Maeve Haran - A Dama do Retrato PT (2013)

(Carla ScalaEjcveS) #1

ele acabara de dizer foram impedidas pela chegada de Cary Frazier, como sempre a viva
imagem da moda, apesar de ter de atravessar as pedras enlameadas da Strand para a encontrar.



  • Procurei por toda a corte, nos seus aposentos, nos da rainha... sim, até nos jardins e nos
    estábulos – disse ela a ofegar, com o ar frio a dar cor à maquilhagem pálida das suas faces. E
    depois, como se entregasse um prémio: – Sua Majestade requisita a sua presença no gabinete do
    rei.
    Os olhos do duque fitaram os dela, como se pusessem fim ao que haviam acabado de discutir.

    • Está a ver o problema, Mistress Stuart?

    • Venha, Frances, não pode deixar o rei à espera. – Cary deu-lhe o braço. – É uma honra rara.
      Poucos são de facto chamados ao seu gabinete.

    • O rei Carlos não é um tirano. Segundo sei, não exige a presença dos seus súbditos sob
      ameaça de morte ou de confinamento na Torre. Posso recusar, parece-me.
      Cary encarou-a com uma expressão atónita, como se ela tivesse perdido todo o juízo.

    • Ele quer vê-la porque tem uma grande surpresa para lhe mostrar, algo que pensou que lhe
      daria prazer.

    • Mistress Stuart. – O duque fez uma vénia, com a ironia a bailar-lhe nos olhos. – Vá ter com
      o seu monarca. Não seja por minha causa que o priva do prazer que ele promete.
      Virou costas, abruptamente, e ela deixou de o ver depois de ele empurrar a porta da taberna
      Crown and Anchor.

    • Que jovem tão rude! – sussurrou Cary. – E não lhe pareceu que ele já cheirava como se
      tivesse estado numa cervejaria?

    • E o mesmo poderia passar-se consigo, se também tivesse perdido a esposa e a filha – gritou
      Frances por cima do ombro, enquanto regressava rapidamente por entre as carruagens da
      azafamada Strand. – Na nossa gaiola dourada, estamos protegidas dessas coisas, mas acredite
      no que lhe digo, existem. Um ou dois copos de brandy podem ao menos ser uma pequena
      consolação.
      As sobrancelhas de Cary Frazier pareciam capazes de subir e fugir-lhe do rosto como aranhas
      numa teia, tanto estranhou a reação de Frances, que normalmente era calma. Olhou para trás,
      para a porta por onde o duque entrara, perguntando-se se haveria ali algum mistério.
      Uma carruagem aguardava para as levar de volta ao palácio de Whitehall. Longe do
      burburinho da atribulada Strand, surgiam campos vastos a norte e elas passaram pelos espaços
      verdes da Cavalaria Real, que tinha à frente o canal recentemente escavado no parque de St.
      James, no qual havia gado a pastar, de patas na água, bebendo como se se tratasse de uma cena
      rural.

    • Então, Cary, sabe que espécie de surpresa me aguarda no gabinete de Sua Majestade?
      Cary abanou a cabeça.

    • Nunca lá estive. Sei que lhe chamam quarto-gabinete e que é onde guarda as suas curiosas
      coleções e instrumentos científicos. É um espaço estritamente privado, onde muito poucos têm
      permissão para entrar, pelo que se trata de uma grande honra.
      Quando passaram pelas quatro torres octogonais do portão Holbein, Frances fitou os bustos,



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