ANJO CAÍDO

(Carla ScalaEjcveS) #1

Sua busca começara pouco depois das sete horas da noite anterior, quando a Unidade
8200 interceptou e decodificou uma transmissão prioritária da sede do VEVAK para todas as
bases iranianas ao redor do mundo. A mensagem continha apenas quatro palavras: o SANGUE
NUNCA DORME. Elas não representavam nada para os matemáticos e gênios de computação
da Unidade, mas Dina, uma estudiosa da história islâmica, reconheceu no mesmo instante a
frase. Saladino a dissera ao filho favorito, Zahir, em um aviso contra o uso de violência
desnecessária: "Aconselho-o a não derramar sangue, a não o permitir nem fazer disso um
hábito, pois o sangue nunca dorme."
Mas, como tantos pais, Saladino nem sempre seguiu seus próprios conselhos. Após
derrotar os cruzados na Batalha de Hattin, perto das margens do mar da Galileia, ofereceu a
duzentos dos cavaleiros derrotados a chance de se salvarem caso se convertessem ao Islã, mas
eles se recusaram e foram mortos a espada pelos místicos e estudiosos da corte, sob o olhar
satisfeito de Saladino. Ao entrar em Jerusalém três meses depois, ele arrancou a cruz cristã
que tinha sido colocada no topo do Domo da Rocha e a arrastou pela cidade. Seu primeiro
instinto foi destruir a Igreja do Santo Sepulcro — que ele chamava de "monte de estrume" —,
mas, no fim, Saladino permitiu que a construção ficasse de pé, desde que seus sinos nunca
soassem. E, de fato, até o século XIX, tocar sinos em Jerusalém era proibido por um decreto
muçulmano. A criação do Estado de Israel — e a tomada da Cidade Antiga na Guerra dos Seis
dias em 1967 — encerrou o domínio islâmico. Sim, o Haram al-Sharif permaneceu sob
controle do Waqf. Mas era essencialmente uma fortaleza islâmica murada dentro de uma
cidade de maioria judaica.
O sangue nunca dorme...
Por que os iranianos usaram essa frase? E qual era o significado? Seria uma ameaça
pouco sutil contra o papa? Talvez. Porém, havia outra coisa incomodando Dina. Por que o
Waqf de Jerusalém, mantenedor do terceiro santuário mais sagrado do Islã sunita, tinha um
muçulmano xiita do sul do Líbano como consultor em questões relacionadas ao passado
arqueológico do Monte do Templo? Existia a possibilidade de que o Waqf não soubesse que
David Girard era Daoud Ghandour e que a ligação entre eles fosse uma coincidência — mas
não era algo provável, pensou Dina. Como qualquer boa analista do Escritório, ela sempre
tomava como base a pior situação: as visitas freqüentes de Girard ao Monte do Templo se
deviam às ordens de Massoud, o sortudo.
Ele podia ir a lugares inacessíveis para mim e falar com pessoas com quem eu não
podia encontrar...
Ele era meu serviço particular de correio...
Foi essa preocupação torturante que levou Dina a pedir à Unidade 8200 que passasse
com urgência por uma análise esteganográfica todas as informações relacionadas a Girard. A
palavra "esteganografia" é de origem grega e corresponde à prática de ocultar mensagens
codificadas importantes em meios aparentemente inofensivos. Seu uso remonta à época
anterior a Saladino, ao século V a.C., quando Demarato, rei de Esparta, escondeu sua
correspondência secreta por trás de uma camada de cera de abelha. Na era digital, mensagens
secretas podem ser transmitidas pela internet com disfarces bem elaborados. Fotos com
instruções para ataques terroristas e textos para células terroristas ativas são velados por

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