N
NAHALAL, ISRAEL
a manhã seguinte, a equipe do Centro Médico Hadassah foi informada por e-mail de
que a dra. Natalie Mizrahi tiraria uma licença prolongada. O anúncio tinha trinta palavras
e era uma obra-prima da burocracia. Não dava razão para o período sabático nem
mencionava data de retorno. Assim, a equipe não teve outra opção senão especular sobre
os motivos da partida repentina de Natalie, tarefa à qual todos se dedicaram livremente,
pois lhes dava algo para falar que não os esfaqueamentos. Houve boatos de uma doença
grave, de um colapso emocional, de uma volta saudosa à França. Afinal, disse um sábio
da cardiologia, por que diabos alguém com um passaporte francês escolheria viver em
Israel numa época como esta? Ayelet Malkin, que se considerava a amiga mais próxima
de Natalie no hospital, achava todas essas teorias inadequadas. Ela sabia que Natalie
estava sã de corpo e mente, e a ouvira falar várias vezes do alívio de estar em Israel, onde
podia viver como judia sem medo de ataques ou censuras. Além disso, fizera um plantão
de vinte e quatro horas com Natalie naquela mesma semana, e as duas jantaram juntas,
fofocando, sem que Natalie mencionasse qualquer licença pendente. Achava que a coisa
toda cheirava a confusão com o governo. Como muitos israelenses, Ayelet tinha um
parente, um tio, envolvido em trabalho secreto oficial. Ele ia e vinha sem aviso e nunca
falava de seu emprego nem de suas viagens. Ayelet concluiu que Natalie, fluente em três
línguas, tinha sido recrutada como espiã. Ou, talvez, pensou, ela sempre tivesse sido
uma.
Embora Ayelet estivesse próxima de algo que lembrava a verdade, não estava
tecnicamente correta, como Natalie descobriria em seu primeiro dia inteiro em Nahalal.
Ela não seria espiã. Espiões, disseram, são fontes humanas recrutadas para espionar
contra seu próprio serviço de inteligência, governo, organização terrorista, corpo
internacional ou empresa comercial. Às vezes, espionavam em troca de dinheiro; às
vezes, em troca de sexo ou respeito; e, às vezes, espionavam porque eram coagidos
devido a alguma mancha em sua vida pessoal. No caso de Natalie, não houve coação,
apenas persuasão. Ela era, daquele momento em diante, uma funcionária especial do
Escritório. Como tal, seria regida pelas mesmas regras e limitações que se aplicavam a
todos os que trabalhavam diretamente para o serviço. Não podia divulgar segredos para
governos estrangeiros. Não podia escrever um livro de memórias sobre seu próprio
trabalho sem que fosse aprovado. Não podia discutir esse trabalho com ninguém de fora
do Escritório, incluindo familiares. Seu contrato começaria imediatamente e terminaria