entediantes advertências de Wheaton ecoavam na mente de Michael como
anúncios de embarque num aeroporto.
A Michael, o homem a seu lado parecia o irmão mais velho e mais próspero
de Awad. Estava vestido para fazer negócios, com um dispendioso sobretudo
cinzento e um terno de bom gosto, com duas fileiras de botões, visível por baixo.
As feições tinham sido alteradas por cirurgia plástica. Como resultado, a aparência
árabe fora apagada e tinha sido criado algo de origem nacional incerta: um
espanhol, um francês ou talvez um grego. O nariz palestino proeminente
desaparecera, tendo sido substituído pelo nariz estreito e aquilino de um
aristocrata do norte de Itália. As maçãs do rosto tinham sido realçadas, a testa
suavizada, o queixo tornado quadrado e os olhos castanhos eram agora de um
verde-claro, graças a lentes de contato. Tinham-lhe sido arrancados os dentes
molares, a fim de lhe dar as faces felinas de um supermodelo.
A vida de Muhammad Awad assemelhava-se a um panfleto da literatura
revolucionária palestina radical. Michael conhecia-a bem, pois compilara a
biografia e o currículo de Awad para o Centro, com a ajuda da Mossad, do Shin Bet,
do MI6 e de metade dos serviços de segurança da Europa. O avô fora arrancado aos
seus olivais e laranjais nos arredores de Jerusalém em 1948 e enviado para o exílio
na Jordânia. Segundo a lenda de Awad, no ano seguinte morreu de desgosto,
conservando ainda o neto as chaves da sua casa em Israel no bolso. Outro ramo do
clã Awad foi massacrado em Deir Yassin. Em 1967, a família foi expulsa novamente,
desta vez para campos de refugiados no Líbano. O pai de Awad nunca trabalhou,
limitava-se a ficar sentado nos campos, a contar histórias sobre como tinha sido a
sua vida em pequeno, cuidando das azeitonas e das laranjas com o pai. O paraíso
perdido. Nos anos 80, o jovem Muhammad Awad foi doutrinado no Islão radical do
sul do Líbano e em Beirute. Juntou-se ao Hezbollah. Juntou-se ao Hamas. Recebeu
treino no Irã e na Síria: armas leves, tácticas de infiltração, contra-espionagem,
fabrico de bombas. Quando Arafat apertou a mão de Rabin na Casa Branca, Awad
sentiu-se ultrajado. Quando as forças de segurança de Arafat começaram a
perseguir o Hamas, a mando de Israel, Awad jurou vingança. Juntamente com
cinquenta dos melhores guerrilheiros do Hamas, formou a Espada de Gaza, o
grupo terrorista palestino mais mortífero desde o Setembro Negro.
Rajadas de vento assolavam o convés. Awad levou a mão ao interior do
casaco. Michael hesitou, mas resistiu à tentação de pegar na Browning.
─ Calma, senhor Browning ─ disse Awad. ─ Só me apeteceu fumar. Além
disso, se quisesse matá-lo, o senhor já estaria morto.
O inglês era perfeito, com um leve sotaque irreconhecível por um ouvido
destreinado. Os cigarros que foi buscar ao bolso do peito eram Dunhill sem filtro.
carla scalaejcves
(Carla ScalaEjcveS)
#1