A Viúva Negra

(Carla ScalaEjcveS) #1

esguio em forma de losango. Mikhail bateu suavemente e, sem ouvir resposta, entrou.
Enfiado em uma cadeira de executivo feita de couro, atrás de uma mesa de vidro
escurecido, estava Uzi Navot, futuro ex-chefe do Escritório. Ele estava olhando com ar
de preocupação para um arquivo aberto, como se fosse uma conta que ele não tinha
dinheiro para pagar. Ao lado de seu cotovelo estava uma caixa aberta de biscoitos
amanteigados vienenses, sua fraqueza nada secreta. Só tinha dois biscoitos sobrando —
um mau sinal.
Finalmente, Navot levantou os olhos e, com um movimento de mão indiferente,
instruiu Mikhail a se sentar. O chefe vestia uma camisa listrada feita para um homem
mais magro e um par de óculos sem aro do tipo apreciado por intelectuais alemães e
banqueiros suíços. Seu cabelo, outrora loiro-avermelhado, era grisalho e ralo; seus
olhos azuis estavam avermelhados. Ele arregaçou as mangas, expondo os enormes
antebraços, e contemplou Mikhail por um longo momento com uma hostilidade mal
disfarçada. Não era bem a recepção que Mikhail esperava, mas, bem, naqueles dias nunca
se podia saber o que esperar ao encontrar Uzi Navot. Havia boatos de que o sucessor
dele pretendia que ele continuasse em alguma função — uma blasfêmia em um serviço
que via a rotatividade no topo quase como uma doutrina religiosa —, mas, oficialmente,
seu futuro era incerto.
— Algum problema na saída de Beirute? — perguntou Navot, enfim, como se a
questão lhe tivesse ocorrido de repente.
— Nenhum — respondeu Mikhail.
Navot pegou uma migalha de biscoito perdida com a ponta de um gordo dedo
indicador.
— Vigilância?
— Nada que pudéssemos ver.
— E o homem que entrou no elevador com você? Chegou a vê-lo de novo?
— No bar do terraço.
— Algo suspeito?
— Todo mundo em Beirute parece suspeito. Beirute é isso.
Navot jogou a migalha no prato. Depois, tirou uma fotografia do arquivo e a
deslizou pela mesa na direção de Mikhail. Nela, havia um homem sentado no banco da
frente de um carro de luxo, à margem de um boulevard à beira-mar. As janelas do carro
estavam estilhaçadas. O homem era uma massa sangrenta e esfarrapada e estava
obviamente morto.
— Reconhece? — perguntou Navot.
Mikhail apertou os olhos, concentrando-se.
— Olhe bem para o carro.
Mikhail olhou. E então entendeu. O homem morto era Sami Haddad.
— Quando o pegaram?
— Não muito depois que ele deixou você no aeroporto. E estavam só começando.


Navot jogou outra foto na mesa, um prédio em ruínas numa rua elegante no centro
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