A Garota Inglesa

(Carla ScalaEjcveS) #1

Passat, viu que as malas estavam no lugar, ainda cheias de dinheiro. Sentou
ao volante e observou os outros passageiros indo para seus carros. Na fileira
ao lado, uma mulher estava destrancando a porta de um pequeno Peugeot.
Ela tinha cabelos louros curtos, quase masculinos, e um rosto em forma de
coração. Mas Gabriel reparou em mais uma coisa: ela era a única passageira
da balsa que usava luvas.
Fixou o olhar à frente, com as duas mãos no volante.
Era ela. Gabriel tinha certeza.
Calais era uma feia cidade litorânea, meio inglesa, meio alemã, mas
muito pouco francesa. A Rue Richelieu ficava a 1,5 quilômetro do terminal
de balsas no quartier conhecido como Calais-Nord, uma ilha artificial
octogonal cercada por canais e portos. Gabriel estacionou na frente de uma
série de casas de estuque e seguiu para o parque, observado por um trio de
homens afegãos com casacos largos e chapéus pakol tradicionais. Eles
deviam ser migrantes econômicos atrás de uma carona ilegal até a
Inglaterra. Antigamente, existia um grande acampamento nas dunas de
areia ao longo da praia, de onde era possível ver, num dia claro, as falésias
brancas de Dover reluzindo do outro lado do Canal. Os bons cidadãos de
Calais, um baluarte do Partido Socialista, referiam-se ao acampamento como
“a floresta” e aplaudiram a polícia francesa quando ele finalmente foi
fechado.
A lixeira estava no lado direito de uma trilha que levava para dentro
do parque. Tinha pouco mais de um metro de altura e era verde-floresta. Ao
seu lado, havia uma placa pedindo para que os visitantes não estragassem a
grama e as flores. Não falava nada sobre procurar um celular escondido
embaixo da lixeira — o que Gabriel fez depois de jogar fora a passagem de
balsa. Ele o encontrou num instante, preso com fita adesiva. Gabriel o
retirou dali e colocou-o no bolso do casaco antes de se endireitar e voltar
para o Passat. Quando ele deu a partida, o telefone já estava tocando.
— Muito bem — disse a voz gerada por computador. — Agora ouça
com atenção.
A voz mandou Gabriel seguir direto para o Hotel de la Mer, em
Grand-Fort-Philippe. Uma reserva tinha sido feita no nome de Annette
Ricard. Ele deveria dar entrada no quarto usando o próprio cartão de
crédito e explicar que mademoiselle Ricard iria se encontrar com ele mais
tarde, naquela noite. Buscou a rota até a cidade pelo celular pessoal. Grand-
Fort-Philippe ficava bem a oeste de Dunkirk, cenário de uma das maiores

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