Frances encarou a mentora com uma expressão irada.
- Como se atreve a pensar tal coisa de mim! Não mereço elogios, nem por uma estratégia
astuta nem pela simplicidade que demonstrei, pois nenhuma dessas situações corresponde à
verdade. Fui tão culpada como o rei por me deixar envolver numa charada tão tola. Ao início,
julguei que seria divertido representar o papel de noiva, enquanto a Barbara seria o noivo;
contudo, quando vi que ela trocava de posição com Sua Majestade, tive de pôr fim àquilo. Não
era minha intenção fazer com que todos se rissem do rei e desejo profundamente que não o
tenham feito. - Fosse essa a sua intenção ou não, será tratada com respeito conquistado. Nunca ouvi falar
de uma dama que tenha repudiado publicamente os avanços do rei. – Mall esboçou um sorriso
matreiro. – A virtude será uma experiência nova para ele. - Pare, Mall. – Frances estava a falar com muita franqueza, esperando que Mall, pelo menos,
a compreendesse. – Não recusei o rei por virtude. Recusei porque a vida de uma amante do rei
não é aquilo que desejo! Sei que há quem desse tudo por isso, mas eu não. – Raras vezes Mall a
ouvira falar com tanta convicção. – Quero ter uma casa minha, um marido, uma lareira, filhos.
E, se me deitar com o rei, qualquer marido que venha a ter será como o pobre do Roger Palmer,
ridicularizado e lamentado. Gosto do rei e aprecio a sua companhia. É amável e justo e, ainda
que muitos lhe apontem defeitos, acredito que tenta verdadeiramente servir o seu povo da
melhor forma possível. – Completamente direita, Frances ostentava uma autoridade que Mall
nunca lhe vira. – Não me servi da minha inocência para o apanhar, como se apanham moscas
com mel. Os factos eram simples. Eu não desejava ser sua amante, mas sua amiga.
Mall inspirou fundo e assobiou. - Percebo que é sincera no que diz. Contudo, não se pode culpar o rei por ter interpretado a
situação de outra forma, visto que entrou no quarto, bebeu o leite com vinho e deixou que
atirassem a meia, pelo que partilhar o leito seria a consequência natural. Porquê, em nome de
Deus, se deixou envolver nessa confusão?
Os ombros de Frances descaíram. - Foi a minha vaidade. Gosto de representar, de dançar e de ser o centro das atenções.
Apercebi-me tarde demais de qual seria o final daquela charada.
Mall abriu os braços. - Frances Stuart, tem muito que aprender.
Apesar de ter uma idade próxima da de sua mãe, Mall sempre fora uma espécie de
conselheira e amiga, conhecedora do mundo mas possuidora de um coração jovem, como uma
irmã muito mais velha poderia ser. - É verdade, tenho. Terá de me guiar. E, contudo, quando o rei se riu, eu julguei que tudo
estava bem. Não me ocorreu que a história fosse ser contada a toda a gente. - Que agora a considera complexa e tortuosa. Ora, bem, nesta corte é pior julgarem-nos
virtuosos do que tortuosos, pelo que talvez não seja assim tão grave. – Mall estreitou o abraço. - Vá, não é uma situação terrível. Amanhã de manhã já tudo estará esquecido. A corte tem
memória curta. Alguma dama há de encornar o marido, ou uma nova atriz atrairá o olhar do rei.