A Viúva Negra

(Carla ScalaEjcveS) #1

Chiara diminuiu as luzes e eles se sentaram a uma pequena mesa à luz de velas na
cozinha.
— Velas? Por quê?
— É uma ocasião especial.
— Minha última restauração.
— Por um tempo, suponho. Mas você sempre pode restaurar pinturas depois que se
aposentar como chefe.
— Vou ser velho demais para segurar um pincel.
Gabriel espetou o garfo na vitela, e a carne se descolou do grande osso. Preparou
com cuidado a garfada — quantidades iguais de carne e risoto molhados no rico suco da
medula — e a colocou reverentemente na boca.
— Como está?
— Digo para você depois que recuperar a consciência.
A luz das velas estava dançando nos olhos de Chiara. Eles eram cor de caramelo,
pontilhados de mel, uma combinação que Gabriel nunca conseguira reproduzir em tela.
Ele preparou outra garfada de risoto e vitela, mas se distraiu com uma imagem na
televisão. Revoltas haviam irrompido em muitas banlieues de Paris depois da prisão de
vários homens acusados de terrorismo; nenhum tinha ligação direta com o ataque ao
Centro Weinberg.
— O ISIS deve estar adorando isso — disse Gabriel.
— As revoltas?
— Não me parecem revoltas. Parecem...
— O quê, meu bem?
— Uma intifada.
Chiara desligou a televisão e aumentou o volume da babá eletrônica. Projetado pelo
departamento de tecnologia do Escritório, o aparelho tinha um sinal altamente
criptografado para que os inimigos de Israel não pudessem espreitar a vida doméstica de
seu principal espião. No momento, emitia apenas uma baixa vibração elétrica.
— Então, o que você vai fazer? — ela perguntou.
— Vou comer cada pedaço dessa comida deliciosa. E depois vou lamber cada gota de
caldo naquela panela.
— Eu estava falando de Paris.
— Obviamente, temos duas escolhas.
— Você tem duas escolhas, meu bem. Eu tenho dois filhos.
Gabriel deitou o garfo e olhou para sua bela jovem mulher de igual para igual.
— De qualquer forma — disse ele, depois de um silêncio conciliatório —, minha
licença-paternidade acabou. Posso assumir meu posto como chefe ou posso trabalhar
com os franceses.
— E assim se apropriar de um quadro de Van Gogh que vale pelo menos cem
milhões de dólares.
— Tem isso — disse Gabriel, pegando de novo o garfo.

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