será um lugar assim tão pouco civilizado? E tão longe... Ainda não tinha pensado nestas coisas.
- E não começarás agora – replicou Mall com brusquidão. – Há muito a recomendar na
Irlanda. Os campos são muito verdes, segundo me dizem, e os Irlandeses adoram caça e
corridas de cavalos... – Calou-se, incapaz de pensar noutros encantos e não reparando, ao
contrário de Frances, como a filha ficara abatida. - Mall – perguntou Frances, depois de Mary ter sido mandada, ainda muito pesarosa, fazer
qualquer recado. – O seu irmão não terá razão? Ela é tão jovem e a Irlanda fica tão longe. Só
tem tido a sua companhia desde que o Esme morreu. - E agora terá um marido. E, em breve, filhos.
- Ficou feliz quando se casou pela primeira vez?
Mall encolheu os ombros. - Enviuvei aos treze anos. Aos dezasseis anos, o rei casou-me com o seu parente James e
tornei-me duquesa. - E agora tem o Tom Howard.
- E se o tenho – ripostou Mall atrevidamente –, não o mereci? Cumpri o meu dever, fui uma
boa esposa e criei os meus filhos. Depois o meu Esme morreu, aos onze anos, o meu querido
filho dourado, o que me partiu o coração. E agora estou a arranjar um marido adequado para a
Mary. E será um marido amável, jovem, elegante, que fará dela uma condessa. Poderia ter um
destino muito pior. E eu julgo que tenho direito à minha felicidade.
Frances assentiu com a cabeça, esperando que mais alguém fosse da mesma opinião –
sobretudo a mãe, que Tom Howard adorava.
A recuperação da rainha Catarina prosseguia a bom ritmo, como Frances deduziu a partir da
forma como a corte a tratava. Quando se pensava que ela poderia vir a ser rainha, muitos tinham
procurado assegurar uma boa posição, tentando ser seus amigos, enviando-lhe luvas
perfumadas, chinelos de cetim com joias embutidas e saquinhos com doces. Ao aperceberem-se
de que isso não aconteceria, recuaram. Alguns lançavam-lhe olhares apiedados e, nas rivais, ela
distinguia expressões vitoriosas.
Contudo, à exceção de Mall, ninguém compreendia o seu alívio, nem o segredo que o
motivava, escondido em Cobham Hall.
Num intervalo de tempo surpreendentemente curto, depois de voltar às termas de Tunbridge
Wells para auxiliar o recobro, a rainha desejou entretenimento e mandou chamar as suas aias.
Ainda estava pálida e esmaecida, como o leite depois de se lhe tirar a nata, mas havia nela
um júbilo febril que Frances nunca antes lhe vira. Corria em vez de andar; brincava com as
luvas, que calçava e descalçava, e ria-se de tudo o que era dito, fosse ou não engraçado. - Pobre senhora – comentou Cary Frazier em voz baixa –, talvez tenha estado tão próxima da
morte que preza ainda mais a vida e deseja aproveitá-la.
Como para confirmar esta declaração, a rainha bateu palmas. - Vamos ao teatro hoje à tarde. Gostaria de assistir uma comédia, para nos animar a todas.
Escolheu a peça Amor numa Barrica, do dramaturgo em voga, sir George Etherege, em cena
em Lincoln’s Inn Fields, para onde foram todas na carruagem real.