Depois de Mary ter partido, Frances olhou pela janela e observou o Tamisa, que corria
lentamente lá em baixo, tentando imaginar o que poderia fazer. Não reparou que Barbara
atravessara a sala e se postara a seu lado.
- Não se arme em inocente comigo, Mistress Stuart. – Lady Castlemaine inclinou-se para lhe
falar ao ouvido e, ao fazê-lo, os laços do seu vestido de seda abriram-se, revelando as alvas
curvas do seu peito, maiores do que de costume, pois estava de novo de esperanças, embora
todos duvidassem de que, daquela vez, fosse dar à luz um filho do rei. – A senhora, tal como
toda a corte, sabe porque está o duque na Torre e que isso terá tanto a ver com a negligência dos
seus deveres como com o sol nascer por ser de noite. – Agarrou no pulso de Frances e apertou-
o tanto que a magoou. – Mulheres inocentes não dão esperanças a um rei até o deixarem à beira
da loucura, indo em seguida brincar com o coração do marido de outra mulher.
Frances tinha vontade de esbofetear aquele rosto encantador e provocador. Contudo, o que
Barbara dizia era verdade. Ela não fora inocente naquela questão. - Ouvirei um sermão seu, minha senhora, no dia em que se arrepender das suas próprias
indiscrições. – E, com toda a dignidade que conseguiu invocar, abandonou a sala, enquanto as
outras aias sussurravam com as mãos a tapar a boca, tentando concluir quem vencera aquele
confronto.
Ela procuraria Mall. Mall conhecia a mente do rei melhor do que qualquer outra mulher,
incluindo a rainha ou Lady Castlemaine.
Como oficial da Guarda Real, Tom Howard tinha direito a um pequeno boleto perto da
escadaria das traseiras e, para espanto de todos, Mall – filha do grande duque de Buckingham –
instalara-se lá, abandonando os seus vastos aposentos pintados, com teto dourado e painéis de
carvalho, em troca do alojamento espartano de um soldado.
No entanto, assim que lá entrou, Frances percebeu que aquele pequeno espaço fora
ornamentado com algo demasiado valioso para que muitos o pudessem comprar, por mais ricos
ou nobres que fossem: contentamento.
Mall fizera um ramo de jasmim e goivos que apanhara no jardim privado e colocara-o no
parapeito, onde uma abelha ociosa zumbia enquanto mergulhava em cada flor para recolher
pólen. A luz do sol entrava, criando formas com jogos de sombras tão encantadores como
qualquer pintura de um grande mestre.
Mall estava sentada na beira da cama, a pentear o cabelo cor de castanha, trauteando um
madrigal. Sorriu e levantou-se ao ver Frances; transbordava felicidade, como um rebento que se
esticasse para o sol depois de um longo e severo inverno. - Diga-me, porque só conheci o Tom agora, porquê?
Frances sorriu, esquecendo a sua própria ansiedade ao ver a satisfação da amiga. - Porque, se o tivesse conhecido antes, nunca poderia ter casado com ele. Só o fez porque
tem fortuna própria e porque detém um estatuto tão elevado e próximo do rei que ninguém ousa
impedi-la. E isso apesar de ser uma viúva e de já não poder ter filhos. - Obrigada por me recordar disso. E como sabe que já não posso ter filhos?
Os olhos de Frances arregalaram-se.