ANJO CAÍDO

(Carla ScalaEjcveS) #1

Piazza di Spagna, Roma
Eles abordaram o caso da mesma forma que abordavam a maior parte das coisas na
vida: com a calma e o alerta de uma equipe secreta operando em território hostil. Seu alvo era
o assassino de Claudia Andreatti. E agora, com a chegada dos arquivos do Vaticano, eles
tinham os meios para começar sua busca. Mesmo assim, prepararam-se para o fracasso. Os
arquivos eram um pouco como as informações coletadas pelos serviços especializados. E
Gabriel, assim como Chiara, sabiam que, com freqüência, elas eram incompletas,
contraditórias, enganosas ou mesmo uma combinação dos três.
Eles trabalharam supondo que cada um de seus movimentos estava sendo observado,
por isso tomaram as devidas precauções. Gabriel, em especial, não teve escolha a não ser
manter sua ocupada rotina diária. Ele era um homem de muitos rostos e muitas missões. Para
os jovens guardas suíços que o cumprimentavam todas as manhãs na Porta de Santa Ana, ele
era um soldado companheiro, um sentinela secreto e um aliado ocasional. Para seus colegas
no laboratório de restauração, um solitário talentoso, mas melancólico, que passava seus dias
atrás da cortina negra a sós com o Caravaggio e com seus próprios demônios. E, para os
observadores italianos que o seguiam todas as tardes, ele era um agente lendário com um
passado tão complexo que apenas fragmentos eram conhecidos. Ao entrar no apartamento, ele
sempre encontrava Chiara debruçada sobre uma pilha de papéis impressos. Gabriel
trabalharia a seu lado por muitas horas antes de levá-la para jantar nas ruas de Roma. Eles
comiam apenas em pequenos restaurantes freqüentados pelos habitantes locais e nunca
falavam do caso quando estavam fora do flat.
A cada dia, Claudia Andreatti se afastava mais da atenção pública. As dúvidas acerca
da declaração oficial sobre as circunstâncias de sua morte perderam força, as matérias
sumiram dos jornais e até os sites de conspiração mais paranoicos concluíram, com certa
relutância, que era hora de deixar sua alma torturada descansar em paz. Mas, no pequeno
apartamento sobre a Escadaria Espanhola, as perguntas perduraram. Infelizmente, os arquivos
fornecidos a Gabriel pelo padre Mark não continham uma única resposta. A instituição que
eles retratavam fora abençoada pelo fato de que, por mais de um milênio, os papas
mantiveram governo soberano direto sobre os Estados Papais, uma terra arqueologicamente
fértil cheia de antigüidades etruscas, gregas e romanas. Ainda assim, da mesma forma que os
museus tradicionais, o Vaticano tinha complementado suas vastas posses comprando ou
herdando coleções privadas. Essa era uma área potencial para problemas. E se, por exemplo,
uma coleção particular abrangesse materiais escavados ilegalmente ou sem proveniência
clara? Porém, após uma investigação minuciosa, em teste, Claudia não foi capaz de descobrir
nada que apresentasse ao Vaticano qualquer problema jurídico ou ético. De acordo com os
documentos, as mãos da Santa Sé estavam imaculadas.
— Suponho que exista uma primeira vez para tudo — comentou Chiara. — Parece que
o Vaticano tem o primeiro museu no mundo sem uma única estátua roubada escondida em
algum lugar do porão.
— Eles já têm problemas suficientes — disse Gabriel.
— Então, o que fazemos agora?
— Esperamos até a Unidade trazer mais peças para o quebra-cabeça.

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