isso, graças às suas ações generosas e altruístas, ela recuperou e ele não terá outra esposa –
concluiu, fitando Frances com um olhar pleno de significado.
- O conde de Grammont deveria encontrar melhor serventia para o seu engenho – ripostou
Frances –, em vez de troçar de pessoas melhores do que ele.
Não obstante, intrigava-a a estranha complexidade da natureza do rei, que era generosa e
egoísta em partes iguais, e não deixou de se perguntar se também ele estaria a agradecer a Deus.
Barbara Castlemaine, madura e lasciva num vestido que seria mais apropriado nos banhos
públicos do que na casa do Senhor, surgiu de repente no caminho delas. - Então, senhora, ouvi dizer que o jogo chegou ao fim e que a nossa querida rainha recupera.
Frances, de cabeça erguida, manteve-se serena. - Se assim é, sinto-me muito aliviada.
- É mesmo? Apesar de todos a verem como sucessora dela? Não que eu tivesse acreditado
nisso. Afinal, não é a única para quem o rei olha. - Ah – interveio Mall, a folhear as páginas do seu livro de orações –, mas é a única
suficientemente imaculada, com sangue real e... – fez uma pausa e acrescentou, num tom doce
como amêndoas açucaradas: – ... que não dormiu com metade de Londres.
Barbara tentou agredi-la, mas Mall esquivou-se. - Para além disso – acrescentou com malícia –, já que o comité do meu irmão para fazer de
Mistress Stuart amante do rei falhou, ele fundou outro.
Barbara fingiu não estar interessada e começou a afastar-se, mas depois parou.
Mall sorriu, à espera de poder puxar a linha com o seu peixe relutante. - E com que objetivos?
- Uma campanha para que o rei se divorcie da rainha e abra caminho para ter outra esposa.
Por um breve instante, Barbara pareceu escandalizada. - Ele nunca fará isso. Acabou de a salvar da beira da morte.
- Para já, não. Porém, quando se fartar da fidelidade e se lembrar de que continua sem
herdeiro, será capaz.
Do que conhecia do rei, Frances considerava aquele cenário muito improvável. Sentia-se
grata por a vida poder regressar à normalidade. Durante semanas, toda a corte a havia
observado e sussurrado à sua passagem. Agora isso pararia.
Mall acompanhou-a até aos seus aposentos e foi ela quem reparou na missiva. Um
pergaminho dobrado com um selo de lacre vermelho encontrava-se no toucador, ao lado do
papagaio. - Não sei quem terá ensinado poesia ao pássaro – riu-se Frances –, mas é capaz de citar
versos de William Shakespeare.
Mall pegou na missiva e examinou-a. - É o brasão dos duques de Richmond! Eu bem sei, pois é também o meu.
Mantendo a carta fora do alcance de Frances, que se debatia para a impedir, abriu-a e leu em
voz alta: