Chegava-se ao pavilhão de verão por um caminho cheio de árvores e hera emaranhada.
Frances sentiu um aperto no peito ao ver que a casa estava mergulhada na escuridão, sem haver
sequer uma vela a iluminá-la. O que se passaria com o rei? Estaria convencido de que todos os
atos eram aceitáveis às escuras?
Hesitante, abriu a porta.
- Vossa Majestade? – perguntou, a medo.
- Aqui, Frances – foi a resposta.
As nuvens moveram-se repentinamente e uma mecha de luz aluminou por breves instantes a
sala.
O rei estava numa extremidade, espreitando o céu noturno por um estranho tubo de madeira. - Venha ver – incentivou-a. Ela atravessou a sala, de novo negra como uma masmorra, e
colocou-se ao lado dele, com o sangue a ressoar-lhe nos ouvidos. Ele pôs os braços à volta dos
dela, segurando o tubo com firmeza para que ela pudesse espreitar. - É o telescópio de Galileu. Ele provou que não é a Terra, mas o Sol, o centro do nosso
universo, e com isso ganhou o ódio da Igreja e a ignomínia entre os seus pares. – Suspirou. –
Detesto quando a ignorância e a superstição derrotam o conhecimento e o progresso. O que vê?
Frances começava a recuperar da surpresa. - Estrelas, Majestade.
Ele riu-se. - É verdade. Sabe que estrelas vê?
- O meu pai mostrou-me a Estrela Polar quando eu era criança.
- E contou-lhe que, de todas as estrelas, só a Estrela Polar se mantém fixa no céu noturno?
Que os marinheiros de tempos idos já evitavam naufragar guiando-se pela Estrela Polar?
Tirou-lhe o telescópio das mãos e virou-a para ela. Os seus olhos escuros brilhavam de
desejo, mais escuros ainda do que a noite que os rodeava. - Frances, seja minha. Há quanto tempo a amo e desejo? Seja o meu verdadeiro Norte, o
único ponto fixo do meu universo.
Ele puxou-a para si e ela sentiu a dureza dele contra o seu corpo e arquejou. Contudo, ele
tinha uma esposa. Se ela sucumbisse, tornar-se-ia sua amásia, como as outras – as Castlemaines,
as atrizes, até as mulheres dos antros londrinos que se sabia que ele frequentava. Para além
disso, havia outros braços que ela desejava que a segurassem. - Majestade – disse-lhe, afastando-se –, não posso.
O rosto dele toldou-se, as rugas profundas à volta da boca assemelharam-se de repente a
fissuras, os olhos semicerraram-se de fúria. Ela receou ter-se enganado na avaliação que fizera
da natureza dele e recuou, encolhendo-se. Quando o fez, ele agarrou-lhe o colar para a puxar de
novo para si, mas o fio partiu-se e logo se espalharam pérolas por todo o lado, como um
aguaceiro de granizo brilhante.
Antes que ele tivesse tempo de reagir, Frances ouviu cães a ladrar e, de repente, o duque de
Richmond surgiu à porta, rodeado por uma luz brilhante, como o arcanjo Miguel a brandir uma
espada de fogo.