Maeve Haran - A Dama do Retrato PT (2013)

(Carla ScalaEjcveS) #1

as rosas, as grades e as brasões embutidos nos muros, juntamente com grandes medalhões em
tamanho real de Henrique VII e Henrique VIII, que pareciam observá-la, e sentiu que o seu
nervosismo aumentava.
O famigerado Mister Chiffinch encontrava-se nas escadas das traseiras e deu-lhe a mão para
a auxiliar a sair da carruagem.



  • Sua Majestade espera-a, senhora. Tenha a bondade de me seguir.
    Toda a corte estava a par das atividades de Mister Chiffinch e da sua esposa, sabendo que
    selecionavam mulheres dos mais variados estratos sociais que pudessem satisfazer o rei, ainda
    que só por uma noite. Certa vez, Barbara censurara o gosto que demonstravam pelo óbvio e
    vulgar. «Uma mulher escolhida pelo Chiffinch será uma maria-rapaz ou uma pega. Eles nada
    sabem sobre espírito ou encanto.»
    Ele também era conhecido pela forma prodigiosa como bebia. Corria a voz de que agia como
    espião de Carlos, convidando cortesãos aos seus aposentos e servindo-lhes bebidas fortes – a
    que por vezes se acrescentavam as famosas Gotas do Rei – que lhes soltavam a língua e os
    faziam revelar todos os segredos, não só os próprios mas também os dos vizinhos.
    Chiffinch fez uma vénia profunda, avaliando Frances com os olhos semicerrados, como a
    fosse submeter a um teste secreto criado por ele.
    Ao reparar no escrutínio dele, Frances endireitou-se e fitou-o.

  • É muito alta, senhora – foi tudo o que ele comentou.
    Ela quase confessou que a irmã costumava chamar-lhe «a Gigante de Bermondsey», mas
    conteve-se a tempo. Aquela inépcia confirmaria o falatório daqueles que a consideravam
    ingénua e infantil. Assim, respondeu com ligeireza:

  • E com orgulho. Verifico que torna menos provável que se aproveitem de mim.

  • Deveras? – replicou ele, e ela julgou perceber-lhe um sorriso muito ténue.
    A caminho do quarto-gabinete, subiram as escadas das traseiras e passaram por vários
    corredores até chegarem aos aposentos do rei.
    Frances olhou em redor, observando o chão de mármore e a enorme lareira de mármore
    branco e preto, a bela mobília de carvalho sólido e castanheiro brilhante, decorada com
    desenhos elaborados de frutos e flores; o divã suportado por figuras gregas. E, por todo o lado,
    ouvia o tiquetaque de relógios. Conseguia contar pelo menos sete a dar horas, embora nenhum
    em simultâneo.
    Apesar de tentar concentrar-se nos relógios e noutros objetos interessantes, o seu olhar não
    deixava de ser atraído pela alcova separada por uma pequena vedação, onde estava a grande
    cama do rei, com dois anjos alados que seguravam as cortinas que a isolariam do resto do
    quarto e, por cima, mesmo no topo, duas grandes águias douradas.
    Mister Chiffinch seguiu o olhar dela.

  • Sua Majestade mandou fazê-la, inspirando-se na cama do rei Henrique IV que se encontra
    no palácio do Louvre. – Sorriu. – Embora se diga que a nossa é a mais usada.
    Frances ignorou a insinuação das palavras dele e continuou a observar o painel pintado no
    teto, que representava a Providência a resgatar o rei do famoso carvalho após a batalha de

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