ANJO CAÍDO

(Carla ScalaEjcveS) #1

Não foi uma espera longa. Na noite seguinte, um dos funcionários de Shimon Pazner se
aproximou de Gabriel na Via Condotti e lhe passou um pen drive contendo seis meses de e-
mails das contas de Claudia. E, na outra noite, ele recebeu o histórico de navegação do IP
dela, junto a uma lista completa de suas buscas na internet. O material formou uma janela
impressionantemente íntima para a vida de uma mulher que Gabriel conhecera apenas de
passagem — notícias que ela havia lido, clipes de vídeo assistidos, desejos secretos que ela
confessara à pequena caixa branca do Google. Eles descobriram que Claudia preferia roupas
íntimas francesas a italianas, que gostava das cantoras Diana Krall e Sara Bareilles e que era
uma leitora regular do The New York Times e do blog de um popular dissidente católico. Ela
parecia se interessar por viajar para a Nova Zelândia e pela costa oeste da Irlanda. Tinha dor
crônica nas costas e queria perder 5 quilos.
Sempre que possível, Gabriel e Chiara evitavam intrusões, mas de forma geral eles
examinaram o percurso on-line de Claudia como se fossem pedaços de tabuletas de pedra de
uma civilização perdida. Não encontraram nada sugerindo que ela estivesse pensando em
suicídio, nem qualquer pessoa que pudesse ter razões para querer sua morte — nenhum amante
ciumento, nenhuma dívida, nenhuma crise pessoal nem profissional. Ela parecia a mulher mais
feliz de Roma.
A última leva de material da Unidade continha os registros do celular de Claudia. Eles
revelaram que, durante as últimas semanas de sua vida, ela fizera várias ligações para um
número em Cerveteri, uma cidade italiana mediana ao norte de Roma conhecida por suas
tumbas etruscas. Talvez não fosse coincidência que o lugar ficasse a poucos quilômetros de
distância do resort à beira-mar em Ladispoli. A pedido de Gabriel, a Unidade rastreou o nome
e o endereço da pessoa associada ao telefone: Roberto Falcone, Via Lombardia, número 22.
No final da manhã seguinte, Gabriel e Chiara caminharam até a movimentada Stazione
Termini e embarcaram num trem para Veneza. Um minuto antes da partida, eles saíram sem
pressa do vagão e voltaram para o saguão lotado onde ficava a bilheteria. Como esperado, os
dois observadores que os seguiam a partir da Piazza di Spagna tinham sumido. Livres de sua
vigilância, o casal foi até uma garagem próxima, onde Pazner mantinha um Mercedes sedã do
Escritório sempre à disposição. Vinte minutos se passaram antes de o carro finalmente
aparecer subindo uma rampa íngreme, mas Gabriel não pareceu se incomodar. Ser um
motorista em Roma significava sofrer pequenas indignidades em silêncio.
Depois de atravessar o rio, ele seguiu ao longo das paredes do Vaticano e chegou à
entrada da Via Aurelia. O caminho os levou no sentido oeste, percorrendo quilômetros de
blocos de apartamentos velhos até a Autostrada A12. Daquele ponto faltavam cerca de 20
quilômetros até Cerveteri. Gabriel passou boa parte da viagem de olho no retrovisor.
— Alguém nos seguindo? — perguntou Chiara.
— Só cinco dos piores motoristas da Itália.
— O que você acha que vai acontecer quando aquele trem chegar em Veneza e não
estivermos nele?
— Acredito que haja recriminações.
— Para eles ou para nós?

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