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Berlim
A taqiyya começou dois minutos depois, às 20h14, quando a polícia de Berlim recebeu
um telefonema referente a um objeto suspeito encontrado dentro do Europa Center, o complexo
empresarial e comercial ao lado das ruínas da Igreja Memorial Kaiser Wilhelm. O objeto era
uma mochila de lona do tipo que góticos, skinheads, anarquistas, ambientalistas radicais e
outros arruaceiros carregam. Fora colocada embaixo de um banco a alguns metros do famoso
relógio de água do local, um ponto de encontro popular, especialmente para crianças
pequenas. Mais tarde, as testemunhas descreveriam a pessoa que deixara a mochila como uma
muçulmana de 30 e poucos anos. A idade estava correta, mas não a etnia. O engano era
compreensível, já que ela usava um hijab.
O denunciador relatou que o conteúdo da mochila era similar a um explosivo, e os
primeiros policiais que chegaram à cena concordaram. Eles exigiram uma evacuação da área
ao redor do relógio de água e, em seguida, de todo o shopping e dos prédios adjacentes. Às
20h25, milhares de pessoas fluíam para as ruas e policiais convergiam de todos os cantos de
Berlim.
Mesmo dentro dos confins serenos e imponentes do Hotel Adlon, dava para perceber
que Berlim passava por uma situação de emergência de grande escala. No famoso bar e lounge
do saguão, onde nazistas antigamente se encontravam, hóspedes ansiosos pediam explicações
para a gerência e alguns iam para a calçada ver as viaturas passando a toda a velocidade pela
Unter den Linden.
Um hóspede, no entanto, parecia alheio à agitação. Bem-vestido e em idade avançada,
um cavalheiro calmamente pagou por um uísque quase intocado e pegou um elevador para sua
suíte no último andar do hotel. Lá, ele observou pela janela o espetáculo de luzes, como se
tivesse sido organizado para entretê-lo. Após um instante, pegou um celular no bolso do paletó
e fez a discagem automática para um número que fora gravado no aparelho por uma criança
que entendia dessas coisas. Ele escutou uma série de cliques e tons. Então, uma voz masculina
o cumprimentou com pouco mais que um grunhido.
— O que estou vendo? — perguntou Shamron.
— O prelúdio — respondeu Navot.
— Quando a cortina abre para o primeiro ato?
— Em um minuto. Talvez menos.
Shamron desligou e voltou os olhos para as luzes azuis piscando na cidade. Era uma
linda vista, pensou. Por meio da ilusão, farás a guerra.
Naquele momento, cerca de 5 quilômetros a oeste do posto de observação privilegiado
de Shamron, Yossi Gavish e Mikhail Abramov montavam duas motos perto de um pequeno
parque na Hagenstrasse. Já não havia mais ninguém no local fazia um bom tempo, mas as luzes
ainda estavam acesas nas casas da rua, que se assemelhavam a castelos teutônicos em
miniatura. Mikhail massageava seu joelho dolorido. Yossi estava imóvel, parecendo uma
estátua de bronze.
— Relaxe, Yossi — pediu Mikhail. — Você precisa relaxar.