A Viúva Negra

(Carla ScalaEjcveS) #1

muros de vocês. Vai ser...
— Um holocausto — completou Gabriel.
Rousseau concordou, pensativo. Então, atravessou a Pont Notre-Dame com
Gabriel, até a Île de la Cité.
— Então, nas palavras de Lênin — perguntou —, que fazer?
— Sou um mero espião, monsieur Rousseau, não um general nem um primeiro-
ministro.
— E se fosse?
— Cortaria o mal pela raiz. Eu os transformaria em perdedores, em vez de
vencedores. Tome a terra — explicou Gabriel — e não pode haver um Estado Islâmico.
E, se não houver Estado, o califado vai, mais uma vez, perder-se na história.
— A invasão não funcionou no Iraque nem no Afeganistão — argumentou Roussau
— e não vai funcionar na Síria. É melhor enfraquecê-los pelo ar, e com ajuda de aliados
regionais. Enquanto isso, conter a infecção para que ela não se espalhe para o resto do
Oriente Médio e da Europa.
— É tarde demais para isso. O contágio já chegou aqui.
Eles atravessaram outra ponte, a Petit Pont, e entraram no Quartier Latin. Rousseau,
ex-professor, conhecia bem o bairro latino e caminhava agora com um propósito maior
que sua saúde pelo boulevard Saint-Germain, entrando em uma rua estreita, até que,
enfim, parou do lado de fora do portão de um prédio de apartamentos. Era tão familiar a
Gabriel quanto a entrada do prédio de Hannah Weinberg na rue Pavée, apesar de fazer
muitos anos desde sua última visita. Olhou rapidamente o interfone. Alguns nomes
ainda eram os mesmos. Naquele momento, a porta se abriu e duas pessoas, um homem e
uma mulher de vinte e poucos anos, saíram. Rousseau segurou a porta antes que ela se
fechasse e levou Gabriel até a meia-luz do hall de entrada. Uma passagem dava no pátio
interno sombreado, onde Rousseau parou pela segunda vez e apontou para uma janela
no andar mais alto.
— Minha mulher e eu morávamos bem ali. Quando ela morreu, eu me desfiz do
apartamento e fui para o sul. Havia memórias demais, fantasmas demais — ele apontou
para uma janela que dava para o lado oposto do pátio. — Uma ex-aluna minha morava
ali. Ela era muito inteligente. Muito radical, também, como a maioria dos meus alunos
naqueles dias. O nome dela — completou, olhando pelo canto do olho para Gabriel —
era Denise Jaubert.
Gabriel fitou Rousseau sem expressão, como se o nome não significasse nada para
ele. Na verdade, ele suspeitava saber mais sobre Denise Jaubert do que seu antigo
professor. Ela era, de fato, radical. Mais importante, era amante ocasional de um tal Sabri
al-Khalifa, líder do grupo terrorista palestino Setembro Negro, responsável pelo
massacre nas Olimpíadas de Munique.
— Certa vez, num fim de tarde — continuou Rousseau —, eu estava trabalhando em
minha escrivaninha quando ouvi risadas no pátio. Era a Denise. Ela estava com um
homem. Cabelo preto, pele branca, muitíssimo bonito. Poucos passos atrás deles estava

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