A Viúva Negra

(Carla ScalaEjcveS) #1

N


PARIS

atalie o notou conscientemente pela primeira vez no sábado, às duas e meia da tarde,
enquanto cruzava os Jardins de Luxemburgo. Naquele instante, percebeu que o vira
várias vezes antes, incluindo na tarde anterior, no café em frente a seu apartamento em
Aubervilliers. Protegido por um guarda-sol Pernod, ele bicava uma taça de vinho
branco, fingia concentração num livro em brochura e a observava sem reservas. Ela
tinha tomado as atenções dele por desejo e ido embora do café antes do esperado. Em
retrospecto, suspeitava que suas ações tivessem deixado uma impressão positiva.
Mas foi só naquele perfeito sábado ensolarado que Natalie teve certeza de estar sendo
seguida pelo homem. Ela pretendera tirar o dia todo de folga do trabalho, mas uma
epidemia de faringite nas cités a obrigara a passar a manhã na clínica. Saíra ao meio-dia e
tomara o RER até o centro da cidade. E, enquanto fingia olhar as vitrines da rue Vavin,
vira-o do outro lado da rua, fingindo fazer o mesmo. Alguns minutos depois, nas trilhas
de pedestres dos Jardins de Luxemburgo, empregou outra das técnicas que aprendera na
fazenda em Nahalal — uma parada brusca, uma virada, uma reconstituição de seus
passos. E lá estava ele de novo. Ela passou por ele desviando os olhos. Mesmo assim,
sentia o peso do olhar dele em seu rosto. Alguns passos atrás, vestido como um poeta
revolucionário de meia-idade, estava o observador de rosto indistinto do Escritório e,
atrás dele, dois vigias franceses. Natalie rapidamente voltou para a rue Vavin e entrou em
uma loja que tinha visitado alguns minutos antes. Imediatamente, o telefone dela tocou.
— Esqueceu que vamos tomar um café hoje?
Natalie reconheceu a voz.
— Claro que não — respondeu rapidamente. — Só estou uns minutos atrasada.
Onde você está?
— No Café de Flore. Fica na...
— Eu sei onde fica — interrompeu com um ímpeto de superioridade francesa. — Já
estou indo.
A ligação foi cortada. Natalie jogou o telefone na bolsa e saiu para a rua. Seu
perseguidor não estava lá, mas, na calçada oposta, permanecia um dos homens franceses.
Ele a seguiu pela região dos jardins até o boulevard Saint-German, onde Dina Sarid
acenava para ela de uma mesa na calçada de um dos cafés mais famosos de Paris. Usava
um véu de cor clara e um par de óculos escuros largos de estrela de cinema.

— Mesmo toda “produzida” — disse Natalie em voz baixa enquanto beijava a
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