A Viúva Negra

(Carla ScalaEjcveS) #1

— Diz aqui que sua família era de um lugar chamado Sumayriyya.
— A família do meu pai — disse ela.
— Onde fica?
— Ficava na Galileia Ocidental. Não está mais lá.
— Conte para mim sobre isso — falou —, me conte tudo.
Por trás do véu, Natalie fechou os olhos. Viu-se caminhando por um campo de
espinheiros e pedras reviradas ao lado de um homem de altura mediana de cujo rosto ela
já não conseguia se lembrar. Ele agora falava com ela, como se do fundo de um poço, e
suas palavras se tornaram as dela. Cultivavam-se bananas e melões em Sumayriyya, os
melões mais doces de toda a Palestina. Irrigavam os campos com a água de um antigo
aqueduto e enterravam seus mortos em um cemitério não longe da mesquita.
Sumayriyya era o paraíso na terra, Sumayriyya era um Éden. E aí, em uma noite de
maio de 1948, os judeus subiram a estrada da costa em um comboio com suas lanternas
acesas, e Sumayriyya deixou de existir.


No Centro de Operações do boulevard Rei Saul há uma cadeira reservada para o chefe.
Ninguém mais pode sentar-se nela. Ninguém mais ousa nem tocá-la. Durante todo
aquele longo dia, ela rangeu e cedeu sob o peso de Uzi Navot. Gabriel permaneceu o
tempo todo ao lado dele, às vezes em uma cadeira de vice, às vezes de pé, agitado, com
uma mão no queixo e a cabeça inclinada levemente para o lado.
Os dois, como todos no Centro Operacional, só tinham olhos para o display de vídeo
principal, no qual havia uma imagem de satélite de uma casa grande em uma vila perto
da fronteira síria. No pátio da casa, vários homens descansavam sob a sombra de
tamareiras. Havia duas SUVs no pátio. Uma tinha transportado uma mulher do centro
de Raqqa; a outra, quatro homens do Triângulo Sunita do Iraque. Gabriel enviara as
coordenadas da casa para Adrian Carter, na sede da CIA, e Carter despachara um drone
de uma base secreta na Turquia. De tempos em tempos, a aeronave passava pela imagem
do Ofek 10, circulando preguiçosamente quatro metros acima do alvo, pilotado por um
garoto em um trailer em outro deserto do outro lado do mundo.
Adrian Carter mandara também recursos adicionais para proteger o alvo.
Especificamente, instruíra a NSA a reunir o máximo possível de dados dos celulares da
casa. A Agência identificara nada menos que 12 telefones presentes, um deles ligado
anteriormente a um comandante sênior do ISIS chamado Abu Ahmed al-Tikriti, ex-
coronel do serviço de inteligência militar iraquiano. Gabriel suspeitava ser Tikriti quem
estava interrogando sua agente. Sentia-se enjoado, mas se reconfortava no fato de tê-la
preparado bem. Ainda assim, teria tomado o lugar dela com o maior prazer. Talvez,

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