A Viúva Negra

(Carla ScalaEjcveS) #1

— Como está?
— Um manjar dos deuses — Fareed começou a acender um cigarro, mas parou
quando Gabriel apontou para uma placa de “proibido fumar”. — Não dava para ter
reservado um quarto de fumantes?
— Estavam esgotados.
Fareed guardou o cigarro de volta em seu estojo de ouro e o estojo no bolso do
blazer.
— Talvez você tenha razão — disse, franzindo o cenho. — Talvez não tenha sido
uma boa ideia, afinal.


Eles o viram às onze horas da manhã saindo da loja para comprar quatro cafés para a
viagem e dar aos seus colegas, e de novo à uma da tarde, quando ele fez uma pausa para
o almoço em um café na esquina. Finalmente, às seis, o viram sair da loja pela última vez,
seguido pela alma de aparência mais dócil de toda a Bruxelas e por um casal — um
homem alto vestindo tweed e uma mulher de quadris largos — que não conseguia tirar
as mãos um do outro. Ele ainda não sabia, mas sua vida como ele conhecia estava prestes
a acabar. Logo, pensou Gabriel, ele só existiria no ciberespaço. Seria uma pessoa virtual,
uns e zeros, poeira digital. Mas só se conseguissem pegá-lo de forma limpa; sem o
conhecimento de seus companheiros da polícia belga, sem deixar rastros. Não seria uma
tarefa fácil em uma cidade como Bruxelas, uma cidade de ruas irregulares e população
densa. Mas, como dissera o grande Ari Shamron certa vez, nada que vale a pena fazer é
fácil.
Seis pontes atravessam o largo canal industrial que faz separação entre o centro de
Bruxelas e Molenbeek. Cruzar qualquer uma delas é sair do Ocidente e entrar no mundo
islâmico. Como sempre, Nabil Awad atravessou por uma ponte para pedestres grafitada
sobre a qual poucos belgas nativos ousavam pôr os pés. No lado de Molenbeek,
estacionada ao lado de um cais feio, estava uma van surrada, outrora branca, com uma
porta lateral deslizante. Nabil Awad pareceu não notá-la; ele só tinha olhos para o
homem magro, não árabe, andando à beira do canal de águas cor de sopa de ervilhas.
Era raro ver um rosto ocidental em Molenbeek à noite, e ainda mais raro que o dono
desse rosto não tivesse um ou dois amigos como proteção.
Nabil Awad, sempre vigilante, parou ao lado da van para deixar o homem passar, e
esse foi o erro. Pois, naquele instante, a porta lateral bem lubrificada deslizou para abrir
e dois pares de mãos treinadas o puxaram para dentro. O homem com o rosto não árabe
entrou no banco do passageiro da frente; a van se afastou lentamente do meio-fio.
Enquanto atravessava a vila muçulmana conhecida como Molenbeek, passando por
homens de sandália e mulheres de véu, por mercados halal e barracas de pizza turca, o

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