Frances não sabia o que a levava a falar, mas deu por si a fazer uma oferta que fez com que
Mall lhe lançasse um olhar ríspido.
- Ela poderia passar algum tempo connosco. Uma posição de dama de companhia seria
esperar demasiado, já que é o que metade do nosso povo deseja, mas há sempre trabalho para
mãos solícitas.
Charles fitou-a como se ela fosse um anjo de bondade. - Poderia, mesmo? Creio que floresceria num ambiente diferente. Longe da mãe.
- Estou certa de que sim.
- Vou tratar de tudo, então.
Segurou-lhe a mão e encostou-a por um instante aos lábios. Frances sentiu um fogo a
percorrê-la como se um fósforo tivesse ateado um rasto de pólvora.
Depois de ele partir, deparou-se com o olhar cínico de Mall fixo nela. - Não olhe para mim assim. Faço-o porque compreendo o desejo que a rapariga tem de
escapar. Em tempos fui uma criança feia, demasiado grande e negligenciada. - Nada tem a ver com o duque, então? Mas estará recordada das condições de que dispomos,
calculo. É-nos dada comida em Whitehall devido aos cargos que ocupamos. - Que importa isso? Cada uma das damas de companhia tem direito a sete pratos por
refeição, a Mary poderá partilhar a minha porção. – Sorriu. – E poderá comer as suas enguias,
já que a Mall as odeia. - E onde dormirá?
- Haverá sempre uma enxerga de pajem ou de criada. Ela não se importará. Tudo o que quer
é fugir de Cobham. - Frances. – Mall pousou delicadamente uma mão no braço da amiga. – Pergunte ao seu
coração porque está a fazer isto. Será realmente por se comover pela situação dela... ainda que
Deus saiba que qualquer pessoa se apiedaria de uma filha daquela virago? Ou é a ligação que
ela tem com Cobham que a leva a fazer tal oferta?
Abriu os braços e Frances aceitou o seu abraço. - Conhece-me demasiado bem.
- Sim, e preocupo-me consigo.
Apesar das reservas de Mall, Mary Lewis, feia e mal-amada, foi viver para o palácio de
Whitehall, para enorme e permanente desagrado da mãe, e ficou profundamente agradecida
pelas trinta milhas que passavam a separá-las.
Acabou por ser uma jovem estimada, conquistando as aias invejosas que primeiro a viam
como uma intrusa, sempre disposta a fazer recados e a transportar coisas, a ver quem poderia
precisar de um xaile, de umas luvas, sempre a sorrir, nunca dando problemas.
O verão magnífico transformou-se por fim num outono longo e dourado. Fora um ano
excecionalmente encantador, com dias compridos à beira-rio, bailes de máscaras nos jardins,
festas com danças e jogos de cartas, cavalgadas com falcões e comédias que entretinham.
Contudo, também havia gemidos e queixumes entre as gentes simples, os liteiros e os