A Viúva Negra

(Carla ScalaEjcveS) #1

de entrar no quartinho apertado no terceiro andar do hotel, ele contemplou a chaleira
elétrica como se nunca tivesse posto os olhos em tal apetrecho. Gabriel a encheu de água
na torneira do banheiro e se juntou a Fareed na janela. Diretamente em frente ao hotel,
no térreo de um prédio de escritórios de sete andares, ficava a XTC Impressão e Cópias.
— A que horas ele chegou? — perguntou o jordaniano.
— Pontualmente às dez.
— Um funcionário-modelo.
— É o que parece.
Os olhos escuros do jordaniano varreram a rua como um falcão procurando uma
presa.
— Nem se dê ao trabalho, Fareed. Você não vai achá-los.
— Posso tentar?
— Fique à vontade.
— A van azul, os dois homens no carro estacionado no fim do quarteirão, a garota
sentada sozinha à janela do café.
— Errado, errado e errado.
— Quem são os dois homens no carro?
— Estão esperando o amigo deles sair da farmácia.
— Ou talvez sejam do serviço de segurança belga.
— Nossa última preocupação é a Sûreté. Infelizmente — completou Gabriel,
sombriamente —, a dos terroristas que moram em Molenbeek também.
— Nem me diga — murmurou Fareed. — Eles produzem mais terroristas aqui na
Bélgica do que nós.
— E olha que isso não é pouca coisa.
— Sabe — disse Fareed —, não teríamos esse problema se não fosse por vocês,
israelenses. Vocês subverteram a ordem natural das coisas no Oriente Médio, e agora
todos estamos pagando por isso.
Gabriel olhou para a rua:
— Talvez não tenha sido uma boa ideia, afinal — disse, tranquilamente.
— Você e eu trabalharmos juntos?
Gabriel assentiu.
— Você precisa de amigos onde conseguir encontrá-los, habibi. Você tem é muita
sorte.
A água ferveu e a chaleira desligou com um estalo.
— Será que você se incomodaria? — pediu o jordaniano. — Infelizmente, sou
terrível na cozinha.
— Claro, Fareed. Eu não tenho nada melhor para fazer mesmo.
— Com açúcar, por favor. Muito açúcar.
Gabriel despejou água em uma caneca, jogou um saquinho de chá velho dentro e
adicionou três pacotes de açúcar. O jordaniano assoprou furtivamente antes de levar a
caneca aos lábios.

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