É pior por ele fazer parte da guarda pessoal do rei. Se ficar, será preso na Torre e vigiado
    pelos próprios homens que comanda.
    Frances embalou Mall nos seus braços.

  • Durante quanto tempo terá de se ausentar?

  • Não sei. Até o rei ser persuadido a perdoá-lo.


A rainha estava mais feliz em Tunbridge Wells do que alguma vez a haviam visto. Dispensava
muitos dos rituais e cerimónias que lhe ditavam a vida em Whitehall e organizava jogos de
cartas e ceias, bem como bailes improvisados no relvado ao lado dos seus aposentos. Isso
simplificava muito a vida às suas damas de companhia. Catherine Boynton gostava de se
divertir com o seu Dick; Lady Suffolk fazia sestas durante a tarde e Cary Frazier sucumbiu aos
encantos de um primo de Lorde Buckhurst, que depois desapareceu, deixando-a de coração
partido mas não, por sorte, de esperanças, ainda que tal fosse um grande receio seu, o que a
levou a bailar uma dança indecorosa quando as regras mensais surgiram.
A razão que levara a rainha a estar feliz foi, no entanto, de curta duração. Ao contrário de
Cary Frazier, estava ansiosa por aumentar a família mas, apesar de tomar regularmente águas
termais, não havia qualquer sinal de isso vir a acontecer.
Frances encontrou-a enquanto passeava de manhã cedo sob a copa dos castanheiros. O ar
começava a arrefecer e as termas, fonte de tanta alegria como de águas restauradoras,
começavam a parecer algo melancólicas. A rainha encontrava-se junto a uma das fontes,
bebericando um copo. Tinha os olhos fechados e Frances percebeu que estava a proferir uma


prece. Percebeu as palavras «Santa Maria»^14 , embora o resto lhe fosse impercetível, já que era
em português.
A rainha Catarina abriu os olhos e, antes que pudesse adotar a delicadeza habitual, Frances
reparou que uma expressão fugaz de dor lhe toldava as feições infantis.



  • Mistress Stuart, bons dias.
    Frances fez uma reverência.

  • Não, aqui não. – A rainha abanou a cabeça. – Não é sítio para tal formalidade. Aqui somos
    todos amigos. – Suspirou. – O rei deseja regressar a Whitehall amanhã.
    Parecia um castigo. Para Tom Howard, que matara um homem, a prisão era a Torre, mas, para
    a rainha de Inglaterra, parecia ser o palácio de Whitehall.

  • Não poderá ficar aqui sozinha, Majestade? – perguntou Frances com brandura.

  • Devo estar com o meu esposo – insistiu ela, recuperando a expressão altiva. – Quando se
    casa com um rei, é necessário aprender a ser paciente. – Fitou-a nos olhos. – Tenho tido muitas
    oportunidades de o aprender.
    Catarina pousou o copo e afastou-se, deixando Frances muito perturbada. Não era sua
    intenção magoar a rainha! Para além daquele lapso nos aposentos de Lady Castlemaine, nada
    fizera para encorajar a obsessão que o rei tinha por ela. Se ao menos pudesse fugir àquele
    mundo... mas para onde poderia ir?
    Os seus pensamentos, como um cão incapaz de parar de morder a própria pata, regressaram

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